Por sugestão de um amigo querido, li essa semana “Um brinquedo de criar prodígios” – artigo do angolano José Eduardo Agualusa. Conta ele que, em entrevista, uma jornalista que levava em consideração o fato de ele escrever de diversas cidades diferentes – Luanda, Rio de Janeiro, Lisboa, Pangim (capital de Goa, na Índia) - perguntou “Que língua portuguesa é a sua?”
Ele respondeu que sua língua não está limitada por fronteiras políticas ou geográficas. “O que me interessa é o português total”, disse. A partir daí, lembra os países em que se fala a língua portuguesa, sem se esquecer da influência dos árabes para a formação de nossa língua.
Voltando de viagem no fim de semana, vi próximo à cidade de Tanabi, um depósito com o seguinte nome no painel: AGRO EXPORT SEMENTES PAPPINI. Lembrei-me do texto de José Eduardo na hora; cheguei a parar e fotografar aquele painel.
Pois bem, a partir do nome desse estabelecimento, quero falar sobre nossa língua, mas sigo por outro caminho. Vejam: “AGRO” é um prefixo grego e significa “campo”; “EXPORT”, importado do inglês; “SEMENTE”, vem do latim “sêmen” e “PAPPINI” sugere nome próprio italiano. Pronto! – responderia eu – essa é minha língua portuguesa.
Todos sabem que na região chamada Lácio havia duas modalidades de latim: o clássico – usado pelas pessoas com instrução e o vulgar, baseado na expressão espontânea popular. Nossa língua tem origem no latim vulgar. Acontece que, além das influências que ocorreram em Portugal, ao chegar ao Brasil, os portugueses se depararam com os nossos nativos e as línguas indígenas; depois com os africanos que vieram como escravos. Em seguida, com os italianos e por aí vai. O Brasil, como um “país cordial” e acolhedor, tem recebido estrangeiros de toda parte e se deixa seduzir pelos respectivos idiomas.
Cada dia mais, vemos essa mistura que nos surpreende, provando que a língua é processo dinâmico.
Gostei do posicionamento de Agualusa: “O português que me interessa é o total”; para mim também é assim. Não há um país, estado ou região em que nossa língua seja mais correta; tudo é português.
E o autor angolano conclui brilhantemente: “A minha língua é uma mulata feliz, fértil e generosa, que namorou com o tupi...” Vemos que hoje ela “fica” com muitos idiomas e “se deixa engravidar” por todos eles. Não há uma página de revista ou jornal; um quarteirão com nomes de lojas, restaurantes ou bares; nomes de filmes, novelas, em que não vemos essas influências todas.
Ah, ia me esquecendo... Esse depósito fica na estrada próximo a TANABI e VOTUPORANGA, palavras indígenas. Só faltou dizer que, saindo da “garage” havia um “chofer” que levava um “garçon” para trabalhar na “boate”, decorada com um lindo “abajur” (palavras francesas).