O sonho da casa própria que se transformou em pesadelo

20 de Agosto de 2025

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O sonho da casa própria que se transformou em pesadelo

Dia 1º de setembro de 2013. Data que era para ficar marcada para sempre na memória de Eliana Ramos de Jesus de Sousa, como um dos dias mais felizes de sua vida, afinal, realizara ali um de seus maiores e mais antigos sonhos: o de ter a casa própria.
Alguns dias antes, ela e seu então marido Nilson tinham ido ver a casa onde morariam pelos próximos anos, o teto que chamariam de seu. Tratava-se de uma casa simples na Rua Manoel Gonçalves, Parque Universitário.
Quando chegaram ao endereço para a avaliação do imóvel, foi amor à primeira vista. A casa recém-construída ainda cheirava a tinta, o tamanho era exatamente o que eles precisavam e tudo parecia perfeito.
Foi então que olharam para o dono do imóvel, seu Nelson (Ferreira Pessoa), e disseram: “Negócio fechado, vamos ficar com a casa”.
De origem humilde, porém de caráter ilibado, conseguir o financiamento junto ao programa “Minha Casa, Minha Vida” não foi problema. Os trâmites burocráticos se sucederam, como a vistoria da moradia pela Caixa Econômica Federal, aprovação dos projetos, etc, etc e etc, até que o dinheiro foi liberado, seu Nelson pago, e a família poderia, enfim, se mudar para seu novo lar.
 Mal sabiam os moradores que começariam a viver o pior pesadelo da vida deles. Nos seis primeiros meses tudo parecia normal, até que, os acabamentos em gesso da casa começaram a cair.
“Foi um susto grande, mas pensávamos que pararia por ali. Não sabíamos que era um sinal de que o pior estava por vir”, contou Eliana.
Algum tempo depois, é que veio esse pior. A dona-de-casa foi pegar uma panela no armário de sua cozinha, para preparar o jantar e o piso afundou com ela. Além do susto, alguns cortes nas pernas e a certeza de que algo estava errado.
“Não tinha como uma casa nova estar naquela situação. Imediatamente decidimos procurar a Caixa, que disse não ter nada a ver com o problema e mandou a gente procurar as pessoas que nos venderam e assim nós fizemos”, completou Eliana.
Nesse ínterim, mais problemas apareceram. Os detalhes em gesso praticamente deixaram de existir e rachaduras tomaram conta de praticamente todas as paredes da casa.
“O seu Nelson, muito atencioso, veio aqui com mais duas moças e um pedreiro e disse que iria alugar uma casa para gente enquanto ele consertava a cozinha. Mas não precisa ser engenheiro nem especialista para saber que o problema não está apenas na cozinha, mas sim na casa toda. Não preciso falar nada, basta olhar a situação, que você vai pensar como eu. Então não aceitamos. Arruma hoje a cozinha e amanhã cai a sala? E se essa laje cai na minha cabeça ou na cabeça do meu filho o que vamos fazer? Não queremos briga, queremos apenas os nossos direitos”, disse.
A questão então foi parar nas mãos de um advogado. A família até contratou um engenheiro, mesmo sem ter condições, para atestar que a casa estava condenada. O profissional emitiu um laudo técnico que foi juntado a um processo na 1ª Vara Cível de Fernandópolis.
Enquanto o advogado tomava as providências legais, a família, sem condições de se mudar, permaneceu na casa. Foi então que a Defesa Civil de Fernandópolis foi acionada diante do risco iminente da casa para os seus moradores e para as casas vizinhas.
O coordenador da Defesa Civil de Fernandópolis, Flávio Copp e o engenheiro Weligton Rodrigo Braz, após vistoria, interditaram o imóvel e determinaram que a família saísse do local, o mais rápido possível, bem como desligasse as redes de água e energia.
Sem condições para pagar um aluguel, já que a renda familiar não ultrapassa R$ 2 mil, enquanto as parcelas do financiamento são de R$ 650, a única saída foi permanecer no imóvel, mesmo interditado, e desativar a rede de água na cozinha, o que trouxe mais transtornos.
Para cozinhar e lavar louças, foi necessário improvisar uma mangueira no encanamento do banheiro. Essa mangueira passa pelo vitrô do banheiro e entra pela janela da cozinha onde fica pendurada no lugar da torneira. É preciso liga-la na torneira de onde seria a ducha higiênica e correr para a cozinha para lavar a louça, por exemplo. Quando o serviço é concluído, mais uma vez se faz necessário ir até o banheiro para desliga-la.
Porém, apesar de todo o trabalho para realizar uma tarefa simples, como lavar a louça, essa não foi à gota d’água.
“Meu filho tinha saído com a namorada e como me separei do meu esposo, estava sozinha em casa. Acordei umas 2h da manhã e fui tomar um copo de água. Quando abri a geladeira, o piso cedeu novamente e o gabinete do armário, que estava cheio de compras, tombou em cima de mim. Eu não conseguia forças para sair debaixo dele e o piso começou a me cortar. Com muito sufoco, consegui me arrastar para dentro do buraco e sair de baixo do armário. Por Deus que não sofri nada mais grave”, contou Eliana emocionada. 
DIREITOS 
Ao tomar conhecimento do caso, CIDADÃO procurou se inteirar dos direitos de Eliana que, mesmo com todos esses problemas, nunca deixou de pagar as prestações da casa e em dia. 
De acordo com o art. 618 do Código Civil, o construtor responde pela solidez e segurança da obra pelo prazo de cinco anos. Ou seja, os defeitos que vierem a surgir em qualquer imóvel durante esse o prazo devem ser reparados pelos construtores.
“Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”, diz o artigo.
Não obstante, o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor, aponta que é de responsabilidade do construtor de reparar os danos causados ao consumidor, no caso a Eliana. 
“O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos”, diz o artigo.
PROCON 
Diante dos direitos de Eliana, CIDADÃO entrou em contato com o Procon de Fernandópolis, sendo que o responsável pela unidade, Ernesto Camargo Freitas Neto, se comprometeu a ir até o imóvel para orientar Eliana a respeito das providências a serem tomadas. 
DEFESA CIVIL 
Também a convite de CIDADÃO, o coordenador da Defesa Civil de Fernandópolis, Flávio Copp e o engenheiro Weligton Rodrigo Braz retornaram a casa da família para uma nova avaliação. 
Os dois, novamente, interditaram o imóvel e a orientaram sobre o risco que ela está impondo à sua própria vida e da de seu filho. 
“Essa casa pode cair a qualquer momento, já era para a senhora ter deixado o imóvel há muito tempo é a vida da senhora e a do seu filho que está em jogo”, ponderou o engenheiro Weligton Braz após uma nova vistoria. 
Segundo o Flávio Copp, um novo auto de vistoria será lavrado. “Queremos ajuda-la e o primeiro passo é ela deixar o imóvel, o resto depois a gente vê o que faz, a primeira coisa que ela tem que fazer é sair desse risco”, completou. 
JUSTIÇA
O caso de Eliana foi encaminhado por nossa equipe de reportagem para um novo advogado, para que o processo volte a caminhar. O caso também foi encaminhado ao Ministério Público para que as providências necessárias sejam tomadas. 
OUTRO LADO 
Questionada, a advogada da família que vendeu a casa para Eliana, doutora Tatiane Silva Ravelli, informou que seus clientes têm total interesse de resolver a contenda e, inclusive, já teria tentado contato com Eliana e sua família, e eles não teriam os deixado entrar na casa para ver a situação. 
A advogada ainda informou que diante da negativa, os antigos proprietários do imóvel teriam enviado uma notificação para o casal, que teria sido recebida e assinada por Nilson, cientificando-os do interesse de resolver o problema desde que o imóvel passasse pela avaliação de um engenheiro para atestar as causas dos danos e as soluções. 
A referida notificação traz ainda a informação de que os antigos proprietários do imóvel teriam disponibilizado outra casa para o casal se estabelecer até que os danos na casa fossem consertados, porém os mesmos teriam se negado a deixar a casa e afirmado que entrariam com uma ação. 
Diante da situação, seus clientes  teriam ficado sem saber o que fazer, porém, agora, ao tomarem conhecimento do interesse de Eliana e sua família de resolver a questão, pretendem sentar com eles, aparar as arestas e concluir esse caso da melhor maneira possível e o mais rápido possível.