O homem que viaja há mais de dois anos de cavalo pelas Américas passou por Fernandópolis e contou sua história a CIDADÃO
Filipe Masetti Leite, nascido em Espírito Santo do Pinhal (região de Mogi Guaçu), 27 anos. Este é o personagem que chama atenção pela sua trajetória, por onde passa.
Quando Filipe tinha dez anos, foi para o exterior, mais precisamente para o Canadá. A ideia foi de seu pai, Sr. Iso Leite, que vendeu tudo que tinha para se mudar com a família para a América do Norte. “Meu pai queria que fossemos educados por lá, em uma cultura mais civilizada, para aprender inglês, etc.”.
Durante sete anos a família Leite ficou no Canadá, até retornarem para o interior de São Paulo. Mas não demorou muito para que Filipe retornasse à terra das folhas de bordo. Ganhou uma bolsa e foi estudar jornalismo na Universidade de Ryerson, na capital Toronto. Durante cinco anos, o posterior cavaleiro batalhou para se formar e ser reconhecido como jornalista. O que mais tarde viria a ajuda-lo a planejar um documentário.
Enfim formado, o jovem teve tempo de começar a pensar em um antigo sonho. “Quando eu era pequeno, meu pai lia um livro para mim, chamado “Tschiffely’s Ride”, que conta a história de um suíço que cavalgou da Argentina até os Estados Unidos, no ano de 1925, com dois cavalos”. Após ler o livro várias vezes, e já formado, Filipe começou a sentir algo forte dentro de si, até que se perguntou: “e se eu fizesse hoje, essa viagem que suíço fez, mas de forma contrária, do norte para o sul, voltando para minha casa?”.
Sempre apaixonado por cavalos por conta do pai, começou a fazer pesquisas. “Será que é possível?”, se perguntava, até que decidiu publicar a ideia em seu perfil do facebook. “Se a ideia ficasse só dentro de mim nunca iria ser real”.
Quando publicou, todo mundo contestou. Muitos comentários duvidando que Filipe estivesse falando sério apareceram, mas para a surpresa de todos, ele realmente estava. O ponto de partida foi esse, mas não foi nada fácil começar.
“Ralei muito, foi um ano e meio só para sair de casa. Trabalhava o dia inteiro, chegava de noite e trabalhava no projeto. Trabalhava com ferraria, cavalos, construção, restaurante, jornalismo, onde pagava eu trabalhava”. E dentre muita procura de apoio e patrocínio, as coisas começaram a dar certo. Afinal, é bom ressaltar que Filipe não tinha nem mesmo uma ferradura antes de sua partida.
“De uma hora pra outra as coisas foram dando certo. Uma produtora americana entrou em contato comigo, comprou o projeto para posteriormente virar um documentário, me deram dois cavalos, e bastou”. Foi assim que Filipe partiu de Toronto rumo a sua cidade natal, há pouco mais de dois anos. Na companhia de dois cavalos quarto de milha, e mais tarde de um cavalo selvagem, da raça mustangue.
Perguntado se durante os mais de 700 dias de viagem pensou em desistir, disse: “não teve como pensar nisso, porque a partir de quando se começa algo, tem que terminar”. Além disso, abandonar os cavalos era a última coisa que o jovem faria. O sentimento era realmente superior a de ser humano andando em cima de um animal.
“Considero meus cavalos como meus filhos, pois acordava, dormia, tratava, cavalgava e presenciava tudo com eles”, disse Leite. As montanhas que já subiram, os rios que já atravessaram e todas as “emboscadas” que já presenciaram reforçam o argumento de que o relacionamento entre o caubói e seus cavalos era como de pai e filho. “Em dois anos com eles, eles acabaram virando minha família. “Sozinho” na estrada, eu já conversei e desabafei muito para eles”.
Nem tudo são rosas. Houve momentos do jovem se perguntar o que estava fazendo, quando passou por situações complicadas com os animais. Um de seus cavalos foi atropelado, outro caiu em um buraco enorme, passaram em meio a traficantes, em estradas com gente morta na margem da estrada, deram “de cara” com ursos, além de épocas de calor, frio, etc. “Tem que matar um leão por dia, depende muito do mental”.
O OPOSTO – OS CAVALOS CONSIDERAM FILIPE UM PAI
Quando um de seus cavalos caiu no buraco, ficou assustado, se debateu, e segundo o cavaleiro, a todo momento o animal olhava em seus olhos como se estivesse dizendo “e agora? O que eu faço? Me ajude!”. Neste caso, foram necessárias duas horas pra tira-lo do buraco, em um processo de muita paciência e confiança.
Seu mustangue caiu em um “mata-burro” na Nicarágua. O mesmo processo se repetiu, e novamente Filipe foi capaz de acalmá-lo e tira-lo da difícil situação. “Em momentos assim você sente o amor e a segurança que o cavalo sente no homem”.
UM SONHO HERDADO
“Essa viagem era o sonho do meu pai, eu ganhei esse sonho dele”. O conhecido Sr. Iso Leite sempre almejou este trajeto, até porque leu o mesmo livro que o filho. O nome “Filipe”, inclusive, foi dado ao jovem justamente por significar “amigo dos cavalos”.
E o extinto de aventuras veio do mesmo. Iso participava de corridas de MotoCross, foi pra Europa aos 16 anos, só de mochila, e o mais importante: durante três meses, cavalgou com o filho no México, percorrendo mil milhas. “Poucas pessoas tem a oportunidade de viver uma aventura dessas com um pai. Dormir na barraquinha, comer feijão na fogueira, ouvir tiros, e muitas outras coisas”, disse Filipe.
“Ele sempre me apoiou. Ficou com um pé atrás no começo, mas sempre se mostrou muito feliz por eu estar realizando o sonho dele, e também o meu”.
Hoje o pai de Filipe está em Espírito Santo do Pinhal. O “Cavaleiro das Américas” partiu, após três dias de estadia em Fernandópolis, e está indo para Barretos, aonde dia 23 chega para a festa de peão, e de lá cavalga com o pai por dez dias, até chegar a sua cidade natal. “Quando chegarmos, vou “aposentar” os cavalos, e começar a trabalhar em cima do livro e do documentário”. Até porque, de acordo com todos os que conheceram Filipe pela estrada, toda essa história merece ser registrada e mostrada para o mundo.
HISTÓRIAS
O jovem já passou por muitas situações delicadas. Já dormiu na casa de um homem que matou a única galinha que tinha, só para poder-lhe oferecer o que jantar. Também dormiu na casa de traficantes em Honduras. Mas, a história mais peculiar é a de um senhor do Colorado, que conheceu no início de sua viagem.
Segundo as palavras de Filipe, o Senhor disse: “Jovem, vou te perguntar uma coisa muito estranha. Você pode até responder que não, eu vou entender. É uma coisa muito forte dentro de mim, acredito no destino e creio que foi ele que te trouxe até aqui. Mas eu tinha uma irmã que morreu há dois meses. Se ela estivesse viva, ela ia querer ir com você nessa viagem, pois ela amava aventuras e cavalos. Então queria perguntar se leva as cinzas dela com você para soltar em um lugar que achar merecido”. Sensibilizado, o cavaleiro carrega as cinzas da jovem irmã do Senhor até neste momento, pretende soltar ao final de sua jornada, e considera isso um possível sinal.
“Durante toda essa viagem, não faltou oportunidade para morrermos, mas não morremos. É como se houvesse um anjo acompanhando a gente. Esse anjo, talvez possa ser a irmã do Senhor”.
A canadense Emma Brazier, namorada do rapaz, passou a acompanha-lo com uma van cedida por uma equipe de Barretos. Ela também já cavalgou alguns períodos com Filipe. A expectativa é de que a jornada termine no próximo mês, para que o livro e documentário de toda essa história possam ser planejados.
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