Aliando paixões e profissões

20 de Agosto de 2025

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Aliando paixões e profissões
Gabriela Telles Fraga Iplinsky é natural de São Paulo. Humberto Bellintani Iplinsky nasceu em Catanduva. Ambos são engenheiros agrônomos – ela formada pela Unesp de Ilha Solteira, ele pela Esalq de Piracicaba. Pais de um casal de adolescentes – Carolina, de 13 anos, e Humberto Filho, de 10 – eles vivem há uma década em Fernandópolis, e se adaptaram muito bem, a ponto de se sentirem “filhos da terra”. Além de produzirem frutas, Gabriela e Humberto administram a Estação das Flores, que cuida de paisagismo e decoração de jardins. Mesmo na entrevista o casal mostrou muita afinação, como o leitor testemunhará abaixo.
CIDADÃO: Como vocês se conheceram?
GABRIELA: Eu tinha 13 anos, estava indo para a 8ª série, e o Humberto tinha 18 e cursava a faculdade em Londrina. Depois, ele deixou a escola porque sua aspiração era a USP. Fez cursinho e entrou em Piracicaba. Foi um relacionamento de uma vida. Nós morávamos em Catanduva.
CIDADÃO: Você foi influenciada por ele na escolha da carreira?
GABRIELA: Acredito que sim. Eu já gostava, meu pai trabalhava com fazenda, só que eu queria veterinária. No fim, acabei fazendo agronomia. Quando ele se formou eu entrei na faculdade.
CIDADÃO: Vocês fizeram o mesmo curso e têm uma inclinação para o “verde”. Pelo visto, a questão ecológica é fundamental para a família, não é?
GABRIELA: Sem dúvida, isso é muito importante.
HUMBERTO: Na área agronômica, eu trabalhei muito tempo com cana. E ela trabalhava com fruticultura. Morávamos em Rio Verde, Goiás. A Gabriela achava estranho que eu trabalhasse o ano todo com uma coisa que no fim seria queimada.
GABRIELA: Para mim, a coisa mais bonita é a florada. Quando dá uma florada de laranja, por exemplo, eu tenho a garantia do próximo ano. Esse ciclo – as flores, depois os frutos – é fascinante. O Humberto não acompanhava esse processo, éramos agrônomos de áreas muito diferentes. No fim, ele se aproximou da minha “praia”, e hoje não queima mais nada (risos). Hoje ele também está nas flores.
HUMBERTO: A partir disso, nós passamos a trabalhar só com fruticultura – laranja, manga, mamão. Tudo aqui em Fernandópolis. Trabalhamos com uma linha entre o orgânico e o sustentável. Técnicas convencionais, porém com um manejo mais natural, mais orgânico. Nunca tivemos uma fruticultura 100% orgânica. Em larga escala, isso é complicado e o mercado não está preparado para pagar o preço disso – principalmente no interior. Quando escolhemos morar em Fernandópolis – temos uma propriedade em Pedranópolis – não conhecíamos a cidade. Passeamos por aqui e gostamos. Estamos aqui desde 2001. Somos os únicos membros das nossas famílias que moravam fora de Catanduva. As crianças já viraram fernandopolenses, e até nós falamos isso.
CIDADÃO: Como surgiu a Estação das Flores e que tipo de serviços ela oferece?
HUMBERTO: A Gabriela sempre gostou de jardins, de lidar com plantas em casa. Tirava os meus fins de semana de sossego (risos). Sou um marido solidário. Bem, quando resolvemos construir nossa casa, havia outros amigos também construindo. Todo mundo tirava opiniões com a Gabriela sobre paisagismo e aí começaram a dizer que ela deveria trabalhar com aquilo. Daí surgiu a semente da Estação das Flores, que a princípio deveria ser só dela.
CIDADÃO: Hoje, o que a Estação oferece?
GABRIELA: Projetos paisagísticos, enfeites, plantas. Foi na condição de consumidora que eu desenvolvi as maneiras de suprir a loja com produtos que satisfizessem os clientes. Assim, temos muitas plantas, que é uma grande preocupação nossa. Trabalhamos com fornecedores muito bons. Oferecemos auxílio técnico. Quando entramos num jardim que já possua algumas plantas, a ideia não é tirar tudo e botar tudo novo. Cuidamos de plantas doentes, conservamos o solo.
HUMBERTO: Na verdade, somos médicos de plantas. Todo trabalho do agrônomo tem como fim último a planta. Isso cria um diferencial à medida que conseguimos levar tecnologia agronômica aos jardins, às atividades paisagísticas que fazemos. Não pensamos só no lado estético, mas também no lado sustentável. A prevenção com fatores climáticos, erosões e outros tem que fazer parte das preocupações do paisagista.
CIDADÃO: Num clima quente como o da nossa região, que tipo de vegetação obtém melhor resultado?
GABRIELA: Esse é um desafio que me instiga bastante. Nós trazemos as variedades normalmente de Campinas, e muitas são ornamentais do exterior. Chegando aqui, algumas não se adaptam. Tenho em casa várias espécies diferentes, com as quais faço experimentos. Diria que as folhagens se dão muito bem por aqui, acho que a melhor pedida são os jardins tropicais. Elas gostam muito de água e de sol. As flores anuais sentem demais o nosso clima. Flores que ficariam bonitas o ano todo em um lugar de temperatura mais amena, por aqui a gente só consegue manter essa beleza por uns quatro meses. Aí entram o replantio e outras técnicas. No verão, a temperatura do solo da região chega a 40º. A planta sente isso, evidentemente.
HUMBERTO: Quando pensamos em montar alguma coisa ligada ao paisagismo, a Gabriela disse: “Vou me preparar para isso”. Ela ficou mais de um ano fazendo cursos, estudando plantas. No fim, eu fui a reboque, virei um aluno ouvinte (risos). Hoje, ela faz a parte técnica, de projetos, e eu administro a parte de campo, de implantação de jardins – enfim, eu carrego os vasos (risos). Quando estávamos estudando, percebemos que havia uma ideia massificada, quase uma ideia única sobre o que é paisagismo. Pensa-se que é botar um gramadinho, um coqueirinho, e o resultado é uma espécie de “jardim clonado” – todos acabam muito parecidos. Tamanhos diferentes, mas sempre com o mesmo conceito. Nosso professor foi importante nesse processo. A Gabriela tinha o objetivo de fazer jardins com sensações, com cores, com movimentos, sons – enfim, jardins com vida, e que mudem a cada dia. Em uma época do ano, têm cores de uma cor, em outra eles têm outras cores. Tudo isso integrado ao modo de vida e ao gosto de cada pessoa. Tem gente que não quer flor, e tem gente que quer o beija-flor! Ora, quem quer beija-flor, borboleta, não pode ter um jardim todo verdinho, estático.
GABRIELA: Acho que o importante é que o cliente tenha a oportunidade de ter algo diferente disso, porque sempre que assim acontece, o fato mexe com a pessoa. Ela passa a tomar o café da manhã lá no fundo de casa, para ver o bem-te-vi que veio beber água na piscina, as flores que se abriram – em síntese, a redescoberta do que é ter um jardim. Hoje em dia está na moda ter árvores frutíferas no jardim. Quer coisa melhor do que fazer um suco com acerolas colhidas no seu jardim?
HUMBERTO: Outro aspecto a se considerar é a oportunidade de dar aos filhos pequenos, além da chance de tomar esse suco, a chance de presenciar o milagre da vida, como o nascimento de um passarinho. A criança, primeiro, vê os ovos no ninho, depois um dia escuta o piar do pássaro. É fascinante vivenciar isso na primeira infância.
CIDADÃO: O que vocês pensam a respeito do avanço da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo, em termos ambientais?
HUMBERTO: Existem muitos mitos a respeito da cultura da cana – que empobrece o solo, que é monocultura, etc. Só que todas as culturas em larga escala – milho, soja, algodão – têm os mesmos defeitos. Veja, se o Estado de São Paulo tem vocação para ser produtor de energia – muito mais do que outros Estados – eu não vejo problema no fato dele ser um grande produtor de bio-energia (álcool, açúcar, energia a partir da biomassa). Temos três vocações por aqui: pecuária, fruticultura e cana. Nós não conseguimos competir com o centro-oeste em produção de grãos, por fatores climáticos, tamanho de área, etc. Então, vai-se produzir em São Paulo aquilo que der mais renda para o produtor, o que representará mais lucro para os municípios. Ora, a pecuária já mostrou que não compete com a fruticultura e com a cana, em termos de rentabilidade. Pode ter certeza de que onde houver uma fruticultura bem organizada, com laranja, uva, limão e outros produtos, a cana não entra. Ela entra onde as outras atividades agrícolas não trazem renda para o produtor. Não está havendo uma conspiração para se transformar o Estado num imenso canavial: a realidade é que ela, a cana, gera para o produtor, seja arrendando sua terra, seja produzindo, mais renda do que ele obteria com outras culturas.