Já contei aqui, sabe-se lá quando, alguns “causos” da famosa viagem de estreia em pescarias do grande corintiano Carlinhos da Lisboa, que já foi Carlinhos Paspa e agora é Carlinhos Murruga.
Apesar de corintiano, o Carlinhos é uma pessoa sofisticadíssima, do ponto de vista intelectual: formado em arquitetura, conhece a fundo a obra de Le Corbusier, leu todos os clássicos e é poliglota.
Outra característica: Carlinhos é um ser do asfalto e da lâmpada incandescente. Jamais havia pisado matas e serrados. Mosquito da dengue, só conhecia de ver a gravura nas campanhas institucionais. São Paulo, para ele, não é o “limite da tolerância”, e sim um amplo leque de possibilidades existenciais.
Nosso herói nega esse rótulo de urbanóide e a falta de conhecimento da vida selvagem, argumentando com o fato de ter frequentado a boate Savage, a churrascaria Pantanal e o Jungle Bar, nos tempos da paulicéia desvairada.
Convencido a acompanhar seu grupo de amigos numa pescaria – que ele logo chamou de “safári” -, Carlinhos armou-se de uma bagagem “essencial”: fitas de jazz e uma edição de Quo Vadis no original.
Na varanda da pousada, ele lia e ouvia música, enquanto os companheiros pescadores se dedicavam a “dar sangue aos borrachudos”, no dizer do arquiteto.
Na viagem de retorno, o grupo foi parado pela fiscalização ambiental. Os agentes queriam ver os peixes, as licenças, o diabo. Carlinhos subiu num caixote e deitou discurso sobre o processo de redemocratização do país, que custou centenas de vidas, “redemocratização esta que, agora, é maculada por essa atitude discricionária dos nobres fiscais do ecossistema”.
O chefe dos policiais ouviu pacientemente a peroração de Carlinhos e respondeu: “Está bem, estão liberados”. Em seguida, apontou para o Tonhão França, o mais baixinho da turma: “Só que este aqui fica. Tá fora de medida...”