Fernandópolis foi uma das cidades do Brasil que realizou todas as manifestações contra o governo, o PT e o ex-presidente Lula. O responsável por colocar o fernandopolense na rua foi o jornalista Paulo Henrique de Assis Boaventura, 32 anos, ou simplesmente, Paulinho Boaventura. “Focamos o PT, Dilma e Lula porque a corrupção por si, não tem nome, é uma palavra feia, mas que não atinge ninguém”, justificou. No domingo, dia 17, quando a Câmara Federal aprovou a admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ele estava na avenida com a TV ligada e ao lado de dezenas de pessoas. Diz que viveu um misto de sentimentos. “Mistura de emoção, raiva, amor, fé, esperança”.
Nesta entrevista ao CIDADÃO, Boaventura diz que é bairrista e que a situação atual vai influir nas eleições municipais. “Antes de pedir o voto, o candidato este ano terá que convencer o eleitor a votar, porque ele cansado de promessas”. Aposta também em novidades nas eleições de prefeito, diz que, no momento, não trabalha com a possibilidade de ser candidato. Lembra-se do exemplo do tio, José Maria Alves, o “bombeiro” de Fernandópolis e aponta que a fatalidade antes e o egoísmo hoje contribuíram para Fernandópolis, sua cidade natal, perder espaço na região:
Na noite de domingo, dia 17, quando a Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, qual foi o sentimento que aflorou naquele momento?
Não sei dizer. Fui chamado de doido por algumas pessoas quando o Impeachment ainda era surreal, lá no começo de 2015. Quando surgiu aquele número 342 no placar, foi uma mistura de emoção, raiva, amor, fé, esperança, enfim, uma mistura de sentimentos. Assisti ao lado de vários amigos, e isso fez a emoção ser maior.
Em que momento você percebeu que era necessário mobilizar Fernandópolis, para integrar essa onda de protestos que culmina agora no processo de impeachment da presidente?
Já sabia que estava ocorrendo movimentação nas capitais em janeiro do ano passado, mas o que me incomodava era ir ao supermercado e ver os preços aumentando, o combustível também. Depois do ‘mensalão’ em 2005 o novo escândalo do ‘Petrolão’, isso estava me incomodando. Tô com uma filha pequena, ela ainda ia fazer um ano de idade, então percebi que pouco se falava de enfrentar o governo, fiquei com medo de um futuro ruim pra ela e todos nós, então apenas dei a sugestão de fazer algo por aqui.
Durante todos os eventos organizados, o que mais chamou sua atenção?
A vontade de mudança. Desde as manifestações principais até as que deram poucas pessoas, todas tiveram o sentimento de mudança. Estamos focando o PT, Dilma e Lula porque a corrupção por si, não tem nome, é uma palavra feia, mas que não atinge ninguém. Você precisa apontar numa direção, por isso, o processo está encaminhando agora. Porém, você percebe a indignação da população com a classe política num todo, e esse sentimento você sente em cada cidadão e cidadã ali presente, seja PT, PSDB, PMDB, enfim. Cito esses por serem os maiores.
Agora se inicia uma nova etapa que é o julgamento no Senado. A mobilização continua?
Claro que é necessária a maior mobilização nas capitais nesse momento. Fernandópolis foi uma das únicas cidades do Brasil que fez todas as manifestações. Ganhamos destaque até porque temos um deputado federal, e que votou sim pelo Impeachment. Então veja a nossa responsabilidade, pois tínhamos que garantir esse voto. Agora no Senado a nossa pressão local será pela internet.
As redes sociais mostraram-se uma ferramenta fabulosa de mobilização e debate político nos últimos tempos. Acha que esse efeito vai se estender no período das eleições municipais?
Há algum tempo isso acontece. Lembro que no Orkut tinha a comunidade Fernandópolis e às vésperas das eleições municipais de 2008 o ‘bicho já pegava lá’. Acredito que a rede é ótima para mobilizações, mas ainda é fraca para debates políticos com bom nível. O que percebo são várias piadinhas sobre política ou postagens sem fontes confiáveis de informação. A rede é fundamental, mas numa eleição municipal o corpo a corpo ainda é essencial.
Você acredita que o eleitor terá um olhar diferente no exercício do voto a partir de agora?
Acredito que o primeiro desafio aos candidatos e coordenadores de campanha não é convencer o eleitor a votar nele, mas sim convencer o eleitor a ir votar no dia. O brasileiro está cansado das promessas, dos escândalos, por isso, essas manifestações ganharam essa proporção. Justamente por este motivo que o eleitor deve comparecer, para evitar que os ruins vençam. O que me deixa esperançoso é que a política voltou a ser assunto entre amigos e família, isso já indica algo diferente na mentalidade.
Qual o peso que essa mobilização terá nas eleições municipais que acontecem em outubro?
Já está tendo um peso muito grande. Aqui mesmo em Fernandópolis já tivemos um vereador do PT que deixou o partido na janela e foi para o PROS. Tivemos dezenas de prefeitos pelo Brasil que também deixaram a legenda. Acredito que o partido poderá ter uma baixa muito, mas muito considerável, no seu quadro de vereadores e prefeitos. Acredito que os candidatos de todos os partidos vão pensar com mais cautela nas promessas mirabolantes e impossíveis.
Você desponta como uma liderança jovem e já se fala que deverá sair candidato nas eleições municipais. Trabalha com essa possibilidade?
Alguns amigos e até pessoas que eu nem conhecia chegaram a falar sobre isso comigo. Não trabalho com essa possibilidade no momento. Falar que jamais serei, acaba sendo ridículo, porque acredito que todo cidadão deve participar de alguma forma do processo político, mas não tenho pretensões de ser candidato. E peço que os pré-candidatos olhem o passado, se espelhem nos bons que passaram pela Câmara e Prefeitura, honrem aqueles fernandopolenses de bem que realmente pensavam na cidade.
Como você analisa Fernandópolis, sua cidade natal. Por que estamos perdendo espaço na região?
A princípio por fatalidades e hoje por egoísmo. Perdemos o prefeito Camargo e depois na outra gestão perdemos o Okuma. Isso foi forte demais, mexeu com estruturas de administração e planos de governos. Justamente neste período, Votuporanga se fechava num grupo ‘pró-bairrista’ totalmente ligado ao governo do estado e deu nisso. E hoje o egoísmo, porque não há diálogo entre poderes, é um querendo prejudicar o outro, ‘eita’ cidade difícil.
Que cenário, em sua opinião, se desenha para as próximas eleições? Qual seria o perfil adequado para o futuro prefeito ou prefeita?
Finalmente acredito que teremos novidades. Apesar de um ou outro nome conhecido das antigas, tenho a certeza que vão surgir novas lideranças este ano. O prefeito ideal precisa conhecer de verdade a cidade, sair do gabinete não somente para fotos, mas ir na periferia, no ‘centrão’ da cidade. Precisa sim receber vereadores, precisa encher o saco de deputados com pedidos, viajar para São Paulo, Brasília, e o mais importante, escalar profissionais de verdade nas diretorias municipais. Pessoas que saibam o que estão fazendo, e que não sejam apenas retribuições por apoio eleitoral.
Na sua família, seu tio, José Maria Alves, era um apaixonado pela cidade, um bairrista, alguém que também conseguiu grandes mobilizações, como para a construção do primeiro edifício, pela terceira faixa da rodovia Euclides da Cunha e fundação da Associação de Amigos. Tá no sangue?
Hoje digo com todas as letras. Que falta faz um Zé Maria em Fernandópolis. Meu tio nunca foi filiado a nenhum partido político, e entrava no gabinete de qualquer prefeito. Era o bombeiro de Fernandópolis, apagava incêndios e dava puxão de orelhas em vários políticos. Lembro que quando assumi o cargo de presidente do Interact Club em 1999, o primeiro convite da posse que entreguei foi pra ele, queria que ele me visse. Hoje também estou na Casa de Portugal sendo um dos únicos descendentes direto de portugueses no clube. Se eu fosse 10% do que ele foi para Fernandópolis, eu morreria feliz.
Você se julga bairrista?
Demais e já tive problemas por isso, mas se isso for ter problema, ótimo. Em 2003 fui com meu tio Zé Maria a Votuporanga buscar uma retratação por parte de uma autoridade daquela cidade por proferir palavras ofensivas contra Fernandópolis em um jornal de lá. Quando fazia parte da Torcida Sangue Azul também acabei sendo lembrado por alguns votuporanguenses (rsrs), mas isso é normal. Acredito no desenvolvimento regional, isso é fundamental, mas não podemos admitir que políticos venham tirar o que é nosso, como tentaram fazer com a Superintendência do Detran e também com o Judiciário local. Tem que ser bairrista mesmo, parar de olhar o quintal dos outros e começar a defender e limpar o nosso.