Status, fortuna, carrão, mansão... Para muitos, estes são os principais fatores para o ingresso na faculdade de medicina, a maioria, aliás, nascida em berço de ouro, de família de médicos ou de empresários bem sucedidos que veem na medicina uma oportunidade do filho alcançar independência financeira.
Porém, como supracitado, esta é a realidade de muitos, mas não de todos e o exemplo vivo disto atende pelo nome de Washington Henrique da Conceição, que pode ser encontrado todos os dias nas Unidades Básicas de Saúde de Fernandópolis ou de plantão na Santa Casa.
O jovem médico, de 26 anos, filho de um administrador de fazenda e de uma faxineira, escolheu a carreira com o real intuito de ajudar o próximo, tanto que abriu mão do luxo que sua profissão pode lhe proporcionar para se tornar padre, o que chegou a motivar algumas pessoas a lhe chamarem de louco.
“Talvez eu tenha deixado uma vida de médico, com algumas facilidades que essa profissão proporciona, mas o essencial levo onde for. Esse simplesmente não era meu projeto, não era a melhor forma de servir. Fico muito feliz de ver meus amigos da faculdade casando, construindo casa, viajando, Deus quer tudo isso para todos, feliz eles que conseguem de forma justa realizar seus desejos e necessidades. Só lembro-os que também somos chamados a caridade e partilha como forma de cuidar do próximo. Deus deseja o melhor para todos. Levo de aprendizado um povo valente, um povo que luta e não desiste, tem fé em Deus, tem fé na vida, um povo que reza e trabalha. Vendo a fé das pessoas vejo que uma vida é tão pouco para doar frente à tanto carinho e amor que recebemos”, rebate ele.
Washington nasceu em Fernandópolis no dia 1º de maio de 1989, por coincidência, ou não, Dia Internacional do trabalho. Ele é filho de Vera Lúcia Bichof e Valdemir Antônio da Conceição e tem uma irmã chamada Luana Carla da Conceição.
Devido ao trabalho de seu pai, que como já citado é administrador de fazenda, Dr. Washington morou em muitos lugares. Até os seis anos, residiu em Santana da Ponte Pensa, depois em Campo Grande-MS, em Pirajui-SP, e, por fim, aos 16 anos retornou para Fernandópolis, onde mora até hoje com seus avós maternos.
Dedicado, o jovem que se formou como destaque de sua turma, estudou sempre em escola pública, com exceção do colegial, período em que ganhou uma bolsa de estudos numa escola particular de Fernandópolis. “Esse foi um período de muito estudo, tinha uma rotina de 8 horas de estudo além das horas de aula na escola”, disse.
Em 2008, com muita luta, ingressou na faculdade de medicina em Fernandópolis. Para arcar com as mensalidades, seus pais tiveram que vender praticamente tudo que tinham e empenhar quase que na totalidade o que recebiam em seus trabalhos.
“Morar com meus avós nesse período foi algo fundamental, eles não me cobravam nada para morar com eles, desta forma tudo que era ganho era usado para minha formação. Em 2009 ganhei uma bolsa de estudos na faculdade, o que proporcionou concluir o curso. Durante a faculdade eu dava aulas para outros alunos que tinham mais dificuldade, com isso conseguia ter um dinheiro para gastos pessoais. Nunca faltou nada, sempre vi em tudo um toque de Deus providente”, contou Washington.
Já formado, iniciou em sua cidade natal a carreira profissional com a qual sempre sonhou, como médico de PSF na Prefeitura Fernandópolis e como médico plantonista na Santa Casa de Misericórdia.
“Assim que recebemos a determinação de romper o contrato com a Ideais, realizamos um processo seletivo e ele passou. O contratamos e ele acabou sendo designado para a UBS da Cohab Antonio Brandini, onde descobrimos o excelente profissional que ele é. Sempre foi muito parceiro e solicito atendendo a todos os chamados dentro e fora do seu horário de trabalho. Além disso, nunca tivemos uma única reclamação dele vinda de pacientes ou mesmo dos funcionários das unidades em que trabalhou. Muito pelo contrário, temos reclamações quando temos que transferi-lo de uma unidade para outra, pois os pacientes não querem que ele os deixem”, afirmou a secretária de Saúde Lígia Barreto.
VOCAÇÃO
Não obstante, o amor pela profissão acabou se chocando com sua vocação e Washington optou pela segunda, se tornando seminarista na Diocese de Jales e servindo as comunidades católicas do núcleo III de Fernandópolis, composta pelos bairros São Bernardo, Bernardo Pessuto, Cohab Cris, Santo Antonio, Lajeado, Coqueiro, Jardim Planalto, Palma Minineli e Corinto.
“Minha mãe diz que desde criança queria ser padre, oscilando entre ser padre e médico. Aos 15 anos tive um desejo muito grande de entrar no seminário, mas era jovem e não consegui discernir muito bem o que estava sentido naquele momento. Sentimento que voltei a sentir no ano de 2010 de uma forma tão intensa que não consegui resistir, buscando então, ajuda de padres que me auxiliaram no processo de discernimento e aqui estou hoje como seminarista, um jovem feliz”, contou.
Sua escolha acabou gerando conflitos familiares no começo, afinal, seus pais tinham outros sonhos para ele. Porém, tudo acabou se ajeitando quando entenderam a verdadeira vocação de seu filho.
“Os pais sempre têm seus sonhos, os meus também tiveram os deles, de me ver casado, com filhos, uma casa própria e tantos outros sonhos. A notícia do seminário foi algo novo para eles, mas já sabiam que isso um dia aconteceria. Quando fui falar com eles pela primeira vez foi um momento de muitos conflitos, mas vejo isso como um cuidado deles. Hoje me apoiam e ajudam muito, vejo felicidade neles e até mesmo um pouco de orgulho por estar no seminário. Os pais sonham que seus filhos sejam felizes, só demoram um pouco a entender que nossa felicidade está no cumprimento da nossa vocação e não em seus sonhos. Estou muito feliz e realizado”, completou.
PRÓXIMOS PASSOS
Para vestir a batina, o seminarista não terá de abandonar o jaleco e o estetoscópio. Ele será o primeiro padre médico de Fernandópolis e garante que jamais abandonará a medicina, assim como nunca pensou em deixar a vocação.
“Não existe acaso na vida do ser humano, tudo segue um propósito que é a vontade de Deus. Penso então que ser médico responde a um propósito que nem eu sei bem qual é, mas com certeza responde a um projeto de Deus em minha vida. Se ele chamou um jovem médico a ser padre deve ser porque ele precisa de um padre médico, desta forma penso que nunca deixarei de exercer a medicina. O papa Bento XVI certa vez em sua visita ao Brasil disse que Deus nunca nos tira nada, ele apenas acrescenta, por isso não devemos ter medo de entregar tudo que somos e temos a Deus, não teria melhores mãos a confiar”, concluiu.