Um exemplo claro entre a diferença de chefiar e liderar. Maria de Lourdes Avanzo, 68, até hoje consegue mostrar a importância de uma diretora dentro de uma escola. Exercendo atualmente seu papel de liderança no Colégio Coopere, “Dona Lourdes” como é conhecida, tem passagens pela JAP, onde iniciou sua carreira substituindo outros professores de Língua Portuguesa em 1980; na Sansara Singh Filho de Ouroeste, onde dirigiu pela primeira vez conquistando reconhecimento regional; na Coronel Francisco da Silva e na EELAS.
Nascida em Tanabi, mas arraigada há 44 anos em Fernandópolis, desde jovem a persistente Maria de Lourdes já dava mostra de que se daria bem na carreira escolar. Órfã de mãe desde os 10 anos, a filha mais velha cuidava dos dois irmãos e ainda viajava até Macedônia para estudar à noite. Na extinta avaliação para admissão da 5ª série, Dona Lourdes ficou em 1º lugar numa turma de mais de 40 alunos.
Formada em Letras e Administração pelo Centro Universitário de Votuporanga (UNIFEV), Dona Lourdes se tornou diretora no primeiro concurso, à época, em que professores não efetivos poderiam ser nomeados. “Diziam que eu estava estudando à toa, pois não seria nomeada. Quando passei fiquei sabendo que de Rio Preto até a barranca do rio eu poderia escolher onde queria trabalhar”, disse ela.
A diretora se aposentou em julho, mas como mais uma vez o dever chamou, ela diz não conseguir negar o trabalho por ser injusto prejudicar uma escola. Em entrevista, uma das primeiras diretoras de Fernandópolis conta um pouco de sua experiência e os desafios da função.
No último dia 12 foi comemorado o Dia do Diretor de Escola.Como moldar o perfil para desempenhar esta função? É o mesmo que em sala de aula ou é preciso adotar outra postura?
Eu sempre gostei de manter a ordem. O professor tem que se impor em sala de aula não como um ‘sabe-tudo’, o dono da verdade, mas ele tem que fazer com que o aluno acredite nele. Tem que passar confiança através de uma amizade e de um conhecimento sólido onde o aluno passa a acreditar naquela pessoa que está na frente dele.
O que é preciso para exercer bem esta função?
É preciso muita coisa. Além do conhecimento é preciso saber entender as pessoas. Não apenas alunos, mas os pais, funcionários, professores e todo que estão ao seu redor. É preciso procurar esclarecê-las de seus ideais e objetivos e sempre fazer as cosias juntos, nunca isolado.
A falta de pulso firme pode comprometer a organização de uma escola?
Muito. Em todos os sentidos. O profissional tem que ter um preparo não de dominação, mas um preparo para ser um alicerce. Então, se você não tiver esse preparo a ‘casa vai cair’. Todos esperam isso de você.
O medo dos alunos em ir para a diretoria é um resquício de uma época em que o professor era mais rígido e possuía mais liberdade para educar as crianças?
Eu creio que não existe mais esse medo. Apesar de que depende da pessoa que está na direção. Nunca gostei de colocar medo nesses alunos. Sempre, claro, fui firme diante da falha do aluno mostrando a ele que aquilo não pode acontecer, mas sempre mostrando que ele é capaz de ser o melhor do grupo, melhor da escola, passando a ele essa confiança. Por isso eu tenho bom contato com todos eles.
Nos dias de hoje, qual a senhora julga ser seu desafio diário na direção de uma escola?
Existe uma apatia hoje dos estudantes e não sei o porquê. Nós também vivemos num mundo totalmente diferente. Temos um mundo conectado onde o aluno busca outros meios, mas infelizmente essa facilidade da informação é grande. O aluno está aberto a um mundo da comunicação através dos celulares, tablets, notebook... Isso é muito bom mas, por um outro lado está trazendo uma apatia, estão menos interessados. O grande desafio é saber o que a escola precisa fazer para ser mais interessante. A escola virtual da vida está bem mais interessando que a escola física do dia a dia.
Quando ingressou na carreira como diretora, quais os principais motivos que levava os alunos à sua sala? E atualmente, é o uso de celulares?
Antigamente o principal motivo era falta de tarefas, não querer fazer as coisas, ausência em aula, brigas, mas hoje em dia tem poucos que vão à diretoria. Acredito que levo sorte, pois meus problemas nem são problemas.
Em meio a desvalorização do professor, a senhora chegou a ser, em algum momento, psicóloga, encorajando algum professor que estava abatido?
Sim, você sabe que a vida nossa é cheia de altos e baixos. O professor é um ser humano e tem seus problemas pessoais. Sempre procuramos fazer com que ele tenha ânimo, seja ousado e não tenha medo de certas coisas.
A senhora conquistou um grande respeito em Fernandópolis, mas tem muito prestígio na E.E Sansara Singh Filho onde tem, inclusive, um grande quadro com sua foto. A que se deve esse reconhecimento em Ouroeste?
É difícil responder, pois não é fácil falar da gente. Em Ouroeste meu trabalho se confundiu com a comunidade. Não era apenas a escola, eu estava ligada à igreja, aos pais, à comunidade. Tinha um vínculo muito forte, por isso ainda tenho muito respeito lá e digo que jamais esquecerei aquela época. Se pudesse começar tudo outra vez eu começaria, pois me realizei profissionalmente. Não fiz tudo que precisava, mas, fiz tudo que pude.
Embora não tenha sido mãe efetivamente, a senhora exerceu esse papel com seus irmãos por ter perdido a figura materna precocemente. Esse sentimento de mãe já interferiu em alguma decisão diante de um aluno que foi para diretoria e chorou na sua frente?
Sim. E isso não foi apenas uma vez. Amar não é só fazer o que a pessoa quer. Você tem que ser firme, falar duro com ela. Posso até de afirmar que muitas vezes eu perco o sono, choro por ter que ser dura com um aluno, pois não pode ser dois pesos e duas medidas. Tem que ser firme quando precisa e elogiar quando merece. Mas nutro pelos meus alunos um carinho muito grande. Não tive filhos, mas meus alunos são meus filhos.
Conseguiria definir a diretora dona Lourdes em poucas palavras?
Audaciosa, guerreira e acredito no poder de transformação das pessoas.