Diz o adágio popular que “há males que vem para o bem”. No caso do artista oculto de Fernandópolis Paulo Vicente Ferreira, 57, esta máxima se fez verdadeira já que uma desilusão amorosa há 11 anos aliada ao fantasma da depressão, fez-se necessária uma atividade artesanal para melhoria da saúde, despertando assim um artista que o próprio Paulo desconhecia existir em seu interior. “Nem sabia que eu tinha facilidade. Nunca fiz nada além de trabalhar e só fui à escola até a 2ª série e foi isso que tirou da depressão, porque minha cabeça virou uma coisa” contou o artesão, deixado pela esposa que aventurou-se nos braços de outro parceiro.
Nascido em Itaberaí – GO, o artista goiano, mas de coração fernandopolense, sempre trabalhou na lavoura como no cultivo de arroz, amendoim, milho batata dentre outros. Ele chegou a se mudar de cidade por mais de 10 vezes ao lado dos pais e dos 18 irmãos em busca do sustento. Com talento na construção civil, já depois da desilusão, trabalhou como pedreiro, mas a vida lhe pregaria mais uma peça. Ao descobrir que possuía DPOC – Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica-, atrelado a Bronquite, Asma e um enfisema pulmonar decorrentes do tabagismo, o que lhe afastaria fatalmente do serviço em Uberaba-MG, Paulo foi enganado pelo patrão que lhe fez assinar a demissão sem nem ao menos saber o teor do documento. “Fui enganado, aí junto com a tristeza da mulher ter me deixado fiquei meio louco. Perdi totalmente a confianças nas mulheres. Não acreditava mais nem na minha própria mãe quem dirá nas psicólogas de onde eu me tratava”, explicou.
Em uma unidade de saúde de Uberaba, em 2006, ele recebeu tratamento para parar de fumar, fato que só ocorreria em 2011, completando 30 anos como fumante. Porém, o que lhe matava aos poucos já nem eram as complicações pulmonares, mas sim, a luta diária contra a depressão. Em uma das tentativas das psicólogas, foi passado para o artista uma atividade com qualquer material que pudesse lhe distrair a cabeça. “A psicóloga me mandou passar na serraria e pegar pedaços de madeira e montar algo. Fiz mesinhas, cadeiras, cômodas e aos poucos fui aperfeiçoando a arte fazendo artesanatos com jornais”, relatou o artista, que atualmente faz suas obras de arte com folhetos de propaganda de supermercado.
Com perfeição e simetria admirável, Paulo Vicente enrola os folhetos um a um em forma de canudinhos e cria os mais variados objetos. “Às vezes estou dormindo e no meio da noite me vem uma ideia na cabeça. Aí anoto e no outro dia começo a fazer”, disse ele.
O material utilizado é cedido pelo Pessoto da Cohab, mas nem sempre trabalho foi tão fácil. “Tinha um amigo que pegava na rua, o que já ajudava a limpar a cidade. Mas enrolar amassado era mais complicado. Pegar ele esticadinho é mais fácil”, brincou.
Com um benefício do INSS, pelo afastamento do trabalho em decorrência da doença, o artesão não comercializa suas peças com medo de perder o pouco que recebe. Ele mora atualmente com o ex-sogro em um quartinho construído nos fundos da casa, no Uirapuru. O pequeno espaço se divide entre moradia e oficina de arte onde a simplicidade dá lugar à criação. Além dos bules, xícaras, bandejas e miniaturas de móveis, ele criou até mesmo um mini parque de diversões com brinquedos feitos com papelão, madeira, espuma e vários outros materiais. Os brinquedos equipados com motores de DVD e baterias até se movimentam movidos à energia. “Uma vez uma criança viu os brinquedos e teve até febre. Aí a mãe queria comprar, mas eu não vendo nada. Se a pessoa gosta eu presenteio. Minha felicidade é a pessoa gostar e dizer para mim que gostou”, destacou ele que utiliza cola, tesoura, alicate e verniz para produzir as peças artesanais que possui acabamento impecável.
Com dois filhos e uma neta, que residem em São José do Rio Preto, Paulo Vicente quase não os vê e a solidão é rebatida com as atividades da UNATI – Universidade Aberta à Terceira Idade, onde ainda toca contra-baixo. “Uma moça da FEF presenteou a Maria José da UNATI com uma peça feita por mim e ela quis saber quem era o artista. Daí, passei a frequentar, estudar informática e tocar baixo na banda”, lembrou ele, que já teve uma banda na década de 80 com seus irmãos.
Talentoso, ele também executa instrumentos como sanfona, guitarra, violão, bateria e violino. Na UNATI, local que chama de “cantinho do céu”, ele costuma presentear a todos com seus artesanatos. “Já dei presentes para quase todo mundo de lá. É o pedacinho do céu onde fico boa parte do dia”, destacou o artista.
Quando questionado sobre qual seria seu sonho ele não hesitou em dizer que gostaria do seu próprio cantinho do céu. “Queria meu cantinho. Minha casinha. Fui pedreiro, fiz tantas casas e nunca consegui fazer uma só para mim”, explicou ele que há tempos mora com o ex-sogro.
Outro desejo do artesão é o de mostrar seu talento em rede nacional, no Programa de Silvio Santos. Ele criou uma maquete que simula um motel, com um casal no interior que simulam movimentos por meio de um motor de DVD. Na caixinha feita de madeira, há uma frase que diz: “Não abra, curiosidade mata!”. Ao abrir a tampa existe um cenário criado com bonecos feitos com papelão em uma cama, que se mexem de maneira engraçada. “O Silvio e a Ganzarolli fazem uma farra bacana. Queria que eles pudessem ver o vídeo que fiz da minha maquete do Motel São Paulo”, afirmou ele que colocou nome na obra para se homenagear.
Nossa equipe de reportagem se comprometeu em divulgar seu vídeo e inscrevê-lo em algum quadro do Programa.
Quem quiser conferir o trabalho do artista até então oculto, e quem sabe ser presenteado pode fazer uma visita à UNATI, que fica na Rua Bahia de frente a Praça da Aparecida, onde existem enfeites de mesa e cozinha, frutos da criação artística do artesão.