Passando pelas mesmas dificuldades de outras quase 500 mil mães em todo mundo, cujos filhos possuem alergia à proteína do leite (Caseína), a dentista fernandopolense Melissa Cristina da Silva Marin, 38, aderiu nesta semana à Campanha “Põe no Rótulo”, criada no Brasil por 600 mães e pais de crianças com algum tipo de alergia alimentar e que pretende melhorar as informações em rótulos de alimentos comumente com informações facilmente imperceptíveis com letras pequenas e conteúdo escondido.
A campanha “Põe no Rótulo” tem 600 membros em 16 estados, inclusive no Paraná. Cerca de 40 famosos, de atores a jogadores de futebol, já posaram com a logomarca da iniciativa, que tem cerca de 27 mil seguidores no Facebook. Eles embasam a reivindicação no Código de Defesa do Consumidor, destacando o direito do cliente de saber tudo sobre o que compra.
Melissa é mãe de Felipe Marin Costa, de um ano e meio, que possui a APLV – Alergia à Proteína do Leite de Vaca, reação alérgica às proteínas presentes no leite de vaca ou em seus derivados diferente da intolerância à lactose. Ela ocorre porque assim que os bebês nascem, o intestino ainda está imaturo e a ingestão dessas proteínas pode iniciar um processo de inflamação no aparelho digestivo.
Felipe foi amamentado com leite materno por apenas dois meses e quando começou a transição para as bebidas infantis passou a sofrer com vômitos, intestino preso, gripes, resfriados e refluxos, que aparentemente seriam sintomas comuns em qualquer recém-nascido. No entanto, a recorrência destes sintomas despertou a preocupação na família que sistematicamente buscava por auxílio médico.
A partir dos noves os problemas aumentaram. Além dos sintomas já mencionados, Felipe passou a apresentar complicações respiratórias. “Ele começou a tossir, o nariz escorrendo o tempo todo e o peito chiava. Começamos a dar antibióticos, corticoides, fazer inalação, mas medicava ele numa semana, na outra ele ficava bom e em seguida já ficava doente de novo”, disse a mãe de Felipe que também tinha dificuldades de ganhar peso.
No aniversário de seu primeiro ano de vida, Felipe comeu tudo o que tinha direito, brigadeiros, cachorro quente, pão de mel, beijinho, salgadinhos e bolo. Dois dias depois voltou a passar mal e Melissa resolveu dar um basta na situação. “Eu já não aguentava mais essa loucura, correria. Em noites de crise, a gente saia correndo para a Votuporanga onde há um médico pediatra 24h, diferente de Fernandópolis. Foi aí que dias depois do aniversário dele quando ele passou mal novamente eu disse ao médico que já havia tentado de tudo, com vários remédios e que no exame de sangue, que indicou uma alergia baixa, não justificava tantos sintomas. Foi aí que ele pediu para cortar o leite comum e os derivados. Numa sexta-feira passei a dar o leite de soja que era muito ruim e fedido, mas ele mamou a mamadeira toda normal e já no domingo seguinte sarou de vez. Foi como tirar com a mão. De lá para cá, já são seis meses sem sofrer mais nenhum sintoma”, contou ela que gastava cerca de R$ 300 mensais com os medicamentos que há um mês já não são mais necessários.
Da mesma maneira pela qual havia se tornado rotina as inalações, uso de bombinhas de asma e horários de medicamentos para o menino, se tornou rotina para mãe fazer suas merendas escolares e até mesmo a confecção de guloseimas como brigadeiros e beijinho com leite condensado de soja para levar em aniversários de outras crianças.
Agora, com a alergia descoberta, Melissa ainda confia que a partir dos dois anos Felipe possa voltar a se alimentar como uma criança normal. “Essa alergia dele não é considerada severa, que tem reação imediata. Quando ele completar dois anos nós começaremos a introduzir pouco a pouco o leite comum e ver como ele reage. A maioria das crianças com essa alergia volta a se alimentar normal quando o intestino já não é mais tão imaturo”, disse ela, que mesmo assim continuará encampando a “Põe no Rótulo”.
Um dos desafios diários na rotina de Melissa e Felipe é na hora de comprar aos alimentos, já que atenção deve ser redobrada. “Tem muitas coisas que crianças gostam e que ele vê e pede e que não posso comprar, mas aos poucos vamos descobrindo os alimentos que imitam os tradicionais sem a caseína. Hoje em dia conheço uma única marca de bolacha que só vende em um supermercado da cidade, um shampoo que só vende em outro, hidratantes, sabonetes e até lenços umedecidos que também contém proteína do leite”, explicou a dentista que passou a conhecer vários produtos apropriados para alérgicos por meio do site do movimento “Põe no Rótulo”.
A CAMPANHA
A campanha “Põe no Rótulo” tem 600 membros em 16 estados, inclusive no Paraná. Cerca de 40 famosos, de atores a jogadores de futebol, já posaram com a logomarca da iniciativa, que tem cerca de 27 mil seguidores no Facebook. Eles embasam a reivindicação no Código de Defesa do Consumidor, destacando o direito do cliente de saber tudo sobre o que compra.
Um comitê brasileiro discute há três anos com a indústria e governos do Mercosul a padronização de informações nas embalagens. Dentro da proposta está um ponto capaz de mudar a rotina de pessoas alérgicas: a exigência de informar sobre a presença de ingredientes perigosos para quem é sensível a eles – assim como ocorre com o glúten. Entre os produtos mais arriscados estão amendoim, leite, castanha e frutos do mar.
No relatório parcial do acordo estudado no Mercossul, há obrigações que forçam o mercado a informar sobre o risco de produtos conterem traços de alergênicos, mesmo que não façam parte da receita principal. Isso ocorre porque a indústria trabalha com cronogramas e linhas de produção, com frequência reutilizando maquinário. Parece complexo mapear isso, mas países da América do Sul alertam sobre contaminação cruzada. Embalagens assim circulam no Brasil – porque a fabricante exporta ou é multinacional e precisa atender a regras da matriz.
Unidas pelo Facebook, onde já existem 27 mil seguidores, as mães fundaram a campanha “Põe no Rótulo”, que está mobilizando a imprensa e fazendo que pais de crianças e celebridades postem fotos com a hashtag poenorotulo no Facebook e o Instagram.
Pressionada, a ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária atendeu às mães. Em abril, reuniu representantes do grupo e de empresas do setor alimentício, governo e organizações de defesa do consumidor. O resultado da reunião é uma proposta de nova norma obrigando as empresas a destacar os ingredientes no rótulo. A norma foi posta em consulta pública e pode começar a valer já em 2015.
Quem quiser apoiar a campanha pode opinar durante a consulta pública da norma e publicar a própria foto na página do “Põe no Rótulo” no Facebook e no Instagram.