O juiz Evandro Pelarin responde pela 302ª Zona Eleitoral, que corresponde aos municípios da Comarca de Fernandópolis (a 150ª Zona, que é a sede da Comarca, tem como juiz Vinicius Castrequini Buffulin). Entre tantos temas ligados ao processo eleitoral, elegemos a Lei da Ficha Limpa como o assunto a ser debatido com o magistrado, já que o dispositivo legal vigerá pela primeira vez no processo eleitoral brasileiro. Experiente no exercício da função de juiz eleitoral, Pelarin garantiu que todas as denúncias serão apuradas. “Vamos fazer um arroz com feijão bem feito”, diz. O juiz recomenda aos candidatos, cabos eleitorais e militantes partidários que fiscalizem a campanha e as eleições e que levem as informações ao juiz eleitoral. Pessoalmente, Pelarin entende que as brechas na legislação causam instabilidade no sistema. “É preciso ter segurança jurídica”, argumenta.
CIDADÃO: Em 2010, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a Lei da Ficha Limpa valeria para as eleições de 2012. O político com sentença condenatória prolatada por órgão colegiado e transitada em julgado pode ser candidato?
PELARIN: Não, não pode ser candidato. Inclusive uma das discussões que havia naquele tempo era sobre a retroatividade ou não. Nesse caso, o candidato, condenado, ainda que não haja trânsito em julgado, mas condenado por determinados crimes por um colegiado, não pode ser candidato.
CIDADÃO: No encontro promovido recentemente em Rio Preto pela AMA (Associação dos Municípios da Araraquarense), o advogado do CEPAM informou que, no momento do registro, o próprio computador do cartório negará o registro, porque lá estará registrada a sentença condenatória. Nesse caso, o candidato inconformado poderá fazer o quê?
PELARIN: Primeiro, é preciso levar em conta que isso poderá não acontecer, por uma questão prática, burocrática do sistema. Por exemplo: suponhamos que um indivíduo foi condenado por um tribunal, que deverá fazer a comunicação dessa condenação. Chegou ao cartório no final de junho, digamos. Caso o cartório não expeça a certidão de forma a chegar a tempo ao cartório eleitoral, o sistema deste não terá a informação de que o candidato foi condenado. Então, nem sempre o próprio sistema barrará o registro de um candidato condenado. Por isso, existe no processo eleitoral um princípio fundamental do qual não podemos nos descuidar que é o princípio da fiscalização. Partido fiscaliza partido. Candidato fiscaliza candidato. Se o concorrente souber que aquele candidato sofreu uma condenação, e constatar que a Justiça Eleitoral aceitou o registro, ele deverá impugnar a candidatura e apresentar a certidão eleitoral. A Justiça Eleitoral tem um sistema próprio, mas que não é infalível. É preciso haver a fiscalização dos outros candidatos, do Ministério Público e assim por diante.
CIDADÃO: Na hipótese dessa sentença estar registrada, qual deve ser a atitude do cartorário? Ele deve negar o registro?
PELARIN: Sim. Se já constar o trânsito em julgado, e o candidato requerer o registro apresentando os documentos necessários, o cartorário levará o caso à apreciação do juiz. Este, constatando que não há condições de efetivar o registro, assim procederá. Aí, o candidato terá direito a recorrer ao tribunal.
CIDADÃO: Caso o candidato consiga uma liminar pela manutenção do registro, mesmo em caráter precário, ele poderá disputar e ganhar a eleição, ser diplomado e tomar posse?
PELARIN: São coisas do sistema. Sua previsão é possível, sim. Se o candidato for condenado pelos crimes previstos na Lei da Ficha Limpa ou por improbidade administrativa, ou tiver conta rejeitada em campanha eleitoral ou no exercício de atividade legislativa, mesmo assim a lei prevê a possibilidade de os tribunais darem efeito suspensivo àquela decisão anterior e ele poder ser candidato. Então, a própria Lei da Ficha Limpa – que é uma lei excelente, moralizadora – também tem uma válvula de escape prevista. Então, a verticalização do direito brasileiro também acontece no sistema eleitoral – e muito. Quem conseguir chegar a Brasília com recurso pode ocasionalmente conseguir registrar uma candidatura mesmo estando dentro da Lei da Ficha Limpa.
CIDADÃO: Isso não impede que, no julgamento do mérito, o indivíduo seja cassado, não é?
PELARIN: Vou dar uma opinião muito pessoal: isso cria uma instabilidade muito grande no sistema. Acho que nós precisamos ter uma legislação o mais segura possível, a bem da segurança jurídica e até para que o eleitor saiba que está votando num candidato que poderá eventualmente ser impugnado no curso do seu mandato pelo cometimento de algum ilícito, etc., mas não por uma questão anterior à sua votação. Isso cria uma instabilidade. Imagine a campanha de um candidato que tenha algum problema na Justiça Eleitoral. Como fica essa campanha? Acho que precisamos ter segurança e estabilidade jurídica.
CIDADÃO: Com relação à 302ª Seção Eleitoral: como o Sr. pretende conduzir o processo eleitoral? A Justiça vai ser tolerante ou mão-pesada?
PELARIN: No direito eleitoral, o juiz tem uma liberdade maior de atuação, inclusive sem esperar provocação de partidos ou do Ministério Público. O juiz tem a possibilidade de agir de ofício. Eu, que tenho certa experiência de Justiça Eleitoral, sempre aguardo uma definição. Uma vez definidos os candidatos, pouco antes de começar a propaganda eleitoral costumo fazer uma reunião – nada de ameaças, juiz não trabalha sob o estigma de ameaças aos outros, não ameaçamos ninguém. Os candidatos são bem assessorados, não desconfiamos da inteligência alheia, todo mundo tem advogado e sabe o que pode e o que não pode. A única coisa que nós vamos fazer na 302ª é um “arroz com feijão” bem feito. Ninguém vai inventar a roda. Nossos eleitores da 302ª podem esperar o seguinte: o juiz eleitoral vai atuar. E quando dizemos que vamos atuar, é em todos os âmbitos do processo eleitoral. Na minha carreira – não que isso seja troféu ou motivo de regozijo - já tive que cassar alguns prefeitos. Algumas decisões o tribunal manteve, outras ele reformou, isso faz parte da Justiça. Mas é bom que se diga, e direi isso nas reuniões: na 302ª, todas as denúncias serão investigadas. Esse é o principal ponto, que, aliás, está na lei. Nós temos que cumprir a lei.