O eterno bom combate em favor das crianças

20 de Agosto de 2025

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O eterno bom combate em favor das crianças

 Suzete Angélica Ferrarezi Izaías, a Suzi, presidente da Associação Assistencial Nosso Lar de Fernandópolis, teve uma agradável surpresa esta semana: a atitude dos jogadores do Fefecê, que decidiram comprar cestas básicas para a instituição com o dinheiro da “caixinha” dos atletas (veja reportagem nesta edição). Gestos como esse dão alento à presidente e às companheiras de diretoria, que há 17 anos viabilizam o funcionamento de uma instituição tão importante quanto de delicado controle. Sempre disposta a ir à luta pelas crianças, Suzi nunca deixa de frisar que, se aqueles meninos e meninas estão ali, é porque “algo muito grave aconteceu no seu núcleo familiar”. Para as crianças, a Nosso Lar é um porto seguro e, muitas vezes, a única tábua de salvação. Como o santo guerreiro bíblico, Suzi e companheiras combatem o bom combate. 

CIDADÃO: Como você avalia a atitude dos jogadores do Fernandópolis Futebol Clube, que vieram ao “Nosso Lar” doar 17 cestas básicas compradas com o dinheiro da “caixinha” dos atletas?

SUZI: Foi uma iniciativa maravilhosa. Se todos fizessem assim, certamente a gente teria menos dificuldades para gerir a casa e continuar nosso trabalho. Foi muito bom, e não apenas pelos alimentos que eles trouxeram, mas também e principalmente por virem se socializar com as crianças. Você acompanhou a visita e viu que foi muito bom, e todo mundo gostou. Uma atitude muito legal essa dos atletas, de interagirem com as crianças.

CIDADÃO: Sempre que visitamos o Orfanato, notamos a interação dos visitantes com as crianças. As pessoas ficam emocionadas. Será que é só vindo aqui que se pode ter uma noção exata da dimensão do trabalho desta instituição?

SUZI: É isso mesmo. Tendo contato com as crianças, os visitantes verão a realidade com outros olhos. Nós percebemos, muitas vezes, a curiosidade das pessoas que passam por aqui para saber como é o funcionamento desta casa. A partir do momento em que nós contamos qual é a função e por que essas crianças estão aqui, muda totalmente o sentido da coisa. As crianças não estão aqui por acaso, e não são crianças maldosas, ao contrário. Eles estão numa casa acolhedora porque necessitam desse lugar. A partir do momento em que as pessoas nos visitam e conseguem entender a função da casa, a noção muda completamente. A emoção toma conta, as crianças pedem carinho. E, na verdade, é disso que eles mais precisam – atenção, cuidados, carinho. É o que nós tentamos passar para todos eles.

CIDADÃO: Nunca é demais lembrar a origem desta instituição. Como, quando e por que a Associação Nosso Lar de Fernandópolis começou a funcionar?

SUZI: A Nosso Lar começou há 17 anos. Eu sou mãe adotiva de dois filhos, e pensando nas crianças que também poderiam ter uma família, não consegui me conter e tentei, buscando outras mães adotivas que eu conhecia na época, montar uma casa acolhedora para a gente fazer alguma coisa pelas outras crianças que precisassem de acolhimento, com mais carinho e atenção. Montamos, então, a Nosso Lar, que era gerida por um grupo grande de pessoas - mães e voluntárias. Com o tempo, a casa foi crescendo, foram chegando mais crianças, até que chegou ao estágio em que estamos hoje: nós atendemos aproximadamente 25 crianças em média – não existe um tempo de permanência pré-determinado pelo Judiciário, que é quem encaminha as crianças, através do Conselho Tutelar. Creio que valeu a pena. Estamos aqui, fazendo nosso trabalho, contando com a colaboração de muitas daquelas pessoas que há 17 anos montaram esta casa junto comigo. Elas continuam no trabalho, lutando para que possamos dar cada vez mais, a melhor qualidade de vida para as crianças que aqui se encontram e que precisam do nosso acolhimento.

CIDADÃO: O processo de adoção – enfim, o seu mecanismo – continua com os velhos defeitos ou as coisas mudaram?    

SUZI: As coisas mudaram bastante. Há uma nova legislação em vigor que, acredito, está mudando bastante o panorama de adoção. Há muitas novidades e as pessoas estão encarando com mais cuidado esse tempo de acolhimento nas casas acolhedoras. A nova legislação exige que se façam audiências concentradas de seis em seis meses, avaliando caso a caso e tentando uma solução para eles. Estudam-se as possibilidades de colocar essas crianças na chamada “família extensa”, revendo de fato cada caso e avaliando se não há um jeito certo da criança voltar para o convívio da família de origem. Se isso não for possível, que seja feita logo a destituição do pátrio poder – com muito cuidado, muita cautela, tudo isso evidentemente é feito através do Poder Judiciário – e passar essas crianças para o processo de adoção. O que é inconcebível é que essas crianças fiquem “envelhecendo” numa casa acolhedora! Todos nós sabemos que, no Brasil, é bem mais difícil a adoção tardia. As pessoas costumam fazer esse tipo de adoção no exterior. Aqui, porém, é mais difícil de acontecer. Então, quando se verifica que não há possibilidade de determinada criança voltar para a família de origem, que ela, então, seja logo passada para outra família, substituta daquela, e que possa fazer as vezes de uma família normal para ela.

CIDADÃO: Recentemente, a reportagem de CIDADÃO assistiu a seis dessas audiências concentradas, e sentimos a dramaticidade da situação. Percebemos, também, que a ação das pessoas e instituições envolvidas – Vara da Infância e Juventude, Ministério Público, Conselho Tutelar, equipe de suporte técnico do Judiciário, CREAS e a própria Nosso Lar – é um tanto rígida quando se trata do desabrigamento dos menores, ou seja, de sua devolução à família. Por que essa filosofia é adotada?

SUZI: Porque nós verificamos in loco tudo o que está acontecendo com a criança e com sua família. Nossa casa acolhedora também tem um trabalho técnico, através da assistente social, da psicóloga, que vai direto ao foco, ao núcleo familiar. Na verdade, fazemos uma tentativa de aproximar os vínculos familiares. Nosso objetivo não é exatamente que a criança vá para o processo de adoção, mas que se resolva o seu caso. Então, queremos que a criança, quando é devolvida à família, esteja com seu problema solucionado, ou pelo menos amenizado. Queremos que ela volte sem sofrimento. É uma grande responsabilidade, a nossa. Então, como estamos muito próximos da situação, e já desenvolvemos muita experiência, sabemos que muitas vezes os problemas são camuflados na frente do juiz, e não podemos deixar que isso aconteça. Nosso papel é defender a criança. Às vezes, se ela volta para casa, passa a ser novamente maltratada. Sabemos desse risco e nossa opinião conta pontos nas audiências, embora quem decide, de fato, é o juiz. Nossa experiência sobre a vida da criança é colocada na mesa para que pese na decisão do juiz. Talvez por isso, você nos tenha considerado muito incisivos ali, naquele momento. Mas veja: deixar essa criança voltar a ser maltratada seria um trauma repetido. Se não temos certeza de que o risco está extirpado, certamente opinaremos pela manutenção do abrigamento. Não é trancar as portas, é defender os interesses da criança. Até porque, após a audiência nosso trabalho continua, visitando as famílias, orientando, analisando a evolução social.

CIDADÃO: Quem quiser tomar uma atitude parecida com a dos atletas do Fefecê deve fazer o quê?

SUZI: Vir nos visitar. É preciso agendar antes, porque precisamos saber qual é o objetivo da visita. Temos responsabilidades perante o Judiciário. Mas as portas não estão fechadas. Ao contrário, queremos o apoio da sociedade. Nosso telefone é 3442-5959, no horário comercial.