Já perdi as contas de quantas vezes assisti ao vídeo. Um mulher de cabelos pretos, compridos, com um vestido longo vermelho está sentada em uma sala espaçosa, onde entra uma pessoa de cada vez. Senta-se de frente para ela e, separadas por uma mesa, olham-se por um minuto, em total silêncio. A música de fundo é bela e o que se passa é emocionante.
Trata-se de uma performance da artista Marina Abramovic, em um museu de Nova Iorque. Pesquisando sua biografia, soube que nos anos 70, a artista viveu uma grande paixão com o também artista Ulay. Viviam como nômades e moravam em uma van. Depois de muitos embates, ele percebeu que o trabalho era prioridade na vida dela e resolveu terminar o relacionamento.
Decidiram, então, fazer uma performance nas muralhas da China. Cada um veio de um lado; ao se encontrarem, deram o último abraço e se despediram. Cada um seguiu seu caminho e não se viram mais. Dizem que a separação foi devastadora para ela.
Em 2010, em um museu de nova Iorque, quando ela recebia as pessoas para esse minuto de troca de olhares, sem aviso, chega Ulay e senta-se a sua frente. Depois de 40 anos, ela levanta os olhos e se depara com o grande amor do passado. Tudo acontece no silêncio de um minuto. É possível perceber inicialmente a boa surpresa que ele representou para ela; ele, com leves movimentos de cabeça, parecia se justificar. Em seguida, é possível viajar no olhar dela, que parece cada vez mais distante em busca do passado. Ele novamente abana a cabeça, querendo consolá-la. Ela deixa cair lágrimas, o peito arfante suspira, enfim, ela se entrega...estica os braços sobre a mesa e ele rapidamente alcança suas mãos. Encontram-se num sorriso largo.
Por que será que essa cena me tocou tanto?
Primeiro, porque o fato de nos deixarmos olhar já é um consentimento para que o outro entre e nos desvende. Como dizem, “os olhos são a janela da alma”. Daí surge a timidez, do se proteger, do guardar segredos. Uma performance desse tipo mexe com nosso lado mais frágil.
Segundo, porque no momento em que chega seu amor do passado, percebendo a vida toda em um minuto, é impossível não se colocar no lugar deles. Cada um que assiste faz a sua própria viagem ao passado e busca lá atrás algum caco perdido, uma foto rasgada, uma história mal acabada, enfim, encontra seus próprios fantasmas.
Não adianta! As boas histórias de amor continuam nos encantando desde sempre. John Green, autor de “A culpa é das estrelas” esteve no Brasil e em entrevista disse que o filme baseado em sua obra – de amor entre adolescentes – foi visto por mais pessoas do que o filme do “X-man”.
E é incrível como os romances desencontrados, com finais trágicos ou infelizes nos marcam. Parece que existe dentro de nós uma necessidade de acertar tudo, de ver todos felizes, para que nós também o sejamos. Talvez essas histórias de amor tão inspiradoras sirvam como papel de parede para nossa vida marcada pela rotina, pela repetição, pela mesmice. Através delas, olhamos para nosso passado, para nós mesmos e reinventamos a nossa própria história.