Ela deixa uma história de luta na assistência a pacientes carentes com câncer com a fundação da Associação de Voluntários no Combate ao Câncer em 1998
Morreu na manhã deste sábado, 3, a ex-vereadora e fundadora da AVCC – Associação de Voluntários no Combate ao Câncer - Candinha Nogueira. Ela foi vereadora no mandato 2009 a 2012 e estava internada no Hospital Beneficência Portuguesa em São José do Rio Preto desde mês passado. Chegou a precisar de transfusões de sangue mobilizando uma campanha de doação de sangue nas redes sociais.
O velório será realizado no auditório da Prefeitura Municipal de Fernandópolis (antiga Rodoviária) das 17h às 23h e amanhã, das 6h às 10h.
Cândida de Jesus Silva Nogueira tem uma história de luta na assistência a pacientes carentes com câncer. Junto com grupo de amigos, fundou em 1998 a AVCC para prestar assistência a pacientes carentes em tratamento contra o câncer.
A AVCC divulgou a seguinte nota nas redes sociais: "A AVCC de Fernandópolis lamenta profundamente a morte de Candida de Jesus Silva Nogueira, que emprestou seu nome para a entidade e lutou bravamente contra a doença que motivou a sua criação. Pequena no tamanho e gigante na coragem, Candinha se foi, mas deixou uma história de amor ao próximo e uma rede de voluntários abnegados em prol de uma vida mais digna aos pacientes de câncer. A doença pode ter vencido essa batalha, mas seu legado nos fará continuar lutando essa guerra. Queremos deixar registrado nosso pesar e nossa gratidão eterna a Candinha. Aos amigos e aos voluntários, a certeza de que sua luta não foi em vão. Ao Jesus, ao Johnni e a Cíntia, nossos sentimentos e a certeza de que os ideais da Candinha continuarão sendo buscados por todos nós. Obrigado, Candinha!".
O prefeito André Pessuto também foi as redes sociais manifestar seu pesar: "Hoje Fernandópolis perde uma de suas filhas mais ilustres. A nossa "Candinha da AVCC". Mulher guerreira, bondosa, sempre pronta em ajudar ao próximo. Lutou bravamente. Perco uma amiga pessoal que me acompanhava desde quando era vereador. Presença constante nos nossos dias, sempre estava ali nos apoiando com os eventos beneficentes. Minha solidariedade a família, mas saibam que ela deixou um legado em nossa cidade. Todo meu carinho e respeito neste momento de dor" .
Candinha Nogueira descobriu o câncer em 1994, um mieloma múltiplo (é o câncer de um tipo de células da medula óssea chamada de plasmócitos, responsáveis pela produção de anticorpos, comprometendo a produção das outras células do sangue). Chegou a fazer transplante de medula óssea, mas é uma doença crônica e que sempre tem uma recaída como ocorreu recentemente levando a mais uma internação no Hospital Beneficência Portuguesa onde faleceu na manhã deste sábado.
Em entrevista ao CIDADÃO, em fevereiro de 2020, às vésperas do aniversário de 22 anos de fundação da AVCC que ocorreu em 1998. “Deus me usou para lançar esta semente”, disse. A entidade que chegou a construir um prédio ao lado da FEF com o sonho de um hospital, hoje Instituto de Prevenção do Hospital de Amor que assumiu em 2012. Agora a entidade está trabalhando para construir sua sede própria em área doada pela família Matias na zona norte da cidade,
Relembre a entrevista:
AVCC foi uma semente lançada pela senhora em 1998. Como foi?
As vezes a gente ouve que uns são levados pela dor, outros pelo amor para fazer determinada coisa. Graças a Deus eu já fazia parte da igreja (católica) quando descobri o câncer, um mieloma múltiplo, isso em 1994. Passaram-se quatro anos de tratamento, um dia fiquei pensando sobre como viviam as pessoas carentes com câncer. Esse questionamento me chamou a atenção. Falei com o meu esposo, o Jesus (Nogueira) e com Jesus Cristo lá em cima, que nós precisávamos fazer alguma coisa. Tenho certeza que Deus me usou para plantar essa semente. A partir desse questionamento começamos a procurar as pessoas, a igreja e foi onde nasceu a AVCC.
A ideia já era criar uma entidade para assistir os pacientes carentes?
Na época, começamos a nos reunir em casa. Procurei o padre Mário e ele até sugeriu que ficasse na Promoção Humana, mas eu disse a ele que Deus estava querendo algo mais audacioso, que não ficasse dentro de uma igreja. Nós entramos em contato com o pessoal de Barretos que se propuserem a vir em Fernandópolis ajudar a fundar essa associação que nem nome tinha. Fomos juntando pessoas amigas, quem já tinha passado pelo câncer, familiares. Eles marcaram para o dia 4 de fevereiro a fundação. Procuramos o prefeito que era Armando Farinazzo e ele nos deu todo o apoio. A primeira reunião foi no dia 4 de fevereiro na Acif, que abriu as portas. Foi ali que nasceu a AVCC e começamos a procurar saber quem eram as pessoas que faziam tratamento de câncer. O primeiro trabalho foi fazer os lanches que se colocava nos ônibus, como é feito até hoje. Muita gente dizia que queria participar, mas antes queriam conhecer o trabalho. Não tinha o que conhecer, a entidade estava nascendo e era preciso fazer acontecer. E aconteceu, Graças a Deus. Na mesma época, no meu retorno ao médico, tive que enfrentar o transplante de medula óssea. Em junho daquele ano fui transplantada e foi um ano para poder recuperar. Mas, as pessoas vestiram a camisa e a AVCC começou a dar assistência para as pessoas carentes. Ia nas casas, levava sopa pronta, fazia os lanches para colocar no ônibus e foi juntando gente. Fazia-se coisas que hoje não pode ser feito, a gente tinha um trabalho de enfermagem que cuidava do paciente, muitas vezes sozinho. O projeto foi caminhando e a AVCC aperfeiçoando seu atendimento.
Nessa caminhada, o que mais te marcou?
A AVCC é como um filho. Qualquer coisa que se fala da AVCC, pra mim é muito tocante. Eu me emociono, porque é uma vida. Olha, quando chega uma doação de algo que estamos precisando, é uma alegria. Tudo é muito marcante. É como uma mãe, que se importa com tudo que o filho faz. Teve coisas desagradáveis, mas em todo lugar tem as coisas menos boas. Mas, de tudo que é ruim, ainda assim, tem proveito para uma virar uma coisa boa. Tenho certeza que Deus me usou para plantar essa semente da AVCC
A AVCC chegou a sonhar com um hospital?
Quando a AVCC nasceu, era para cuidar das pessoas com câncer que faz o tratamento e que, em casa, muitas vezes faltava uma assistência e até comida. Esse era o objetivo. Quando se junta com outras pessoas, emenda com outros sonhos, isso fez nascer o sonho do hospital. Foi tudo muito louvável o que a AVCC fez, o povo construiu um hospital. Eu sempre falo que construir não chega a ser tão difícil, mas tocar um hospital é complexo. Foi a época que bateu a dificuldade e que decidiu-se passar para o Hospital de Câncer de Barretos cuidar. Foi louvável o que aconteceu. Que bom seria se estivesse funcionando como hospital e não apenas um centro de prevenção. Mas, é maravilhoso, a gente vê a felicidade desse povo de estar aqui para fazer um exame de mamografia. Tudo é muito bom, mas eu gostaria de ver Barretos colocar aqui o tratamento paliativo. Nós da AVCC vemos com muita tristeza, pacientes que moram sozinhos, que precisam de um tratamento paliativo e as vezes não tem nem família para fazer isso. A gente entende a dificuldade de Barretos, mas isso é necessário. Vamos continuar lutando.
O que a AVCC devolveu para você neste tempo?
Nossa, a AVCC na época que fui transplantada, em 1998, me ajudou muito. Recebi muito apoio. Depois fiz uma cirurgia quando necrosou a cabeça do fêmur, a AVCC me ofereceu todo o cuidado paliativo. Na minha vida é um orgulho. Teve momentos difíceis, com muitos problemas, mas nunca deixei de ter orgulho porque me sinto escolhida por Deus para plantar essa semente e ajudar a cuidar dela durante todo o esse tempo. Não consigo ver a cidade sem a AVCC, temos muita gente passando por muitas necessidades.
Qual o papel da entidade em Fernandópolis?
Vou dar um exemplo. Tem muitos pacientes que precisam de suplemento alimentar e só sobrevivem com isso. Aí ele entra na Justiça com pedido para o governo fornecer, mas isso demora muito e as vezes não chega a tempo. A AVCC entra aí para suprir essa necessidade. A verba da Sabesp (percentual de 2% sobre o lucro operacional – 1,5% para a Santa Casa e 0,5% para a AVCC), é uma das únicas que a entidade recebe e que representa em torno de R$ 16 mil por ano. Em 2019 a gente recebeu o repasse de dois anos seguido, algo em torno de R$ 35 mil e desse montante usamos R$ 16 mil para comprar suplementos alimentares, dada a necessidade. E a gente tem que fazer o que é possível para ajudar essas pessoas e aí inclui também fraldas geriátricas, leite porque o consumo é de 350 litros por semana para atender cerca de 80 assistidos, cesta básica, frutas, legumes. Temos que fazer a nossa parte e não ficar esperando pelos governos. A AVCC não sobrevive sem os voluntários.
Mas, nada disso seria possível sem os voluntários?
Não sobreviveria sem os voluntários. Temos em média 400 voluntários, só cuidando do lanchinho de madrugada são 200. Temos a equipe da farofa na segunda-feira, na terça a equipe do doce, na quarta a do pão, na quinta tem a equipe de bordados e na sexta a do doce. Tem o pessoal que vai para a porta de mercado no primeiro sábado de cada mês, com revezamento de duas em duas horas. Tem o pessoal que faz a visita, toda quarta-feira, utilizando seu próprio carro e levando leite e o kit de frutas e legumes para os assistidos. Tem ainda a cesta básica mensal para aquele paciente que precisa, média de 70 cestas distribuídas mensalmente que são montadas com o que se arrecada na porta dos mercados e o que falta a AVCC compra. Então, é com a ajuda dos voluntários que a gente consegue ter a renda para cobrir as despesas, e sempre é preciso realizar eventos. A gente faz o que pode mas procura não deixar ninguém sem assistência.
Isso dá energia para seguir adiante?
Sim, eu retornei ao tratamento contra o câncer, tive uma recaída. Faço tratamento desde 94, as vezes passa quatro anos sem problemas, eles falam em remissão, depois volta. Mieloma múltiplo é uma doença crônica, mas tenho chance de tratamento. Hoje eu tomo um remédio que vi nascer durante esse tempo, o Velcade. Numa recaída há uns seis anos, o médico disse que tinha uma carta na manga e comecei a tratar com esse medicamento, uma injeção subcutânea, misturam com outros medicamentos, fazem um coquetel e tomo. Mas, temos que fazer com que esses medicamentos cheguem para as outras pessoas que não tem um convênio como eu, que Graças a Deus, tenho o convênio de quando o Jesus trabalhou na Cesp. Nós sabemos a dificuldade do SUS que não consegue dar um suplemento alimentar, imagina um remédio desse que é tão caro. Isso me preocupa muito, porque sei o sofrimento que essas pessoas passam. Mas, como para Deus nada é impossível eu tenho fé que isso vai mudar.
Qual mensagem você passaria ao povo de Fernandópolis?
Eu digo muito obrigada, minha gratidão eterna. Não tenho palavras (emocionada) porque eu sempre falo que o povo carrega a AVCC. Nós não temos ajuda do governo (federal, estadual e municipal). Estamos batalhando por isso. Se um deputado estadual ou federal quiser destinar uma ajuda, não temos como receber. Então, a gente olha e se pergunta: Como sobrevive? A resposta é o povo, ele carrega a entidade. Nós vamos passar, mas a AVCC vai continuar. O povo precisa continuar generoso, porque tem sempre alguém precisando desse atendimento.
Candinha durante entrevista à Rádio Difusora FM no início do ano no lançamento do projeto de construção da nova sede da AVCC no Residencial Mathias na zona norte da cidade