Fernandópolis tem média de quase três incêndios por dia

Números deixam claro que fernandopolenses não sabem que queimada é crime

20 de Agosto de 2025

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Fernandópolis tem média de quase três incêndios por dia

Provocar queimada de qualquer tamanho que seja é crime, e isso muitos já estão enfadonhos de tanto ouvir. No entanto, os números comprovam que ainda falta conscientização, ou então fiscalização e penalização mais rigorosas.

Na semana passada, um incêndio de maior proporção, fez o tema voltar à tona com frequentes reclamações de munícipes – boa parte dos reclamantes, assinantes do CIDADÃO-. O incêndio referido ocorreu na sexta-feira, 21, por volta das13h, em um canavial, na Fazenda do Coqueiro com a queimada de 36.000m² da área plantada.  Os danos provocados pelo fogo foram além do prejuízo ao proprietário da área, senão dos munícipes que tiveram de lidar com a grande sujeira causada pela fuligem e os agravantes àqueles que sofrem com alguma doença pulmonar.

“Incomoda muito, pois mesmo eu que sou aposentada e tenho mais tempo para limpar é desagradável lidar com a sujeira que não tem hora para ocorrer. É um problema que contradiz o momento de contensão do consumo de água, pois para limpar a sujeira da fuligem somente com água mesmo, não tem outro jeito”, contou Marli Cruz Lemos, moradora da Rua Manoel Marques Rosa, no centro da cidade.

MÉDIA ALTA

Em razão da estiagem, o tempo seco e consequentemente a baixa umidade relativa do ar atrelado ainda à displicência de alguns moradores, o Corpo de Bombeiros de Fernandópolis tem atendido uma média de 2,44 incêndios por dia, especificamente neste mês de agosto. Até aqui, já foram registrados 61, 30 em vegetação cultivada, 28 em vegetação de terrenos baldios, e mais três em veículo, casa e edificação comercial.

No entanto, prevalecem ao longo do ano os incêndios em terrenos baldios, que tecnicamente são classificados como acidentais, já que raramente encontra-se o causador.

“Já atendemos ocorrência em que crianças se divertiam com o fato irmos apagar e ter de voltar no local. Ateavam fogo logo que virávamos as costas. Foram os próprios moradores que esperam apagarmos para colocar fogo novamente com a finalidade de limpar a área. Ao invés de entrar em contato com a Prefeitura para fazer a limpeza, ou entrar em contato com o proprietário da área e notificá-lo, mesmo que more em outra cidade, eles acham mais rápido praticar a queimada, já que reclamam da proliferação de animais peçonhentos como cobras, aranhas e escorpiões”, destaca o sub-tenente e comandante interino do Corpo de Bombeiros de Fernandópolis, Orlando Candeia Junior.

2014 FATÍDICO

Em 2015 já foram registrados pelo Corpo de Bombeiros em Fernandópolis 276 incêndios, além claro, daqueles que são controlado pelas próprias usinas sucro-alcooleiras da cidade e região que dispõem de cerca de 10 caminhões pipa cada uma, cuja capacidade de cada veículo é de 15.000 litros. Embora o número tenha aumentado nos últimos dois meses (em julho foram 47 ocorrências), a média nos últimos oito meses é menor que a registrada no mesmo período de 2014, ano atípico em que foram registrados 395 incêndios, número superior a 2012 e 2013 juntos, que somados dá um total de 284. Ainda assim, em razão do tempo seco os números devem seguir aumentando.

“Ainda há a falta de consciência de muitas pessoas a respeito do mau uso do fogo. A população reclama do serviço de limpeza pública, acaba colocando fogo para limpar o terreno ou eliminar um montinho de folhas, mas de qualquer forma é crime. Na lei não fala se é um terreno inteiro ou um montinho, atear fogo é crime. Muitos nos questionam que não tem onde descartar o lixo, mas isso não é problema do bombeiro. Como eu disse é preciso contatar a Prefeitura. Além disso, o descuido com bitucas de cigarro e a estiagem colaboram para que este número siga aumentando ainda mais. É uma média alta se levado em conta que são raras as causas naturais e que as usinas já não precisam mais provocar queimadas para o corte da cana. Hoje são 100% mecanizadas e não se pode mais culpa-las de incêndio proposital. As pessoas continuam utilizando fogo mesmo sendo crime, mas se comparado aos números de outros anos não considero uma média alta”, explicou Candeia.

De acordo com o INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-, no estado de São Paulo já foram registrados este ano 1.266 incêndios, contra 4.717 em 2014. Ainda de acordo com o órgão, Fernandópolis e região estão em uma zona perigosa na questão de queimadas podendo ser considerados como locais de alto risco no que diz respeito à propagação de incêndios, estando abaixo somente de locais críticos onde queimadas são iminentes.

CURIOSO

Para tentar explicar a difícil tarefa de evitar incêndios provocados pela própria população, o sub-comandante deu exemplos de duas ocorrências que vez ou outra são atendidas pelos bombeiros.

“No ano passado fomos chamados para uma ocorrência à noite em que moradores haviam feito uma fogueira em frente á residência, próximo ao Cemitério da Saudade, para se esquentarem, pois estava muito frio. No entanto, além do crime de queimadas, eles poderiam ser indiciados por dano ao patrimônio público, pois o asfalto já estava derretendo. Este caso de danificação no asfalto também ocorre quando as pessoas fazem um montinho de folhas e queimam em frente a casa. Outro caso que ocorre, este com certa frequência, é de pescadores que fazem uma fogueira próximo à APP – Área de preservação Permanente-, oferecendo risco de uma queimada maior, isso quando ela não ocorre, pois muitas vezes dormem no local”, contou o bombeiro.

Além do grande incêndio do último dia 21, outro que tomou maiores proporções ocorreu às margens da Rodovia Euclides da Cunha (SP-320), no km 558, no último dia 12, por volta das 20h. O fogo destruiu cerca de 100 alqueires de um canavial, de propriedade da Usina e Destilaria Alcooeste. A fumaça e a fuligem atingiram a cidade toda, que amanheceu tomada pela sujeira, mas principalmente os moradores do Bairro São Francisco. “Moro aqui há dois anos, mas não dá para se acostumar com essa situação. Não dá para saber o que é pior, a fumaça ou a sujeira. No mínimo uma vez por semana é preciso jogar água na casa”, contou Neide Sirino Leite Bonfadini, moradora do bairro.

EXPLICAÇÃO

Com 100% de corte da cana-de-açúcar mecanizado, a Destilaria Alcooeste explicou que não há mais a possibilidade de acusar as usinas de provocar as queimadas da palha da cana, já que não existe o corte manual, dispensando o uso do fogo, que foi proibido radicalmente desde o ano passado.

De acordo com assessoria de imprensa da Alcoeste, “para evitar os incêndios em seus canaviais a destilaria conta com 10 motocicletas que fazem o monitoramento das áreas, e ao menor perigo de fogo, comunica a equipe agrícola para que os caminhões bombeiros próximos se dirijam até o local. No total são 12 caminhões preparados para o combate ao fogo durante aproximadamente três horas, com jatos que alcançam até 50 metros de distância. Também estão equipados com mangueira própria para combate a incêndios de 60 metros.  Além disso, para prevenir incêndios, a Alcoeste tem o trabalho diário e rigoroso da limpeza de carreadores, talhões, beira de cercas e rodovias, além das APPs - Áreas de Preservação permanente-, ou seja, o acero”.

Ainda de acordo com a assessoria, “uma nova tecnologia de combate a incêndio na palha de cana está sendo testada. Trata-se de um líquido gerador de espuma Classe A, cuja capacidade extintora corresponde a 3 ou 4 caminhões pipa somente com água.

DESCASO

Além do descuido com bitucas de cigarro e displicência dos populares em provocar queimadas, a classe de produtores rurais também se mostrou descompromissada com os a manutenção correta de aceiros - desbaste de terreno em volta de propriedades rurais, ou matas, coivaras, etc.,  pela descontinuidade assim estabelecida na vegetação, evitar a propagação de incêndios ou queimadas-, método aplicado corretamente pelas usinas, segundo o sub-tenente Candeia. “Como poucos proprietários rurais fazem o aceiro da maneira correta elaboramos um curso em junho de 2014 solicitando a presença de todos os proprietários para orientar como fazer o aceiro da maneira certa, mas mesmo com o convite por escrito, não apareceu ninguém. Se fizessem o aceiro como se deve, assim como os proprietários de usinas têm feito, vários incêndios de grande proporção poderiam ser evitados. Alguns proprietários de terras à beira rodovia tentam se esquivar jogando a culpa no DER – Departamento de Estradas e Rodagens-, mas o órgão faz sua parte cuidando, roçando, limpando sua parte, mas a plantação natural é de responsabilidade do proprietário”, lembrou.

No ano passado, o Corpo de Bombeiros atendeu ainda 16 ocorrências próximas ao horto florestal pelo mesmo motivo: uso de drogas no local. Atualmente, com a reforma da área, os números caíram pela metade.

SAÚDE

Os principais atingidos são idosos, crianças e asmáticos. Todavia ninguém está isento de sofrer com a poluição, que causa também o aumento da morbidade respiratória na medida em que há aumento da concentração de material particulado no ar, gerado pela queima da palha da cana-de-açúcar.

O tempo seco e, consequentemente, o aumento de queimadas, provoca um crescimento considerável no número de consultas, atendimentos hospitalares, medicação e internações relacionados a problemas respiratórios, como morbidade respiratória, bronquite crônica, enfisema e asma que sempre têm um agravamento dos sintomas em decorrência da fumaça.

Em contato com o construtor de Fernandópolis Roberto Martins, 40, ele mal conseguiu dar entrevista ao CIDADÃO enquanto comprava um anti-inflamatório na farmácia. “Está difícil até para falar, pois me dói a garganta, fica raspando. Não tenho nenhuma doença respiratória, mas esse tempo seco, poeira, fumaça acaba com qualquer um. Naquele dia da poeira, por exemplo, minha garganta infecionou na mesma hora”, relatou.

LEGISLAÇÃO

Vale lembrar, que além de leis estaduais e federais que inibem a utilização de fogo, em Fernandópolis atear fogo em qualquer matéria também é crime, de acordo com a lei nº 3.981 de 28 de junho de 2012, que estabelece: “Fica expressamente proibido qualquer tipo de queimada em área localizada em perímetro urbano, seja de lixo, mato ou qualquer outro material orgânico”.

As infrações são classificadas como leve, grave ou gravíssima e qualquer uma delas caberá multa que pode ser de duas URM’s – Unidade Referencial Municipal (R$ 233,74) se for leve, seis URM’s se considerada infração grave e dez URM’s em caso de gravíssima. Ainda de acordo com a lei em caso de reincidência, as penalidades serão aplicadas em dobro e o infrator, em alguns casos, também pode ter que reparar o dano.

PREJUÍZOS

- destruição de plantações, perda de floresta/matas;

- morte de animais silvestres;

- poluição do ar;

- agravos a saúde da população;

- aquecimento global; e

- acidentes com queimaduras ou mortes de pessoas.

ORIENTAÇÕES

 - evite qualquer tipo de queimada, quando necessário aplicar em áreas agrícolas, conforme regulamentação legal, solicite autorização prévia à cetesb, onde receberá orientações a respeito das medidas de prevenção, nunca faça queimadas próximo à rede elétrica.

  - seja um cidadão conciente: denuncie focos de incêndio e ajude a divulgar essas informações.