Em busca de uma Santa Casa ideal

20 de Agosto de 2025

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Em busca de uma Santa Casa ideal

No início da semana Geraldo Silva de Carvalho, o “Doutor Geraldo”, como é conhecido, reassumiu o compromisso de prover a Santa Casa de Fernandópolis por mais dois anos. Mesmo em meio à crise financeira, culminando em ameaças de greve, salários de médicos atrasados e todas as demais dificuldades advindas da entidade, ele não desistiu do projeto que iniciou ao lado de sua diretoria. Um desafio que, se é gigantesco para qualquer pessoa em qualquer época da vida, em teoria deveria ser ainda maior para um homem de 79 anos. Ledo engano. “Doutor Geraldo” tem reservas físicas e espirituais insondáveis, que ele usa com parcimônia, sempre na hora adequada. Mesmo diante de toda a dificuldade ele segue otimista. Confira:

Diante da atual situação financeira, com atraso de pagamentos e  ameaças de greve, muitos “correriam” da responsabilidade de assumir a provedoria da Santa Casa nesse momento, tanto que o senhor foi o único a colocar o nome à disposição na última eleição. Por que decidiu disputar a provedoria novamente?

A saúde foi uma área que sempre me atraiu. Tenho formação em exatas, sou engenheiro, nada a ver com saúde, mas sempre tive interesse, acompanhei enfermos. Quando eu era solteiro em São Paulo, tinha o hábito de visitar os hospitais, pensei até em montar uma clínica psiquiátrica certa vez. Enfim, a saúde sempre foi uma área que me interessou. Infelizmente, por conta de meus compromissos de trabalho, não pude aceitar o convite para assumir a provedoria da Santa Casa anteriormente. Mas entrando na área da provedoria assim que assumi, iniciamos um movimento grande juntando as Santas Casas Votuporanga e de Jales. Por fim, conseguimos juntar 70 Santas Casas de São Paulo e até de outros estados, o que nos inteirou dos problemas de todas as Santas Casas. Percebemos que o problema da nossa não é diferente das demais do Brasil. É o contexto geral dos hospitais filantrópicos porque eles dependem do SUS. A clientela atendida é 70 % do SUS. Se o SUS tem tabelas realmente defasadas como estão e a nossa briga toda é por causa disso, para que essas tabelas sejam atualizadas e até então não tivemos uma resposta definida, mas existem algumas promessas e estamos vivendo em função de promessas.

O que o SUS repassa para a Santa Casa por paciente internado?

Depende de cada procedimento. Para se ter uma ideia, as vezes as pessoas vão lá só para passar uma sonda de alívio. Por esse procedimento o SUS repassa R$ 3. Eles não contabilizam que para tal procedimento são utilizadas luvas, profissionais como médicos e enfermeiros, energia elétrica, enfim, tudo gera um custo para aquela operação e isso não é contabilizado pelo SUS, o que torna os valores repassados irrisórios.

Quais são os novos projetos e desafios de seus próximos anos frente à entidade?

Nós estamos com muitos projetos em andamento e foi isso que me deu entusiasmo para continuar. Nós iniciamos algumas coisas que considero de suma importância, como por exemplo, a certificação do Hospital de Ensino, que está sendo implantado mais seriamente esse ano. Os alunos já frequentavam o hospital há tempos, porém, os benefícios que isso traz para a nossa Santa Casa estão sendo iniciados agora.  A primeira parcela nós já recebemos, pouco mais de R$ 60 mil, que é o beneficio oriundo do fato de ser Hospital De Ensino. Iniciamos também um trabalho de proteção contra incêndio, que era um setor que realmente estava precário e que merecia toda a nossa atenção, pois depois que acontece, não adianta chorar o leite derramado. Conseguimos a outorga dos poços também, além de uma série de mudanças relacionadas ao Hospital de Ensino. Conseguimos conciliar os nossos interesses com os da prefeitura e das faculdades, mesclando alguns elementos na nova diretoria. 

Até que ponto a volta do Pronto Atendimento da Unimed é benéfica para a Santa Casa?

Quando assumi a gestão da Santa Casa, pelo fato das unidades básicas de saúde estarem em desacerto, reformando, sem médicos, o acesso de pacientes ao Pronto Socorro era muito grande para as questões de pronto atendimento e não de emergência e urgência o que acabou acumulando muita gente, pois os convênios eram atendidos juntos no mesmo local. Então fizemos um acordo com a Unimed, de eles prepararem uma área que nós tínhamos para o atendimento dos convênios lá. Fizemos um contrato e foi tudo bem começado, porém, quando começamos a introduzir todos os convênios nessa área já não houve mais um consenso e o Dr. Jarbas resolveu levar o pronto atendimento da Unimed para a sede deles. Era algo meio precário, pois qualquer complicação teria que ser encaminhado para Santa Casa, internações também. Agora com todos os últimos acontecimentos, eles propuseram retornar o pronto atendimento para a Santa Casa e nós aceitamos.  

O mês de janeiro e fevereiro pode-se dizer que foram os meses de maior tensão dos últimos anos no hospital. Como o senhor e sua equipe conseguiram controlar a situação?

Nós tínhamos uma programação muito boa para o fim de ano, pois estávamos em vias de realizar um grande financiamento com verbas do BNDES através do “Desenvolve São Paulo”, nós até pagamos uma empresa para fazer o projeto, fomos uma das primeiras Santas Casas a entrar com esse pedido, tudo fornecido de acordo com o solicitado. Com esse projeto nós iríamos refinanciar os financiamentos bancários que temos e pagar os fornecedores atrasados, o que nos daria um alívio grande porque a parcela a pagar seria bem menor, o que reforçaria nosso caixa. Fora isso nós também iríamos ter o IAC que vem em função do hospital e que proporciona um valor até razoável por mês, retroativo a agosto e isso era para sair praticamente na casa dos R$ 600 mil. Havia também um pedido para o governador e também ao secretário da Saúde uma verba para que pudéssemos acertar o 13º e a folha de dezembro. Nada disso deu certo. Todas as nossas perspectivas furaram. Nosso financiamento foi indeferido, não sei o motivo, pois não houve justificativa, já que tudo que precisava ser fornecido foi fornecido a tempo e hora. No entanto, foi indeferido, o que gerou para nós uma catástrofe. Isso fez com que nós não conseguíssemos pagar tudo da forma que queríamos: o pagamento atrasou, o 13º ficou atrasado, movimentou sindicato, cogitou-se até greve e vem desencadeando essa crise. Da parte dos médicos, realmente eles tem sido de um comportamento excepcional. Não houve reclamações, alguns justificaram suas necessidades pessoais, pois dependiam apenas da Santa Casa, mas a maioria atende em clínica particular, postos de saúde, cidades da região. Eles possuem outros recursos e isso corroborou para que tivessem muita paciência e estão tendo até agora na espera desses pagamentos. Estamos contornando com paciência, conversando, negociando com sindicatos e conseguimos pagar os atrasados dos funcionários. 

Os salários e outros encargos (13°, férias, vale alimentação) dos médicos e funcionários então já foram regularizados?

Para os funcionários sim. O dos médicos está atrasado. Hoje (quarta-feira, 26) estamos pagando parte do atendimento de plantão do mês de dezembro. Não estamos pagando tudo porque na realidade essa verba que foi repassada pela prefeitura, no valor de R$ 100 mil, que nós tínhamos programado para fazer o pagamento dos médicos, fomos informados que isso não é possível, pois são iguais as demais verbas destinadas por parlamentares, que servem apenas para custeio. Nós estamos com dinheiro em caixa, mas não podemos utilizar um tostão dessa verba para outra finalidade que não seja custeio, inclusive esses R$ 100 mil da Prefeitura. Diante disso, estamos remediando com uma parcela que recebemos ontem (terça) da Unimed para pagar esses plantões de dezembro dos médicos. Estamos morrendo de sede na praia.

Há uma previsão de data para o pagamento dos plantões dos médicos?

Na medida em que for entrando o dinheiro que pode seu utilizado para essa finalidade, a prioridade é pagá-los, mas infelizmente nós ainda não temos uma expectativa, porque se promete uma coisa e no final aquilo se prorroga, atrasa, estica, o que era para vir em dezembro só sai em fevereiro. Dessa forma ficamos de mãos e pés atados. 

Atualmente quanto a Santa Casa de Fernandópolis deve aos médicos?

R$ 1,3 milhão. Só para médicos em termos de tudo: procedimentos particulares, SUS, plantão à distância, plantão in loco, tudo dá mais ou menos esse valor, de dezembro para cá.

Quem estava em débito com a Santa Casa (convênios, SUS, repasses, etc) já regularizou os pagamentos?

Normalmente os convênios pequenos são imediatos no pagamento e  não dão problema. Na Unimed nós estamos com um problema, pois tínhamos umas dívidas anteriores que estão complicadas agora para receber em função da mudança. Outra empresa assumiu e até que isso se normalize, acredito que esse pagamento demore para sair, mas eles estão tentando pagar o que é mais atual. Geralmente realizamos o procedimento e recebemos após 45 ou 60 dias.

Em sua opinião, de onde os médicos e demais colaboradores encontram ânimo para continuar trabalhando mesmo não sabendo ao certo quando receberão seus salários?

Entendemos que alguns médicos possuem uma dependência exclusiva da Santa Casa e quando atrasamos é complicado, pois desestabiliza a vida financeira deles. Esses nós temos procurado acertar o mais rápido possível a situação. Os demais que atendem em suas clínicas particulares, em outros hospitais ou unidades de saúde geralmente possuem algum recurso, estão conseguindo se manter  e sabem que nossa intenção é sanar tudo quando houver possibilidade.

A Santa Casa já perdeu muitos profissionais por conta disso?

Poucos. Mas alguns saíram sim, por propostas melhores. Não só por questões financeiras, mas por propostas de trabalho mesmo. Às vezes os médicos pensam entrar em uma área de trabalho mais específica e acabaram optando por outra vaga.

O senhor, como administrador que é, pode nos dizer qual é a saída para essa bola de neve que a cada dia só cresce entorno de nossa Santa Casa?

Como esse é um problema coletivo das Santas Casas, nós temos a impressão que essa força dos hospitais filantrópicos vai se manter crescendo e alguma hora terá que surgir uma resposta. Sozinhos, se formos reivindicar alguma coisa, não teremos força para nada. Isso tem que ser um trabalho coletivo.

Já foi feito um planejamento para isso?  Há a possibilidade de um dia a Santa Casa de Fernandópolis operar no “azul”?

As expectativas para esse ano, por se tratar de um ano eleitoreiro, ano de Copa, ano de muitos movimentos, tem um lado negativo, pois se investiu muito dinheiro na Copa  e esse dinheiro tem que sair de algum lugar. É um dinheiro que vai faltar para alguns. Mas nós entendemos também que esse movimento é um momento de receber muita gente de fora e isso gera um entusiasmo o que nos leva a acreditar que será um ano muito promissor. Pode ser que isso reflita no ano vindouro por que quando se extrapola muito em um ano, no outro falta. Mas há as promessas de toda essa questão do Hospital de Ensino, que está sendo normalizada agora. Estamos vendo também as prefeituras se organizando melhor após a fase mais crítica do início de mandatos. Diante disso, acredito que nós teremos um período mais salutar para a nossa Santa Casa. Não vamos dizer que vai resolver todo o problema, mas pode até ser que se houver um movimento coletivo das Santas Casas realmente pode ser que consigamos resolver o problema sim.

Como anda o projeto do Hospital de Ensino?A Santa Casa já recebeu aumento nos aportes financeiros por conta do credenciamento?

Já. Nós já recebemos uma verba de R$ 63 mil em função disso, independente daquilo que já recebemos da Unicastelo que é em função dos alunos que fazem estágio lá, dos residentes e também dos alunos da FEF. Da FEF nós fazemos uma permuta. Eles nos fornecem alguns funcionários e algumas bolsas de estudo para os funcionários da Santa Casa e isso ajuda a dar uma normalizada.

A Santa casa já está funcionando como Hospital de Ensino?

Sim. Na verdade sempre funcionou. Agora, a certificação do ano passado está se efetivando mais este ano. Muita coisa que ficou para ser instalada, que é exigência do Hospital de Ensino, como a biblioteca, até hoje não conseguimos instalá-la, mas ontem (terça) nós tivemos uma reunião da comissão gestora e já estamos providenciando isso. Não só a biblioteca, como uma série de outras coisas que são necessárias para que a Santa Casa se integre realmente como Hospital de Ensino.