No motel, com você mesma

20 de Agosto de 2025

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No motel, com você mesma

 

               Minha amiga reclama, há dias, que está com uma forte dor não muito bem localizada. Passou por consultas, fez endoscopia, colonoscopia, já tomou diversos chás, fez promessa, foi à benzedeira e nada. Nesta época do ano, a maioria das pessoas está bem cansada, e isso está evidente no rosto de minha amiga.

               Como ela já tentou de tudo, sem sucesso, dei um conselho: que ela passasse uma tarde num motel; e mais, que ela fosse sozinha. A maioria das pessoas associa motel a sexo – geralmente com uma pitada de coisa proibida - mas na verdade, o motel - que significa hotel de motorista – surgiu com o propósito de garantir segurança e repouso para viajantes cansados. Uma vez, em Rio Preto, depois de uma consulta, pegaria um ônibus para Belo Horizonte só à noite, então fui para um motel com minha mãe. Sinceramente? Acho que esse foi o presente mais original que dei a ela.

               Por que ir sozinha? De modo geral, a sociedade acha que se estamos sozinhas, estamos mal. Entretanto, muitas vezes, a gente sai para um restaurante ou para um café desejando mesmo ficar à toa, olhando para o nada, vendo a vida passar, ou então, a gente quer olhar as novidades do Facebook, mandar os “parabéns” para amiga aniversariante do dia, ou ligar para mãe para bater um papo, enfim... decidir o que fazer dentro das opções que nos dão prazer. Mas nem sempre isso é possível.

As pessoas já acham que você não pode ficar sozinha, “coitada!” E aí se sentam e desfiam toda a desgraceira do mundo na sua cabeça. Ou então, aquele senhor que adora contar vantagem, senta-se ao seu lado, a pretexto de lhe fazer companhia e fica contando quais foram as transações imobiliárias que ele fez nos últimos cinco anos. E você, com aquela cara interessadíssima no assunto, fica torcendo para que o terremoto do Chile chegue logo aqui e acabe de vez com aquele tormento. Depois disso, a gente volta correndo para casa, querendo se trancar no quarto para ter um pouco de sossego e aparece um cara com um caminhão vendendo melancia, com um megafone dizendo o quanto a melancia está docinha.  Ou a nova empregada bate à porta do quarto para saber se o pepino para a salada deve ser cortado em rodelinhas ou em  tirinhas, que tal? O telefone toca duas vezes: uma é de um banco, oferendo um cartão – mas isso eu resolvo fácil: digo logo que sou professora e pronto! Na segunda vez, uma voz me avisa, numa longa mensagem, que devo pagar urgentemente a conta do telefone para evitar problemas.

Percebem como numa hora dessas a gente merece uma tarde no motel, com a gente mesma?  É claro que é muito bom ir a um lugar desses acompanhado da pessoa que a gente ama, mas se estamos estressadas, é melhor nem tentar. A sintonia entre os parceiros precisa ser perfeita, senão... um gosta de ligar o ar condicionado, o outro detesta. Humm...Um gosta de ficar no escuro para relaxar, o outro quer luz acesa. Ai ai ai...Um quer ver um filminho “daqueles”, o outro quer tv desligada. Tudo bem, então vamos para a banheira: um adora banho quente, o outro pensa que aquilo é uma piscina, quer água fria. E na hora de ir embora, a mesma coisa: um quer ficar lá para o resto da vida, o outro quer ir logo, porque “já tá bom”, não é assim?

Não sei se é idade, que deixa a gente chata e seletiva, ou se a minha depressão que ameaça entrar em recidiva, mas ando muito irritada. Talvez, para um jovem possa parecer absurdo, mas depois dos cinquenta, eleger um motel como se fosse um spa e curtir umas horas a nossa própria companhia pode ser um programa muito gratificante. Espero que minha amiga aceite minha sugestão e, para não ter problemas, que avise o marido, claro!