Seria fácil iniciar mais uma matéria da Série Som da Terra, iniciada na última edição, classificando o dom do nosso entrevistado como “inexplicável”, no entanto, como ele mesmo afirma que a explicação é Deus e como é sabido que seria praticamente um pleonasmo classificar assim a habilidade nata da maioria dos bons músicos, deixaremos tal substantivo de lado. Em Fernandópolis há 15 anos, Gutemberg de Oliveira nasceu em São Paulo, em 7 de abril de 1980, numa família de cinco irmãos. Filho de Benedito de Oliveira e de Eunice dos Santos, Gutemberg revelou seu dom musical logo cedo, aos sete anos. Com o pai preso por quatro anos em uma cama, após um derrame cerebral, a família passou por maus bocados financeiramente, impossibilitando a compra de um violino para o jovem, que já se identificara com o instrumento, ao ver a orquestra da igreja evangélica congregação cristã. “Eu ia com minha mãe no culto e ficava observando os violinos dentre os demais instrumentos e logo passei a fazer aulas na igreja, mas não tinha meu próprio violino, pois minha mãe não tinha condições de comprar”, contou o músico.
No entanto, um dos irmãos de Gutemberg que, à época, trabalhava como coletor de lixo, num dia de trabalho encontrou um violino quebrado e levou ao irmão. “O instrumento não estava em condições de uso, sem corda, mas assim como os meus demais brinquedos, que meu irmão encontrava no lixo, eu fiquei contente. Ele sabia que eu queria um e me presenteou. Mesmo sem cordas eu simulava as notas no braço e com um pedaço de pau tocava vendo os irmãos da igreja tocarem”, lembrou.
Ainda com sete anos, acometido por um coágulo na cabeça, os médicos diziam que o pequeno “Gut” precisaria estudar em uma escola especial e teria dificuldades de aprendizagem, inclusive na música. Porém, o que os médicos não sabiam é que o “Médico dos médicos” não deixaria um dom ser ceifado por qualquer outra coisa e com apenas três meses de aulas na igreja, ele já foi incorporado na orquestra principal. “Pela minha deficiência e dedicação, todos tinham muito carinho por mim e como já havia passado pelo método de iniciação, passei a tocar com eles ainda aos sete anos”, disse.
Aos 15 anos já era instrutor de música e três anos mais tarde passou por uma experiência “explicável” comprovando que uma força sobrenatural estava a seu lado. “O irmão Miguel me disse que eu era uma providência divina e que havia me inscrito, de supetão, na ULM – Universidade Livre de Música-, referência no ensino musical há 20 anos-, e queria que eu prestasse a prova para entrar na faculdade. Eu sabia apenas o básico, estudado com o método da igreja e no dia da audição nunca havia visto tantos bons músicos juntos. Eles afinavam o violino, faziam notas, escalas e eu ficava de boca aberta, com as pernas tremendo pensando: ‘o que eu estou fazendo aqui?’. Quando cheguei de frente aos seis jurados eles perguntaram em qual conservatório eu havia estudado e humildemente disse que só tinha tocado na minha igreja. Um olhou para o outro e meio desconfiados pediram para eu começar. Como escolhi tocar logo de cara a ‘leitura primeira’, onde eles escolhiam uma música de improviso e eu precisaria tocar com o acompanhamento do piano, apenas olhando a tablatura sem nem ter tido contato com a música, olhei a música, que, por sinal, era um concerto de Vivaldi, me embananei todo, pois era muito difícil. Foi aí que uma voz interior me disse: ‘acredite em você e no seu instrumento’. Depois daí não lembro de mais nada. Fechei os olhos e logo abri com todos me aplaudindo de pé. Pensei que não tivesse conseguido e que estavam me ironizando, mas dias depois me deparei com meu nome em primeiro lugar da lista”, contou.
Depois disso Gutemberg conheceu grandes músicos e tocou em várias orquestras, mas seu destino realmente era Fernandópolis, onde conhecera sua esposa Eleusa em um culto. “Vim a Fernandópolis conhecer a igreja e me encantei com uma moça que tinha um cabelão comprido. Achei aquilo lindo, conversamos, começamos a namorar e voltei a São Paulo. Mas, já não consegui mais ficar longe dela e me mudei para Fernandópolis em 2000. Tive um derrame facial e fiquei cego por um tempo. Minha esposa e o casal Valdecir e Odete cuidaram de mim, fiz um tratamento e voltei a enxergar. Já em 2004, me casei e consegui meu primeiro emprego como professor de música na Escola Santa Cecília, indicado por José Antônio Alves da Silva, o Zecão”, lembra Gutemberg.
Atualmente Gutemberg vive da música, dando aulas e tocando em eventos variados, principalmente casamentos encantando todos com a perfeição do som de seu violino, executado com maestria. Ele integra ainda o corpo docente dos projetos “Os Sonhadores” e Guri. “O projeto Sonhadores” é a menina dos meus olhos. Quando entrei era mais que um trabalho de música, era muito social. Encontrava jovens com problemas financeiros, de drogas e foi algo muito especial”, afirma.
Quando perguntado onde é mais prazeroso tocar, nas Orquestras ou na igreja, a resposta foi imediata. “Na igreja, sem dúvida. Participar de uma orquestra sinfônica com músicos profissionais é algo lindo, a intensidade do som é perfeita. Mas quando toco na igreja a minha reverência é para oferecer para Deus. Meu maior privilégio é sentar no banco da igreja e tocar para Deus”, destacou.
RAIO X
Nome: Gutemberg de Oliveira
Cidade natal: São Paulo
Esposa: Eleusa Oliveira Franca
Filhos (as): Pablo
Profissão: Músico
Comida predileta: Arroz, feijão e bife
Um hobby: Ouvir música clássica
Um esporte: Natação
Uma música: Primavera - Vivaldi
Um cantor: Andrea Bocelli
Um ator: Mel Gibson
Um ídolo: Deus
Um político: Nenhum
Um filme: A Paixão de Cristo
Um perfume: 93 million mile
Uma frase: Salmo 121: “Salmos 121: elevo meus olhos para o monte de onde virá o meu socorro? O meu socorro vem do Senhor que fez o céu e a terra (...)
Um personagem marcante: Meu filho
Um defeito: Sistemático
Uma qualidade: Dedicação
Um programa de TV: Não assisto
O que gosta de fazer nas horas vagas: Brincar com meu filho
Do que tem saudade: Dos amigos que já se foram
Um sonho: Ver meu filho tocando comigo
Fernandópolis é: O começo do que eu sou