Nesta segunda-feira, 19, vai acontecer no Salão do Júri do Fórum de Fernandópolis, às 16 horas, a solenidade para a comemoração da elevação da Comarca à Entrância Final. O Juiz diretor do Fórum Heitor Katsumi Miura diz, nesta entrevista ao CIDADÃO, que será uma oportunidade de apresentar à comunidade de Fernandópolis, e para as cidades da comarca, a conquista obtida através de lei aprovada um ano atrás e que entra em vigor agora. “Vamos celebrar essa conquista que foi uma luta de muitos anos, iniciada por colegas juízes que hoje não estão mais na cidade”, lembra. “A elevação da Comarca a Entrância Final poderia ter ocorrido há mais tempo não fosse a interferência de uma liderança de cidade vizinha. Mas, finalmente conseguimos”, acrescenta o juiz. Como Comarca de Entrância Final um juiz não precisará mais deixar a cidade para obter promoção. “Eu mesmo já tinha decidido que ficaria em Fernandópolis, mesmo se continuasse Entrância Intermediária. Agora, com a elevação, vamos poder nos inscrever para a promoção”, afirmou. Veja a entrevista:
Na prática qual o significado da elevação da Comarca de Fernandópolis para Entrância Final?
É o resultado do trabalho de muitas pessoas. A gente tem que marcar isso muito bem. Foram vários os colegas juízes, que nem aqui estão mais, que se promoveram para outras cidades. Nós continuamos esse trabalho com os colegas novos que estão aqui em Fernandópolis. Uma dos efeitos práticos da elevação de Entrância é que o juiz não vai precisar mais sair da cidade para se promover. Ele se promove e fica aqui mesmo em Fernandópolis, tem essa opção. É claro que tem colegas, que têm famílias em cidades distantes e desejam na promoção retornar para mais próximo. A cidade não será mais um lugar de passagem, aonde o juiz chega, fica dois ou três anos e vai embora. O juiz poderá se aposentar em Fernandópolis. Com isso, o juiz pode conhecer melhor a cidade, a comunidade, os bairros, tomando ciência da realidade, dos problemas e virtudes da cidade. Isso é muito interessante para a cidade.
Significa então que a Comarca de Fernandópolis se equipara às grandes comarcas do Estado?
Ela se equipara a São Paulo, São José do Rio Preto, Campinas. Depois da Entrância Final é a promoção para o Tribunal de Justiça do Estado que é a segunda instância do Poder Judiciário. Tem uma observação que a gente faz: a elevação da comarca não significa a promoção para os juízes. A Comarca vai ser elevada, mas nós que estamos aqui, continuamos como juízes de Entrância Intermediária. Nós vamos, quando abrir concurso de promoção, nos inscrever para tentar promover com a opção de ficar em Fernandópolis. Eu, por exemplo, não ia me promover nunca porque quero permanecer em Fernandópolis e ia ficar como juiz de Entrância Intermediária para sempre. Agora não, eu tenho a possibilidade de conseguir minha promoção e permanecer na cidade. É claro que pode surgir uma eventualidade, as crianças crescerem e irem para a Faculdade e a esposa querer ir junto para outra cidade. Essa é uma possibilidade que existe, mas a intenção é ficar aqui. Com essa elevação os juízes e os promotores vão poder ter essa opção de ficar em Fernandópolis onde a gente forma vínculos, passa a viver a comunidade, seus locais, tradições. Como sou da região, então meu interesse é ficar por aqui.
E para os funcionários, alguma perspectiva?
Outro aspecto importante também é a perspectiva que se abre para os funcionários do Fórum de Fernandópolis. São funcionários que estão aí, um grande número deles, há 15 anos, 20 anos e não tinham uma perspectiva de melhorar porque não tem uma carreira para os servidores do Judiciário. Existem alguns cargos determinados, mas são poucos. Com a elevação, vão ser criados novos cargos, por exemplo, no Cartório Distribuidor e na Administração que tinha uma chefia em cada um deles, e que passará a ter três chefias. São três cargos com perspectiva dos servidores daqui se promoverem para esses cargos. Isso motiva mais os funcionários. Aqui, como regra, os funcionários são muito interessados em melhorar a prestação do serviço.
Em termos de estrutura do Fórum, teremos mais juízes, mais funcionários?
De imediato não. O orçamento do Poder Judiciário está limitado sofrendo impacto muito grande. Isso significa que vamos ter que ir atrás e buscar mais servidores. É fato que todas as comarcas do Estado estão com falta de funcionários, todos estão pedindo e eles têm de atender todos os lugares. Fernandópolis é uma delas. Com a elevação nós temos a perspectiva de conseguir mais funcionários, mas isso não é automático. O número de Varas também, por enquanto, será o mesmo, mas a gente tem a perspectiva de conseguir algo mais. Não podemos ficar parado, sentado, esperando. O pessoal que está na capital, está distante e é por isso que temos que ir lá e lembrar que estamos aqui a 550 km e que a cidade merece melhorar sua estrutura de atendimento. Ninguém vai mandar as coisas e colocar o presente no nosso colo se a gente ficar parado. O trabalho tem que continuar... Nós contamos com as lideranças locais, com os políticos, com a OAB e o Ministério Público que são nossos parceiros.
Nessa elevação de Entrância, vai mudar também a estrutura da Comarca, com Ouroeste que hoje é Foro Distrital subindo para a categoria de comarca?
Bem lembrado. Ouroeste quando não tinha o Foro Distrital, as pessoas tinham que vir para Fernandópolis para resolver seus problemas. Foi criado o Foro há cerca de 9 anos e foi uma coisa bacana porque as pessoas não precisavam sair mais da cidade. Foi também criado um Tabelião, um Registro Civil e agora tem a elevação do Foro para Comarca, que vai ficar independente de Fernandópolis. Com comarca chegam outros benefícios. Nós temos que pegar estrada para passear e não para resolver problemas em outros lugares. Aqui mesmo, em Fernandópolis, nós tivemos uma perda que julgo muito significativa, que foi do Posto Fiscal. O que antes se resolvia aqui em Fernandópolis agora tem que ir para outra cidade e isso não é bom.
A comarca em Ouroeste vai desafogar Fernandópolis?
Sim, também desafoga Fernandópolis e a gente fica mais focado em nossos problemas.
Hoje a demanda de processos no Fórum de Fernandópolis, como anda?
É muito cíclico, mas a gente percebe um aumento gradual ao longo dos anos da demanda pela prestação jurisdicional. Existe um grande número de profissionais do Direito que está ai para atender a população nas suas necessidades. As demandas chegam ao judiciário às vezes por falha de alguns serviços, tanto os públicos quanto os privados. Os problemas que não se consegue resolver administrativamente acabam vindo para o Judiciário. E isso vai aumentando ano a ano. É por isso que precisamos buscar estruturar o Fórum de Fernandópolis para atender essas demandas. Se ficarmos esperando, vai chegar um momento que não vamos conseguir atender os casos que chegam aqui.
Com relação à rotina de trabalho do Juiz, a distância entre o real para o ideal é muito grande?
A cidade de Fernandópolis é um lugar bom para se trabalhar. Existem problemas, a estrutura não é igual de cidades grandes, mas é razoável. Percebemos que a estrutura física do Fórum que foi deixada pelos juízes diretores mais recentes como Dr. Alceu, Dra. Luciana, o Dr. Evandro Pelarin, é muito boa. Vamos procurar agora promover uma adequação nessa estrutura, tirando as salas de audiência da ala dos gabinetes dos juízes e instalar duas salas de audiências unificadas para todos os juízes, realizando audiências de manhã e a tarde, para melhorar o sistema de trabalho no Fórum. Aqui, os juízes conversam entre si, procuramos uma rotina de diálogos, respeitando os posicionamentos de cada um. Coisa mais difícil que tem é convencer um colega juiz, é igual a torcedor de futebol, cada um defende seu time. Temos juízes com pensamentos diferentes e a gente tem de respeitar o espaço de cada um. Nem tudo que a gente pensa que é correto, o outro pensa também, às vezes tem um pensamento diametralmente oposto. O bom é que a gente consegue esse diálogo com os colegas.
Quando se discute sobre impunidade, logo vem para as pessoas que isso é culpa do Judiciário. Como vocês juízes lidam com essa situação, principalmente em relação aos casos que se arrastam anos a fio, por conta da infinidade de recursos?
É a imprensa que diz que o Judiciário é o culpado (risos). Brincadeiras à parte, existe sim uma demanda muito grande da população e da própria imprensa que os problemas sejam resolvidos com maior celeridade. O Judiciário tem que seguir a lei, o juiz tem que seguir a lei. Agora mesmo alteraram o Código de Processo Civil e falaram que ia ser uma maravilha que o processo ia correr mais, só que percebemos o seguinte: os prazos que eram contados em dias corridos se transformaram em dias úteis. Ora, um prazo de 10 dias que antes terminava em 10 dias, hoje termina em 12 ou 15 dias, pela contagem de dia útil. Ou seja, vai demorar mais. Recursos, quantos recursos cabem contra uma decisão interlocutória? Cabe o agravo, depois o embargo de declaração, agravo interno e depois recurso especial. Volta o processo a correr, tem a sentença, ai cabe embargo de declaração, apelação, agravo interno, recurso especial, agravo contra despacho denegatório de recurso especial, recurso extraordinário, agravo contra despacho denegatório de recurso extraordinário, agravo interno no STJ, agravo interno ao STF, embargo de declaração no STJ, STF e ai finalmente termina o processo. Pelo juiz, ele gostaria que fosse feita imediatamente, mas temos que seguir a lei para garantir direito de defesa, do contraditório. O legislador e o povo brasileiro optaram por um processo um pouco mais demorado.
O senhor tocou no assunto e no STF tem a discussão do réu condenado em segunda instância se ele deve ou não começar a cumprir pena. Qual sua posição?
Como juiz, temos que cumprir a lei e seguir jurisprudência. Agora existe esse precedente. A efetividade é maior porque acelera o cumprimento da pena. A perspectiva de reforma da decisão depois da segunda instância é muito pequena. O percentual de sentenças condenatórias reformadas no STF é em torno de 2%. Agora está sendo rediscutida novamente por causa da pressão de alguns grupos que se viram na perspectiva de cumprir pena de prisão com esse posicionamento. A grande maioria dos juízes de primeira instância quer que o cumprimento seja imediato, porque se o juiz decide ele tem a certeza que a pessoa que condenou é culpada. Pode vir depois uma decisão do Tribunal reformando a sentença condenatória, o juiz, ainda que contrariado, vai ter que cumprir. Os juízes são os cumpridores da lei. A gente costuma brincar que o juiz é o primeiro que obedece. Até porque o Tribunal pode mandar prender um juiz.