Ela até iria cursar Direito, mas acabou optando pelo Jornalismo. Durante o curso na FEF, o prazer de escrever que Andresa Carolina Lopes de Oliveira sempre manifestou, desde a infância, associou-se à curiosidade por temas que fascinam os profissionais da imprensa. Na época de definir o tema do Trabalho de Conclusão de Curso, Andresa optou pela questão da adolescência infratora, mazela social que ganha contornos assustadores a cada dia que passa. Aos 21 anos, nascida em Fernandópolis, filha de Margareth e Paulo, irmã de Anderson, Andresa, que cursou o ensino fundamental na Escola Coronel Francisco Arnaldo Da Silva e o ensino médio na Escola Joaquim Antônio Pereira, vai colar grau no próximo dia 29. E começa a carreira já na condição de escritora com livro publicado: seu TCC virou a obra “Opostos de um Semelhante – relatos de três adolescentes infratores”, um mergulho nos subterrâneos da geração sem causa que vaga pelas ruas de Fernandópolis. Um trabalho surpreendentemente maduro para alguémtão jovem – na condição de leitor do livro, chegamos a nos esquecer de que Andresa temapenas alguns anos mais que seus personagens.
CIDADÃO: Por que você se tornou uma pessoa voltada para as letras? Isso começou na infância?
ANDRESA: Sempre gostei de escrever. Quando menina, eu gostava de escrever historinhas, fazia uma espécie de livrinho, dobrando o papel, fazendo a capa e escrevendo. Fazia o livro dobrado com folha sulfite, capa, desenho e tudo o mais. Eu brincava com isso. Mas a verdade é que eu gostava mesmo de escrever, uma das minhas primeiras redações foi selecionada num projeto desenvolvido pela escola Coronel. Não foi a vencedora, mas ficou entre as classificadas. Enfim, sempre tive mais afinidade com essa área do que com matemática, ciências exatas.
CIDADÃO: Essa aptidão foi estimulada na escola por algum professor?
ANDRESA: Isso aconteceu mais na faculdade, onde recebi alguns elogios pelo meu texto. Mas alguns professores, no ensino médio, me diziam que eu escrevia bem.
CIDADÃO: Por que você escolheu o curso de Jornalismo?
ANDRESA: A princípio, eu iria fazer faculdade de Direito. Porém, foi justamente o gosto pela escrita que me “empurrou” para o jornalismo, principalmente o jornalismo impresso. Isso não significa que eu tenha algo contra TV, rádio ou outras mídias, mas acho o jornalismo impresso fascinante. A diagramação, a feitura enfim do jornal, tudo isso me despertava muita curiosidade. E tem a minha relação com o texto. Prestei o vestibular, consegui passar e agora já estou concluindo o curso. Interessante que o tema da redação, no vestibular, foi maioridade penal. Lembro que se discutia muito o caso do Champinha (N.R.: apelido de um menor infrator que em 2003, na região do Embu-SP, torturou e matou um casal de jovens, Liana Friedenbach e Felipe Caffé; o caso reacendeu o debate sobre a maioridade penal no Brasil). Agora, saindo da faculdade, voltei à questão do menor infrator, com esse trabalho “Opostos de um Semelhante”.
CIDADÃO: O que foi exatamente que a levou a pesquisar essa questão? Teria algo a ver com o trabalho do Dr. Evandro Pelarin à frente da Vara da Infância e Juventude?
ANDRESA: Eu sabia o tipo de coisa que queria abordar no TCC, só não tinha ainda um tema. Aí, o orientador me disse: “Vamos verificar na mídia como os assuntos são tratados”. Cheguei a pensar em algum tema ligado ao jornalismo cultural, mas desisti. Quando estava desenvolvendo o projeto do TCC, teve o caso do assalto das meninas da Vila Mariana. Aí, vi que a mídia tinha uma abordagem um pouco “defeituosa” do assunto. Então, levei o tema de adolescentes infratores para o meu orientador. Ele achou interessante e a gente seguiu em frente. Fiquei receosa de não ter capacidade e experiência suficientes para fazer isso, mas ele me deu total apoio e hoje o resultado aí está.
CIDADÃO: Quem são Rafaela, Pedro e Danilo?
ANDRESA: São três adolescentes da cidade de Fernandópolis. São nomes fictícios, claro. Trata-se de uma menina de 13 anos, envolvida no tráfico de drogas; um menino de 15 anos, na mesma situação; e outro, de uma classe social um pouco mais elevada, que praticou um ato de desrespeito a uma professora.
CIDADÃO: De que maneira você se aproximou desses jovens?
ANDRESA: Foi através das assistentes sociaisdas instituições socioeducativas. Levei à coordenação do curso um ofício explicando o caráter da pesquisa. Recebi total apoio da coordenadora. Foi feita uma triagem e a Rafaela, na ONG Comunidade das Famílias São Pedro, se dispôs a ser entrevistada. A mãe dela também. Fui até a casa delas. Eu tinha certa preocupação de ir aos bairros, mostrar onde esses jovens viviam, como era o meio social.
CIDADÃO: Os órgãos oficiais responsáveis pelo bem-estar social colaboraram com a pesquisa ou você encontrou portas fechadas?
ANDRESA: Tive muitas barreiras burocráticas. Não de todas as instituições, de algumas. Também notei que não houve um esforço de algumas instituições no sentido de ajudar a convencer as mães para que eu pudesse entrevistar os filhos. Mas é bom ressalvar que algumas instituições me ajudaram muito. A COFASP me abriu as portas, me ajudou em tudo o que precisei. Também o juiz da Vara da Infância e Juventude, Dr. Pelarin, me ajudou muito.
CIDADÃO: O que você acha das medidas que o Dr. Evandro Pelarin adota em relação aos menores?
ANDRESA: Não sou especialista na área, mas em primeiro lugar considero injustas as afirmações de alguns, de que ele seria midiático. Ao contrário, penso que ele não quer aparecer. Quanto à cobrança que ele faz, de responsabilidade dos pais e atitude dos jovens, acho que ele está certo. Durante a elaboração do meu trabalho, senti que o principal fator determinante da ida ou não do adolescente para a criminalidade é a família. As carências sociais e financeiras podem aviltar a personalidade ou o seu desenvolvimento, mas a verdade é que a família é fundamental. A Rafaela, por exemplo, não ouve a mãe. Ela pensa que já sabe tudo e que não precisa da mãe. Pude perceber que sua família tem sido um pouco omissa.
CIDADÃO: Existe uma crise de autoridade paterna na sociedade brasileira?
ANDRESA: Acredito que essa autoridade está reduzida. Durante minha pesquisa, constatei que geralmente os adolescentes não estão escutando pai e mãe.
CIDADÃO: Quais foram as suas principais conclusões ao encerrar esse trabalho?
ANDRESA: Concluí que essa problemática do menor – drogas, abandono, falta de orientação – não terá uma solução tão cedo. Tem coisas que estão enraizadas desde o período escravocrata na sociedade brasileira. Vai depender de uma série de coisas – desde as políticas sociais em todos os níveis – federal, estadual e municipal – passando pelos pais, que terão que se conscientizar da necessidade de dedicar mais atenção aos filhos, e da própria sociedade. A verdade que jovem infrator normalmente é alguém que teve direitos violados, como o direito a ser respeitado pela família, o direito à educação, à alimentação, à moradia, enfim, os direitos constitucionais de que todo cidadão goza. A sociedade precisa exigir o cumprimento desses direitos. Não pretendo dizer que esses jovens sejam santos, mas a verdade é que, via de regra, ele não recebe aquilo que o Estatuto da Criança e do Adolescente lhe garante: cuidados da família, da sociedade e do Estado.