A Rádio Difusora e o jornal CIDADÃO entraram em 2016 com um projeto ousado de reestruturação. Para dar início a ela, um velho conhecido está de volta à equipe: Claudemir Cabreira, ou, Cabreirinha como é conhecido. Cabreira iniciou a vida no jornalismo em 1974 quando entrou no extinto Gazeta da Região como entregador de jornais e diagramador, na época em que o periódico ainda era impresso em linotipo. Sua paixão pela área foi crescendo e ele passou a escrever para o jornal, se tornando redator e repórter atuando nessa função até 1983, quando iniciou sua carreira no rádio por meio dos microfones da Difusora. Foram 22 anos dedicados ao jornalismo da emissora, que lhe proporcionaram grandes coberturas, sendo que algumas delas ele nos conta nesta entrevista com riqueza de detalhes. Em 2005, o jornalista decidiu ampliar os horizontes e aceitou o convite para comandar a assessoria de imprensa da FEF – Fundação Educacional de Fernandópolis -, onde alguns anos depois, se formou no curso de jornalismo se tornando, como ele diz, jornalista de fato e de direito. Depois disso, passou pela assessoria de imprensa da Prefeitura e pela redação do jornal Tá Na Mão, até que agora, quando convidado para conhecer o novo projeto da Difusora e do CIDADÃO, aceitou o convite para reintegrar a equipe.
Como é voltar para a Rádio Difusora depois de dez anos?
O convite para retornar ao rádio reavivou a memória de um período rico em minha vida. Foram 23 anos intensos. Eu cheguei à Rádio Difusora em 1983, nos estertores do regime militar. Estava começando no jornalismo impresso e, de repente, convidado para o rádio. Jamais havia pensado nisso, até porque achava não dispor de um ‘vozeirão’ a altura dos locutores da época. Com os professores Alencar Scandiuzi e Darci Araújo pude trilhar e vivenciar um período ímpar. Então, esse retorno à Rádio Difusora é como voltar ao ninho e reencontrar-se com uma parte da minha história.
O que fez nesse período?
Fui para a Fundação Educacional de Fernandópolis com a missão de gerenciar o projeto da Rádio Educativa que ainda transitava pelos caminhos burocráticos de Brasília. Enquanto isso, integrei a equipe de marketing e, mais tarde, a de comunicação da Instituição. Na Fundação, eu fiquei até o início de 2012. Tive uma rápida passagem pela Assessoria de Comunicação da Prefeitura no final do governo Vilar e outros dois anos assumi a editoria do jornal Tá Na Mão em parceria com meu irmão. Foi um período de novas conquistas, principalmente porque com o curso de jornalismo na FEF, pude realizar o sonho de ingressar na academia e completar a minha formação aos 50 anos, sendo então um jornalista de fato e de direito. E isso fez muita diferença na minha vida.
O jornalismo mudou nesse tempo?
A nossa geração está vivendo uma experiência indescritível. Toda essa modernidade bateu às nossas portas na década de 90. Até então, estávamos ainda lidando com o jornal no estilo “chumbão” como era conhecido. Avental e mãos sujas de tintas para compor as manchetes, juntando letra por letra, era uma realidade comparável às oficinas de automóveis. Quando o jornal saiu do “chumbão” para o offset, foi um salto gigantesco que nos levou à adaptação ao novo sistema. Junto, chegou o computador, que me obrigou a abandonar a velha e inseparável Olivetti Léxicon, companheira de longos anos. Naquela época, final da década de 90 e início dos anos 2000, o repórter era quase um trabalhador braçal. Não havia a facilidade de comunicação que temos hoje. Veja que o telefone automático chegou a Fernandópolis em 1978 e era acessível a poucas pessoas. Isso tudo exigia o repórter na rua, suando a camisa para buscar a notícia. As ferramentas imprescindíveis eram a caneta, o gravador, o bloco de anotações e a máquina fotográfica dos filmes que garantiam sempre muitas surpresas, já que a tão esperada imagem nem sempre se revelava. A chegada da Internet foi a segunda onda dessa revolução. Quando saí do rádio em 2010, o telefone celular ainda era um telefone celular. Hoje, o celular é tudo, inclusive telefone. Assim, podemos dizer, que saímos da idade da pedra para a idade das comunicações sem fronteiras. Antes, a Rádio era limitada ao alcance da sua potência na ponta da antena. Hoje, ela está conectada na rede, acessível em qualquer parte do mundo. Antes, os fernandopolenses que moravam fora recebiam às noticias da cidade pelos jornais enviados pelo correio que chegavam uma semana depois. Hoje, a notícia está na rede instantaneamente. Aquilo que se falava do mundo global, acabou virando uma aldeia local, ou seja, estamos conectados em tempo real, independente do local onde estamos no planeta. O global virou local. Viver esse antes e o agora, não tem preço.
Quais foram as principais coberturas que fez quando atuava no jornalismo da Difusora?
O desafio era dar a notícia com exclusividade, sempre. Lembro-me das coberturas das eleições, ao lado do Alencar e do Darci. A apuração dos votos na quadra da EELAS durava dias e noites seguidas. E nós estávamos ali, contando voto a voto, a marcha das apurações. Era uma cobertura extenuante, mas pura emoção. A população e os políticos não desgrudavam do rádio. O resultado variava ao longo da apuração. Contas e mais contas eram feitas na tentativa de projetar o resultado final. Para os candidatos a vereador, a agonia durava um pouco mais, porque havia necessidade de se fazer os cálculos do quociente eleitoral. Hoje ó resultado é de ‘supetão’. Lembro-me, também, das exóticas transmissões dos bailes de carnaval na Casa de Portugal, Tênis Clube, a famosa ‘Panela de Pressão’ e do carnaval de rua, tradições que se perderam. Sem contar entrevistas com nomes renomados da política como Fernando Henrique Cardoso, Lula, Mário Covas, José Serra e tantos outros.
Qual foi a melhor notícia que deu naqueles microfones?
Registramos pelos microfones da Rádio Difusora grandes notícias como a inauguração da ponte rodoferroviária sobre do Rio Paraná em 1998. Mas, a conquista do Fefecê em 1994 ficou marcada pela forma inusitada como ocorreu. Lembro-me de que o time começou o campeonato muito mal e nas primeiras rodadas andou pelas últimas colocações. A chegada do empresário Antônio Ribeiro ao comando do time com o campeonato em andamento, iniciou uma revolução inesquecível. Em um campeonato de pontos corridos, o time saiu das últimas colocações para conquistar o título na última rodada, contra o Capivariano em Porto Feliz. Porém, não bastava apenas golear o Capivariano (5x1). Era necessário ainda torcer para uma improvável combinação de resultados. O favorito ao título, o Velo Clube de Rio Claro, jogaria pelo empate em Santos contra o Jabaquara, uma barbada. E a Inter de Bebedouro, a segunda colocada jogaria em casa precisando uma vitória. Ao Fefecê, caberia vencer seu jogo, por goleada, torcer pela derrota do Velo Clube e, ainda, para que a Inter não vencesse seu jogo por diferença superior a dois gols. Estávamos transmitindo o jogo em Porto Feliz, com o Natanael Coelho e Ivan Gomes e acompanhávamos minuto a minuto os jogos de Velo e Inter pelas emissoras da cidade conectadas no Estúdio em Fernandópolis. Os minutos finais foram dramáticos. E o que era improvável ocorreu. Fefecê campeão...
E a pior?
A notícia da morte do prefeito Newton Camargo de Freitas em 29 de março de 2002 que completava um ano de governo. Recordo-me de que dias antes ele concedeu entrevista coletiva no gabinete do Paço Municipal para anunciar a cirurgia do coração que faria no Instituto do Coração em São Paulo. Dois dias antes da cirurgia, já internado no Incor, conseguimos entrevistá-lo e ele relatava os preparativos para a cirurgia marcada para quinta-feira, dia 28. Quando o dia 29, feriado da sexta-feira da Paixão amanheceu, a cidade era sacudida pela notícia de que às três horas da madrugada, o prefeito Camargo havia falecido. Houve uma mobilização geral da equipe para uma cobertura até então inédita. A transmissão, que entrou no ar às 7 horas da manhã, foi ininterrupta, incansável, registrando a repercussão entre a população, políticos, até a chegada do corpo no aeroporto, o translado no caminhão do Corpo de Bombeiros e o velório na Câmara. A cidade voltaria a viver essa triste notícia quatro anos depois com a morte do prefeito Rui Okuma, entretanto, neste período já estava na Fundação.
As formalidades e o tom sério que são passadas aos ouvintes durante o jornalístico não representam exatamente o que acontece nos estúdios quando os microfones estão desligados. Quais foram as melhores peripécias que já presenciou nos estúdios da Difusora?
Costumávamos dizer que o que acontecia nos intervalos, ficava nos intervalos. Na Difusora sempre tivemos uma equipe dona de um bom humor insuperável. Foram momentos marcantes convivendo com figuras como os saudosos Marcos Alberto e Alcides Corsini. Como esquecer também do compadre Delmo, Alaor Pereira, Márcio Costa, Adenir Alves, João Carlos, Wilson Borgato, Ivan Gomes, Natanael Coelho, Paulo Alves, Sônia Marques, Marli Terezinha e tantos outros... Olha, uma das tantas histórias dos intervalos que foi motivo de muitas gargalhadas ocorreu poucos dias depois dos atentados aos Estados Unidos. A cidade amanheceu coberta por uma densa neblina. Dos estúdios da Rádio Difusora no 9º andar do Edifício Atlantis, não se via nada. Estávamos tomando um café, quando um barulho de avião tomou conta do ambiente. Foi quando alguém falou: “Gente, esse avião está perdido nesta neblina e perto do prédio”. Pronto, foi suficiente para vir à mente a cena dos aviões se chocando contra os prédios nos Estados Unidos. Pensa em gente apavorada tentando sair do prédio... Quando se descobriu que o avião era apenas uma reprodução de uma gravação que vinha do estúdio, sobraram muitas risadas, para alívio geral.
Lembra-se de sua despedida da emissora?
Um chororô ao vivo. Na verdade eu fui surpreendido, porque o último dia de trabalho seria no sábado com a transmissão da procissão do Dia dos Motoristas. Estava no programa na sexta-feira, quando o estúdio foi ‘invadido’ por Alencar Scandiuzi, Darci Araújo e toda a equipe. A partir daí, as palavras foram encharcadas pelas lágrimas.
Você também atuará na redação de CIDADÃO. O que isso lhe representa?
É uma honra integrar a equipe do CIDADÃO a convite da diretora Glenda Scandiuzi. É mais um desafio na minha carreira. A vontade é renovada de retomar o projeto com seriedade, ética e respeito a todos.
O que mais lhe apetece, o jornalismo impresso ou radiofônico?
Eu nasci profissionalmente dentro de um jornal. Tinha 14 anos, em 1974, quando ingressei como entregador de jornal na Gazeta da Região. Fui sendo promovido e passei pela paginação (diagramação), impressão e logo me aventurei na redação, escrevendo a coluna de Esporte. E não parei mais, posso dizer que o jornal está no sangue. O rádio ocorreu de forma inesperada em 1983, foi mais uma contaminação adquirida no curso da vida, ambas incuráveis. O rádio é a adrenalina do momento, em que você está exposto às emoções dos acontecimentos. O jornal é mais razão, embora o ambiente de uma redação também seja de muita adrenalina, principalmente no fechamento, quando você tem que decidir a manchete ou está à espera do furo jornalístico. Estar nos dois, é um privilégio.