No Ministério Público, Luiz Eduardo segue as lições do velho Jacob

20 de Agosto de 2025

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No Ministério Público, Luiz Eduardo segue as lições do velho Jacob
Para os irmãos, Luiz Eduardo Martins Jacob é o que mais lembra o pai, Fernando Jacob – não fisicamente, mas pelo humanismo e pela inegável modéstia. O discreto integrante do clã segue carreira no Ministério Público de Mato Grosso, onde ingressou em 1983. Na entrevista, concedida no dia da reinauguração da praça que leva o nome de seu pai, ele falou de Justiça, meio ambiente, família e memória afetiva.
CIDADÃO: Trinta e três anos de carreira na área do Direito, sendo 27 no Ministério Público do Mato Grosso. Que balanço você faz da sua vida na profissão?
LUIZ EDUARDO: Eu me formei em São José do Rio Preto, mas comecei aqui em Fernandópolis, como advogado, e aqui fiquei durante cinco anos. Depois disso fui para Mato Grosso e estou lá há 27 anos. Os meus irmãos me comparam muito com o meu pai e acho que foi isso que me levou para essa carreira. No Ministério Público, eu tive uma satisfação muito grande porque hoje consigo ver o resultado do meu trabalho de uma forma bem rápida, houve uma evolução muito grande. Com a Constituição de 1988, foram dadas ao Ministério Público muitas outras atribuições, porque antes da promulgação dessa Constituição o MP trabalhava muito na área criminal, enquanto na área cível ele trabalhava na defesa das crianças e dos familiares; depois da Constituição foi dada uma grande atribuição ao MP de defesa do meio ambiente, defesa do consumidor, e essa área vem evoluindo muito rapidamente – aí é que está a satisfação de atuar no Ministério Público, ter resultado em todas essas áreas. Agora a gente percebe que outras entidades também estão tomando a iniciativa em prol do consumidor, o meio ambiente, entre outros. E o melhor é que todo trabalho que for desenvolvido tem que estar em contato com a sociedade.
CIDADÃO: Você acha que o povo brasileiro evoluiu no sentido de compreender melhor a função do promotor e o que é o Ministério Público? Faça uma comparação da época em que você começou sua carreira no MP com o quadro atual.
LUIZ EDUARDO: Eu acho que sim. Antigamente o promotor trabalhava num gabinete dentro do Fórum, então a visão que o cidadão tinha era a de que ele era um auxiliar do judiciário ou um assessor do juiz, ninguém via o promotor como uma instituição independente. Hoje existem as promotorias separadas. Hoje um promotor chega e não vai para o gabinete dele trabalhar os processos, ele vai fazer audiência pública, ele vai levantar quais os problemas que atingem aquela sociedade e a partir daí ele vai estabelecer um plano de trabalho em cima das necessidades.
CIDADÃO: Há uma previsão legal hoje que não havia antigamente e que é uma coisa crucial: a questão ambiental. Como está a atuação do MP no Mato Grosso, estado tido como estratégico nesta questão de defesa do meio ambiente?
LUIZ EDUARDO: É difícil trabalhar sozinho (o Ministério Público) nessa área que é o meio ambiente, pois isso tem uma dimensão territorial enorme. Só no Mato Grosso tem a SEMA (Secretária do Meio Ambiente), IBAMA, as prefeituras e o Ministério Público. Além de existirem as promotorias especializadas na defesa do meio ambiente, existe também uma procuradoria especializada no setor. Essa é uma área muito difícil de ser trabalhada porque o mercado da madeira e da carne é muito forte e ele funciona em muitos municípios, tem municípios que vivem só da extração da madeira. É uma grande luta, por enquanto está sendo muito difícil, mais por falta de fiscalização.
CIDADÃO: É verdade que algumas tribos indígenas vendem a madeira da própria reserva?
LUIZ EDUARDO: Sempre recebemos essas notícias e sempre acontece o fato da madeira ser extraída de área de reserva indígena legal ou área de preservação permanente.
CIDADÃO: Qual é o procedimento adotado quando ocorre esse tipo de apreensão?
LUIZ EDUARDO: É crime, portanto acontece a prisão e a obrigação de recompor o dano causado, no caso o reflorestamento, ou pagando multas altíssimas que são revertidas para a recomposição do meio ambiente. Existe uma lei que o sujeito recebe uma licença ambiental para desmatar certa área e a pessoa acaba aproveitando disso para tirar madeiras de outros lugares e por isso encontramos dificuldades.
CIDADÃO: Quando éramos crianças, o conceito que se tinha do Mato Grosso era que lá a lei era a do “44”, e hoje sabemos que não é assim. Qual a realidade do estado hoje?
LUIZ EDUARDO: Antigamente era tudo muito distante. Para se ter uma idéia, uma comarca abrangia várias cidades e hoje a realidade não é essa, o que faltava há muitos anos atrás era o estado estar presente em todos os municípios e hoje ele está, com o Poder Judiciário, Ministério Público, com delegacia de polícia e com todos os serviços necessários. As estradas também são bem conservadas e isso conseqüentemente leva o progresso e diminui a criminalidade. Tudo que se faz para a educação no estado de São Paulo se faz no Mato Grosso: também tem creche, transporte escolar e escola para todo mundo, a saúde também vai bem.
CIDADÃO: Obviamente, não tem jeito de mudar o tamanho do mapa e a capital continua sendo longe de muitos municípios. E quanto ao Tribunal de Justiça?
LUIZ EDUARDO: É, realmente. Os municípios que faziam fronteira com o estado do Goiás por muitos anos se sentiram mais ligados ao estado do Goiás, eles estavam localizados no estado do Mato Grosso, mas todos os recursos deles eram lá, foi como eu disse - o Estado, o governo não estava presente naquela região inclusive essa região tinha até um nome que era “Vale dos Esquecidos”, essa região não tinha ligação nenhuma com o estado do Mato Grosso.
CIDADÃO: Até onde a informática tem sido importante para o processamento da Justiça no Mato Grosso? O estado se modernizou suficientemente para ter uma Justiça on-line?
LUIZ EDUARDO: O estado está caminhando para isso. Hoje, os processos têm andamento dentro do gerenciamento eletrônico o “Gedoc”, todo processo é informatizado e colocado naquele gerenciamento, então conseguimos levantar dados em qualquer lugar do Mato Grosso, o andamento do processo, o acompanhamento dentro do tribunal e tudo dentro desse gerenciamento eletrônico. Essa informatização ajudou demais, tanto no MP como no Poder Judiciário, porque se pode acompanhar qualquer processo hoje, independentemente da distância, basta ter internet. O Conselho Nacional de Justiça vem trabalhando cada vez mais nessa informatização. Mas isso é inevitável, o que tem que mudar um pouco é a legislação, pois a nossa legislação é muito burocrática.
CIDADÃO: Como você vê essa homenagem que seu pai vai receber esta noite (NR: a entrevista aconteceu na quarta-feira), com a praça que já tem o nome dele sendo modernizada, reinaugurada e com a fixação do busto de Fernando Jacob? O que isso representa para você?
LUIZ EDUARDO: É um motivo de grande orgulho, honra e emoção. Ele morreu há 20 anos e as homenagens para ele continuam mantendo sua memória sempre viva. A Câmara Municipal, a Ordem dos Advogados, a cidade e todos os cidadãos ainda mantêm muito viva a memória do meu pai e eu acho isso muito interessante e é motivo de orgulho para todos nós e essas homenagens estão sempre se renovando. Meu pai em vida foi muito amigo, humilde, tratava todo mundo de uma forma muito humana, e eu percebo que apesar dele ter morrido há 20 anos ele era um homem do seu tempo, que vivia muito próximo dos jovens e devido a isso ele era sempre convidado para ser orador de turmas, paraninfo e padrinho de formando, e eu me lembro que eu e meus irmãos sempre levávamos os amigos à nossa casa e meu pai estava sempre bem informado, ele sempre batia papo com os nossos amigos de uma forma bem antenada, bem atualizada. Ele tratou todo mundo dessa forma e esses jovens estão aí hoje, por isso que a memória dele ainda se mantém viva.
CIDADÃO: Entre as tantas lições que você teve do seu pai, qual é a maior que fica?
LUIZ EDUARDO: A lição que recebi do meu pai foi aqui em Fernandópolis, pois nascemos e fomos criados aqui. A lição sem dúvida é de humildade. Ele sempre usou do seu conhecimento, da “bagagem“ que ele tinha. Sempre muito humilde, ele nunca guardou mágoa de ninguém. Até existiam aquelas disputas políticas da época, e quando acabava, para ele estava tudo bem, continuava com todas as amizades dele. Ele sempre foi muito solidário com as pessoas e nunca guardou mágoas nem ressentimento e eu acho que isso é que marca muito. É isso que eu procuro seguir, os exemplos de humildade. Ele nunca quis sair de Fernandópolis, sempre teve um amor e um agradecimento muito grande com a cidade e isso contamina todo mundo. Eu estou morando fora há 27 anos e todas as vezes que venho aqui sinto uma forte emoção e a grande saudade do meu pai. Todas as vezes que eu venho a Fernandópolis me sinto tocado por esses sentimentos.