A crise na visão de um economista fernandopolense

20 de Agosto de 2025

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A crise na visão de um economista fernandopolense

Que o Brasil está passando por uma de suas piores crises econômicas, poucos discordam e que ela já chegou a Fernandópolis, a maioria já percebeu. Agora como encarar essa crise e superá-la da melhor forma possível, apenas um economista de experiência, como Jair Carlos Pires de Moraes, pode explicar. Jair, mestre em economia industrial é um dos mais renomados economistas da região e é sócio da JD Moraes Gerenciamento, que presta serviços à dezenas de empresas do estado de São Paulo e de vários outros estados. De acordo com ele, a crise de fato existe e já atingiu Fernandópolis com muita força.

A crise econômica já chegou a Fernandópolis? Aliás, de fato há uma crise?

Vamos começar pela segunda parte da questão, que questiona a existência ou não de uma crise mundial. Repassando um pouco a recente historia econômica brasileira, no final do governo Dilma, a economia já demonstrava sinais de cansaço em termos de resultados, no caso o PIB - Produto Interno Bruto -, e principalmente, a inflação, que apresentava sintomas de ressurgimento.

Além dessas duas figuras econômicas (PIB e Inflação) outra variável econômica apresentava sérios sinais de desequilíbrio, mas que estava sendo acobertada pelas autoridades econômicas, diante dos interesses eleitorais do momento, tratava-se do déficit orçamentário primário, cujo desempenho já afundava o desempenho orçamentário do governo federal.

Em 2014, a inflação (IPCA) estava em 6,4%. Em 2015 foi para 13,5%. O déficit orçamentário chegava a 6,4% (s/PIB) em 2014 e agora está em 6,8% (s/PIB). O PIB  teve um crescimento de 0,1%, em 2015 caiu 1,2%. A taxa de Câmbio era de 1,90 no ano passado, hoje é de 3,50. O desemprego era de 6,8% hoje é de 10,5%. A taxa Selic/ano foi de 6,5% e hoje é de 15%. Note que não precisa ser um grande economista para observar que, certamente, o Brasil, tem instalada uma grave crise em sua economia. Então, a resposta a sua pergunta é que sim, existe uma crise e por sinal, muito grave, na nossa economia.

Pode-se afirmar, com base em dados das empresas, através de consultas e pesquisas por amostragem do PIB do setor Serviço/Comércio de Fernandópolis, que não existem mais dúvidas com relação à crise em nossa cidade: ela já chegou e com impactos negativos significativos.

A queda média de venda em torno de 20% a 25%, detectada nos últimos dois meses, mesmo que se desconte um possível efeito no setor comércio, da massa de recursos financeiros utilizada na Exposição Agropecuária da cidade, ocorrida em maio último, representa um evento significativo e que merece mais atenção das lideranças políticas e empresariais da nossa cidade.

Outra sinalização importante observada é o crescimento acentuado da inadimplência da carteira de recebíveis dessas empresas, que nos últimos 90 dias vem crescendo a uma taxa média de 8% a 9% ao mês, o que acaba exigindo dos setores de cobrança, das empresas, um grande empenho para manter as entradas do fluxo de caixa.

Acontece que tais eventos, seja a inadimplência e/ou a perda das receitas, vêm crescendo também em outras cidades da nossa região, assim também como na região metropolitana de São Paulo, não de maneiras idênticas, pois cada empresa, cada local e cada mercado, têm suas peculiaridades próprias, mas que confirma uma forte tendência.

Dessa maneira, pode-se afirmar que no contexto local, a crise também se faz sentir e que Fernandópolis não é exceção, está confirmado: a crise chegou sim a nossa cidade.

Aumento na conta de luz, gasolina e agora até de água. Como nós de Fernandópolis podemos nos organizar, tendo em vista que enquanto as contas aumentam, os rendimentos continuam o mesmo?

Tudo isso que você falou é verdade, agora vamos ter que enfrentar o “dragão” da inflação, no nosso dia a dia e não será nada fácil. E é exatamente nos produtos e serviços controlados pelo Governo, que vem a “pancada”, especificamente, em forma de tarifações e repasses exorbitantes, de aumento represados.

Nós, cidadãos, não temos como escapar desse efeito de distribuição da pobreza à sociedade. Hoje, fala-se em inflação anual em torno de 6% a 7%, mas até o governo repassar todo o estoque de aumentos escondidos e represados, ela pode chegar a 12% ou 13 % ao ano. Mas existe outra grande ameaça, que é a combinação da inflação crescente, com o não crescimento econômico, ou seja, poderemos chegar, rapidamente, à recessão econômica.

Quando uma economia chega a esse ponto é prenúncio do fim de tudo, é a desorganização geral da economia.  A população não tem emprego e quem tem, perde todos os dias seu poder de compra. Pode ser o fim dos tempos, em relação à estabilidade econômica. Olha o que provoca um governo que assumiu o poder político e que, por sede de se manter nele, através de um populismo irresponsável, consegue desequilibrar toda a estrutura e a imagem da nossa economia, aos olhos da comunidade internacional, e ainda, ressuscitar a inflação, que o Plano Real havia eliminado.

A sociedade deve se organizar no sentido de economizar o consumo desses itens, e isso pode ser feito através de uso alternativo da energia hidrelétrica, por energia solar e outras iniciativas redirecionadas. No caso do combustível é possível economizar através de uma mudança de costumes (transportes coletivos) e fundamentalmente, por uma melhor logística no uso da frota da família (caronas) ou ainda através de aplicativos de mobilidade urbana.

Quais são os principais vilões da inflação no Brasil? E em Fernandópolis?

Hoje, o principal vilão da inflação no Brasil é a péssima gestão dos responsáveis pela condução das políticas econômicas. No aspecto de preços, você sabe que as altas nos preços dos combustíveis contaminam todos os demais, seja pelo fator gregoriano (por expectativa) e principalmente, pelo preço do transporte, que aumenta para repassar o custo do combustível.

De maneira similar, a energia também desempenha esse mesmo papel de espalhar a inflação para todos os “cantos da economia”, porque para se produzir qualquer produto e ou serviço, é necessário o uso da energia elétrica. Também, o fator climático, como a seca que aconteceu, recentemente, restringe o uso da água na produção de bens e serviços, que acaba derrubando a curva de produção e aí é um prato cheio, para a elevação dos preços dos produtos e mercadorias.

Fernandópolis tem o seu PIB estimado em R$ 1,4 bilhão/ano, e é composto em sua maior parcela, como algo em torno de 66%, dos setores de serviços e comércio, então, de maneira macro a inflação dos serviços/comércio é a que mais atinge os cidadãos de nossa cidade.

Já que a maior parte desses serviços é consumida localmente. Estamos falando, inclusive, da inflação dos serviços mais básicos que dilacera a renda dos cidadãos, desde os gastos de manutenção de veículos, serviços de salão de beleza, tarifas escolares e serviços médicos, toda essa gama de serviços teve uma disparada de preços, bem acima de reposição salarial média, estimada em torno de 8%.

Mas o vilão dos vilões, responsável pela inflação da economia de Fernandópolis foi a disparada da taxa cambial, que vem embutida nos aumentos de preços das matérias primas usadas para os produtos manufaturados e principalmente nos remédios, o que cria um universo de inflação muito abrangente, causando impactos de perda de renda em todos os cidadãos fernandopolenses.

O senhor presta serviços a dezenas de empresas de Fernandópolis e região e até de outros estados, eles sentiram a crise? Como eles devem agir para superá-la?

Temos observado quedas acentuadas das receitas das empresas, sobretudo no último mês de maio, onde foram verificados reduções nos movimentos entre 20% a 25%. Queda dessa magnitude provoca prejuízo representativo nos balanços das empresas, o que significa a perda de capital de giro, e que em muitos casos, existe o efeito combinado da queda de receitas com aumento de custo de capital, para a empresa manter suas operações.

Diante da elevação taxas de juros, cobrada pelos bancos para emprestar dinheiro novo, as empresas que se encontram expostas às flutuações do custo do dinheiro, poderão enfrentar crises de insolvência financeira, dentro de poucos meses, e é isso que os responsáveis pela presente crise não estão sabendo avaliar a dimensão e as consequências dos seus atos na economia e no mercado.

É interessante que quase ninguém está se mobilizando diante desse cenário. Nota-se um grande silêncio entre nossos lideranças empresariais e nem mesmo nossas tradicionais associações empenhadas na melhoria e bem estar da cidade, estão se mobilizando, parece que preferimos o silêncio do que da fato, agir, ao invés da busca de união para criar defesas aos nossos negócios. A história contemporânea das nações, já nos mostrou que os governos quando se tornam loucos pelo poder político, levam as populações à guerra, a catálise social, a convulsão sócio-econômica, ou seja, ao fim da civilização culturalizada.

Para o empresário, que nesse momento luta para manter no mercado, o seu negócio, tentando manter o emprego dos seus colaboradores, recomendamos, minimamente, que adotem todas as estratégias focadas, nesse momento, na obtenção do montante de vendas que corresponda pelo menos ao ponto de equilíbrio das suas operações, e também um cuidado especial com o controle da inadimplência, da sua carteira de recebíveis.

Não tenha medo de conceder descontos, pois mesmo que sua empresa venha ter prejuízos de 5% a 6% sobre as vendas, é melhor do que pagar juros em operações de curto prazo, ao mercado financeiro. Uma importante dica para quem está pagando juros: compare o eventual lucro atual da sua empresa com o valor das despesas financeiras geradas nessa operação. Se os juros forem maiores do que o lucro gerado, sua empresa está num processo de descapitalização, ou seja, ela esta transferindo capital para as instituições financeiras. É hora de fazer um projeto de recuperação financeira e reestruturar seus negócios.

Por que há tanta diferença de preço entre um estabelecimento e outro na cidade?

Num regime de concorrência quase perfeita, onde há vários ofertantes no mercado, é normal existirem as diferenças de preços entre os seus pares. Essa diferença num estado de economia equilibrada, as variações e ou diferenças estariam num limite entre 10% a 20%, no entanto, em cenários de crise como a que estamos vivendo, outras variáveis entram no jogo do mercado.

Imagine as empresas que estão com dificuldades de caixa e ou liquidez, neste momento, ela irá dar maiores descontos para os preços dos seus produtos e serviços, visando gerar caixa. Outras razões também podem justificar essas diferenças de preços: o porte das empresas, as maiores podem comprar volumes maiores e ter descontos melhores, repassando esse benefício ao consumidor final, a margem de lucro arbitrada pelo empresário, também pode contribuir com essas diferenças, é bom o consumidor saber que para cada 1% de margem de lucro, o preço necessita ser aumentado em 2%; essa é a relação margem de lucro versus preço de venda. E por último, pode ser que o preço esteja errado, existem locais que mais da metade dos empreendedores não domina a técnica de precificação dos seus produtos e serviços.