Alessandra e Renata debatem as efemérides de 24 de janeiro

20 de Agosto de 2025

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Alessandra e Renata debatem as efemérides de 24 de janeiro
No calendário de datas comemorativas do Brasil, o dia 24 de janeiro é especial: há uma série de celebrações nessa data, coincidentemente ligadas diretamente ao Direito. Por isso, CIDADÃO convidou as advogadas Alessandra Gimene Molina, supervisora do Núcleo de Prática Jurídica da Unicastelo, e sua colega Renata Miquelete Chanes Scatena para debater esses temas. Ambas nasceram em Fernandópolis e se formaram pela Unitoledo de Araçatuba. Trabalham juntas e têm grande sintonia entre si. A seguir, o teor da conversa:
CIDADÃO: No dia 24 de janeiro se comemoram muitas efemérides – entre elas o Dia da Previdência Social, o Dia do Aposentado, o Dia da Instituição do Casamento Civil no Brasil e o Dia da Constituição. Por que essa data é, por exemplo, o Dia da Previdência Social?
ALESSANDRA: Isso se deu em razão da instituição da “Previdência para todos”, e não mais só para uma categoria específica. Então, foi criada a Lei Eloy Chaves, em 24 de janeiro de 1923, estabelecendo que todos os que fossem contratados fariam jus aos direitos previdenciários.
CIDADÃO: Nesses 88 anos, pode-se dizer hoje que o sistema previdenciário brasileiro é eficaz?
ALESSANDRA: Relativamente. Acho que dizer que é totalmente eficaz não é possível. Hoje na Previdência há muita cobrança. Infelizmente, por causa da má utilização de alguns, ela tem que agir com mais segurança e nem sempre acaba sendo justa com todos os que realmente necessitam.
CIDADÃO: Como você vê as constantes mudanças no número de anos exigidos de trabalho e recolhimento para a aposentadoria?
ALESSANDRA: Essa é uma questão mais de natureza político-econômica. Efetivamente, nossa população está envelhecendo e sua longevidade está aumentando. O brasileiro está vivendo mais. Por isso, se não forem feitos ajustes, é possível que no futuro a Previdência Social não consiga arcar com os benefícios. O déficit na Previdência já é grande.
CIDADÃO: Hoje, quais são as circunstâncias que podem levar à aposentadoria?
ALESSANDRA: Há a aposentadoria por idade – 60 anos, desde que tenha a contribuição necessária; a aposentadoria por invalidez; por tempo de contribuição, que é aquela em que ele contribuiu por 35 anos (homem) e 30 anos (mulher); é bom lembrar que as pessoas começaram a trabalhar cedo, antes dos 16 anos de idade, quando isso era permitido, e que hoje se aposentam antes dos 50 anos, sofrem o chamado “fator previdenciário”, o que reduz significativamente seu benefício, por força da longevidade detectada no Brasil. Assim, é melhor que ele continue a recolher por mais tempo, para assim receber aquilo com que realmente contribuiu. Há também o auxílio-doença, o auxílio-acidente, o salário maternidade e o salário família. Há mais um, no qual raramente se presta atenção, que é o auxílio-reclusão, pago a quem se encontra preso para manutenção de seus filhos. Está previsto na lei previdenciária. Finalmente, há a pensão por morte.
CIDADÃO: Como funciona a chamada previdência privada?
RENATA: É um contrato como outro qualquer, feito com um banco, e cada banco estipula os seus parâmetros do contrato. Você contribui durante determinado período e só vai poder sacar futuramente. Salvo engano, alguns bancos permitem o saque de uma única vez. Alguns economistas dizem que essa previdência é vantajosa, outros dizem que não. Então, não há um consenso de se é ou não um bom investimento.
CIDADÃO: Contrato bancário é sempre leonino (risos).
RENATA: Eu, particularmente, não acho um bom negócio.
CIDADÃO: Bem, no 24 de janeiro também se comemora o Dia da Instituição do Casamento Civil no Brasil. Quando foi instituído?
RENATA: Antigamente, quem celebrava os casamentos eram as autoridades religiosas. Em 24 de janeiro de 1890, o Marechal Deodoro da Fonseca promulgou o Decreto 181, que formalizou o casamento civil. Não havia tanto consenso em relação ao casamento religioso, porque havia os católicos e os não-católicos. A partir de 1890, o casamento passou a ser celebrado pelo juiz de Paz.
CIDADÃO: Pelo Código Civil antigo, o homem era o cabeça do casal. Hoje, os poderes são iguais, inclusive em relação ao exercício do pátrio poder. O que representa isso, do ponto de vista social?
RENATA: É sem dúvida uma evolução, mas acho que em alguns aspectos a mulher saiu prejudicada. Afinal, ela briga tanto por igualdade e acaba sendo sobrecarregada, porque assume o papel de profissional, de mãe, de esposa, enfim, tem tripla jornada de trabalho. Do ponto de vista jurídico, foi uma grande evolução. Veja, por exemplo, a questão da guarda dos filhos: hoje é mais rigorosa a avaliação através de estudo social e psicológico que se faz para avaliar quem tem a melhor condição para ficar com a guarda. A condição financeira é importante, mas não é preponderante. O maior avanço do novo Código Civil é a guarda compartilhada, porque deu maior importância à figura paterna. No Código Civil de 1916, via de regra a guarda ficava com a mãe. O Judiciário era protecionista.
CIDADÃO: Em alguns países, inclusive a Argentina, o casamento entre pessoas do mesmo sexo está sendo reconhecido. Vocês acham que a sociedade brasileira aceitaria lei nesse sentido?
RENATA: Acho difícil. Isso envolve muito a questão religiosa. Lá nos primórdios, Immanuel Kant usou a seguinte expressão: “O matrimônio é a união de duas pessoas de sexos diferentes, que entre si outorgam um direito recíproco sobre seus corpos para o resto da vida”. Acho que a questão religiosa pesa muito em relação ao reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo. É evidente que a sociedade está evoluindo, mas não será fácil implantar isso no Brasil.
CIDADÃO: Sendo impossível a reprodução entre homossexuais, não haveria um empecilho para alcançar a finalidade precípua do matrimônio, que é justamente a constituição da família?
ALESSANDRA: No Rio Grande do Sul, que é talvez o Estado brasileiro mais avançado em decisões dessa natureza – inclusive é de lá a Desembargadora Maria Berenice, uma grande e ousada jurista – há decisões a favor da regularização da relação homo-afetiva. Mesmo fora da questão do casamento, há decisões diferenciadas, como ocorreu recentemente na comarca de Estrela D’Oeste, onde o juiz autorizou um transexual a modificar o prenome.
CIDADÃO: Ainda em relação ao casamento, quais são os maiores dramas que aparecem no escritório?
RENATA: As coisas mais tristes são sempre em relação aos filhos. Quando há dissolução do casamento, eles são os mais prejudicados, em todos os sentidos: afetivo, psicológico, financeiro. A guarda compartilhada foi um grande avanço, mas ela só funciona quando a separação é amigável.
CIDADÃO: Esses dramas a acompanham no fim do dia? Você leva o problema do cliente para casa?
RENATA: Às vezes, sim. Já saí daqui com o coração apertado. Ainda mais sendo mãe (risos). A gente tenta fazer o melhor para o cliente, mas o coração fica sufocado. É nesse momento que entram em ação o promotor e o juiz. Este é quem vai decidir. Nós fazemos a nossa parte.
ALESSANDRA: A Renata é mãe de gêmeos, a Carolina e o Pedro. Eles têm um aninho. É por isso que ela consegue sentir na pele o drama das crianças filhas de pais que se separam.
CIDADÃO: O que é alienação parental?
RENATA: A Lei 12.318, de 2010, tem por objetivo proteger a criança e o adolescente. Ela estabelece que nenhum dos cônjuges poderá falar mal do outro, nem de sua família, na frente do filho. Isso alcança também avós, encarregados da guarda, etc. Esse ato de alienação parental prejudica o vínculo da criança ou do adolescente com a família do outro lado. A lei pune quem a transgredir com multa, e até com alteração da guarda.
CIDADÃO: Alessandra, se você tivesse que dar um rótulo à Constituição promulgada em 1988, qual seria ele?
ALESSANDRA: Humanitária. Ela é humanitária. Embora não se cumpra tudo que está escrito nela, disso não há dúvida.
CIDADÃO: A Constituição alcançou seus objetivos nesses 22 anos?
RENATA: Na parte dos princípios, sim. O Judiciário, principalmente, se atém aos princípios da isonomia, igualdade. Na questão ambiental, na forma é boa, mas na prática acho que ela acaba revelando alguns defeitos.
ALESSANDRA: Se bem que a questão ambiental é mundial, não dá para separar o Brasil do resto do planeta.
CIDADÃO: E quanto ao efeito psicossocial da Constituição, que acabou criando a figura do “politicamente correto”? Isso as incomoda de alguma forma, como, por exemplo, a proibição de fumar em lugares públicos?
ALESSANDRA: Como eu não fumo, isso não me atinge, mas a verdade é que a sociedade acaba cobrando. O espírito do “politicamente correto” vem mesmo da Constituição de 88. Veja essa questão do fumo, que na verdade é lei estadual: no Ceará, senti na pele e nas narinas a falta da lei paulista. O Serra pode não ter sido bem votado pelos fumantes, mas que fez uma lei boa, fez (risos).