Pelo fato de ter se exorbitado de sua função, a razão ocidental perdeu o seu lugar em relação a um conjunto maior e não consegue se posicionar no tocante a ecologia- o mundo- a situação das injustiças e a exclusão das minorias, a organização da sociedade e a visão de Deus, a transcendência. O ser humano pelo que foi elencado encontra-se em estado de desamparo. Ajuda a compreender essa situação o direcionamento para as drogas, terrorismos revolucionários e anárquicos, violência e sexo sem compromisso, as experiências-limites. Esse estado de desamparo mergulhou a pessoa no que há de mais obscuro e tenebroso no humano, desencadeando a afirmação da irracionalidade, a supressão da capacidade de escolha, a decisão entre a razão e a irracionalidade bruta.
Fazer uma defesa vibrante do passado ou a atitude pessimista de nada adiantam. Existe a necessidade de tomada de consciência que a afirmação de um só ponto de vista e o exclusivismo da razão científica – com a sua especialização, acumulando dados – desemboca num conhecimento fracionado, sem saber o para quê. A expressão racional e funcional é um dos aspectos do ser humano, sendo a ciência uma das formas da percepção da realidade. Esses dois pontos – racionalidade funcional e ciência como uma forma de captação da realidade – são duas limitações que devem ser levadas em conta, se não o conhecimento científico tem a tendência a se desenvolver a partir do seu próprio ponto de vista, sem vinculação com a realidade, com o mundo e com a vida, desvinculado da questão do sentido, dos fins, das perguntas últimas. “A sabedoria é sempre ciência, mas nem toda ciência é sabia”(Jesus Palácio, SJ).
A nossa época está testemunhando uma ebulição religiosa. Nota-se também a presença do ateísmo e da indiferença religiosa convivendo com diversas formas de buscas contraditórias do divino e do sagrado. O mundo singular, extravagante dessa religiosidade se dá em razão do ocultamento de Deus, um problema que ficou mal equacionado pela razão moderna. A razão moderna trilhou o caminho do encontro do “homem natural”, que prescindindo do “homem teológico”, esqueceu-se da transcendência e negando abertamente ou veladamente a existência de Deus, chega ao antropocentrismo radical, a exacerbada afirmação do homem. A modernidade possui em seu cerne a lógica da razão secular, o ser humano é confinado no horizonte da história e do mundo.
A sociedade moderna se organiza em todos os níveis de acordo com parâmetros próprios, sem nenhuma referência à religião ou a transcendência, provocando o deslocamento social da religião, o que nunca tinha sido visto na história da humanidade. O fenômeno da secularização é reconhecido a olho nu, é dominante, mas não determinante ou absoluto como se poderia supor. A demonstração mais evidente é a chamada “volta ao sagrado” ou a “revanche de Deus”. Anárquica, nada convencional, heterogênea e, no mais das vezes selvagem, é a volta do fenômeno religioso que entra pela porta dos fundos. O drama de nosso tempo segundo o Papa Paulo VI, de venerável memória, é que a fé cristã deixou de ser a matriz da cultura moderna.
A evolução religiosa do mundo ocidental é que está na berlinda, especificamente na sua matriz cristã. Pensam alguns estudiosos que está surgindo uma nova fase da história religiosa da humanidade. As formas tradicionais das grandes religiões, com seu peso institucional, cedem espaço para outras formas de vivência religiosa mais identificada com a cultura da modernidade. O ateísmo moderno e a indiferença religiosa encontram sua explicação nas causas culturais e históricas e pelos condicionamentos decorrentes dessas duas realidades. Num primeiro momento pode-se afirmar que a sociedade moderna resolveu o problema de Deus expulsando-O do seu horizonte cultural com a desistência da prática religiosa e a marginalização social da religião, apesar de continuar vivendo a relação com Deus, buscando por outras vias, outros caminhos.