O engenheiro Renato Casali Pavan é o diretor-presidente da empresa de consultoria Macrologística, de São Paulo, expert na área de logística de transportes e de planejamento. Pouca gente sabe que Pavan foi o autor da sugestão ao governo federal para que a ferrovia Norte-Sul fosse estendida de Anápolis (GO) até o entroncamento com a ferrovia da ALL, a antiga EFA, na divisa dos municípios de Estrela DOeste e Fernandópolis. Nesta entrevista, o engenheiro revela que essa sugestão brotou por causa da existência do Pólo Logístico de Água Vermelha.
CIDADÃO: A privatização da Rede Ferroviária no Brasil pode ser considerada um sucesso?
PAVAN: Na realidade o que foi feito com a malha ferroviária brasileira, incluindo as sete Superintendências da Rede Ferroviária Federal e a Ferrovia Paulista FEPASA, da qual eu fui presidente e que acabou sendo transferida para o Governo Federal contra a minha vontade, foi uma desestatização, ou seja, a propriedade continua com o governo e o concessionário paga um arrendamento. A privatização ocorre quando o patrimônio é vendido. A desestatização foi muito mal feita, houve a precipitação de passar a operação e manutenção para a iniciativa privada, sem a preocupação de formar eixos de transporte contínuos. Em minha opinião as malhas deveriam estar interligadas separadas por bitola métrica e de 1,60m, integrando o território nacional, bem como conexões com portos e hidrovias. Após o processo de desestatização a iniciativa privada está aos poucos corrigindo o erro de origem, como o caso da ALL comprar a Ferroban. Recentemente devido a um enorme esforço e liderança do Carlos Lima, por nossa sugestão, mais um trecho ferroviário foi encampado pelo governo federal visando a integração, que é Anápolis-Estrela D´Oeste, interligando a Ferrovia Norte-Sul à malha da ALL em bitola larga, propiciando um grande aumento da competitividade da região, principalmente de Fernandópolis, complementado por outros modais, como a hidrovia e a dutovia. Outro trecho ferroviário será a ligação de Estrela D´Oeste a Panorama (EF 151) e de Panorama a Porto Murtinho (EF 267) interligando as Hidrovias do Paraná com a do Paraguai.
CIDADÃO:Fernandópolis obteve do governo federal uma ZPE. Quais são as condições indispensáveis para que uma ZPE funcione bem?
PAVAN: As ZPE caracterizam-se como áreas de livre comércio com o exterior, destinadas à instalação de empresas voltadas para a produção de bens a serem comercializados no exterior, sendo consideradas zonas primárias para efeito de controle aduaneiro. A Lei 11.508/2007 dispõe sobre o regime tributário, cambial e administrativo das Zonas de Processamento de Exportação. Referida Lei foi regulamentada pelo Decreto 6.814/2009 e normatizada pela IN RFB 952/2009. Seria desnecessário elencarmos as normas da ZPE uma vez que já é de conhecimento geral, no entanto queremos salientar suas principais características, quais sejam: 1) É vedada a instalação em ZPE de empresas cujos projetos evidenciem a simples transferência de plantas de indústrias já instaladas no País. 2) O regime é válido, para cada empresa, por 20 anos a contar de sua instalação, podendo ser prorrogado por iguais períodos. A empresa deve exportar no mínimo 80% da sua produção. A isenção de impostos importantes, e o gozo da livre disponibilidade das divisas obtidas e outras vantagens não são suficientes para determinar a implantação de uma unidade industrial em uma ZPE. O fator mais importante é o custo da logística para ter acesso às matérias-primas e aos portos e aeroportos de exportação. Assim, é de fundamental importância definir o sistema de logística que é mais competitivo. Além disso, uma ZPE é um Condomínio Industrial Alfandegado dentro de uma zona alfandegada. Assim sendo, a ZPE necessita ter uma infra-estrutura viária, prédio da administração, onde estará abrigada a Receita Federal, abastecimento de água, tratamento de esgoto, fornecimento de energia elétrica, e demais facilidades e utilidades. Por isso, torna-se necessário que haja um projeto completo, com o lay-out da área que abrigará as empresas, precedido de um amplo estudo de mercado e de viabilidade econômico-financeira, bem como os investimentos necessários,. A ZPE pode ser administrada por uma Sociedade de Propósito Específico SPE, formada pelo município e pela iniciativa privada. Somos da opinião que Fernandópolis reúne condições logísticas competitivas para viabilizar a ZPE.
CIDADÃO: Em relação à logística de transportes, quais são as vantagens e desvantagens das ferrovias em relação ao transporte ferroviário?
PAVAN: As vantagens e desvantagens de um modal de transporte dependem de vários fatores, como a distância a ser percorrida, o valor agregado do produto, transit time (tempo de trânsito). Atualmente há outra preocupação em relação à emissão de poluentes cuja relação é de 1 para hidrovia, 3 para ferrovia e 18 para rodovia. Quanto às distâncias para cargas de alto volume e baixo valor agregado, a rodovia é mais viável até 300 km, ferrovia 1000 km e hidrovia 2000 km. Assim, verificamos que a multimodalidade é a solução, pois podemos empregar cada modal nas faixas em que eles são mais viáveis.
CIDADÃO: O senhor foi o criador do nome Pólo Logístico de Água Vermelha. O que pensa desse projeto e o que ele representa para o Noroeste Paulista?
PAVAN: Na realidade esse projeto teve a contribuição de várias pessoas, entre as quais destacamos o Carlos Lima, Keiji Kanashiro (ex-Secretario Executivo do Ministério dos Transportes) e Egidio Comin da Egelte. Dos vários estudos preliminares que desenvolvemos através da minha empresa de consultoria, a Macrologística, foi possível identificar uma série de infra-estruturas logísticas de grande valor comparativo tais como o Terminal Hidroviário de Água Vermelha, ferrovia, entroncamento rodoviário, áreas de armazenagem disponíveis, que, no entanto, eram vistas de maneira isolada. Quando fizemos a integração entre elas, verificamos que faltava uma ligação da região no sentido norte-sul, quando sugerimos a extensão da ferrovia Norte-Sul a partir de Anápolis até a ferrovia da ALL que além de tudo ligava a ponta da hidrovia do Rio Paraná (São Simão) com o centro e norte do país. Com a decisão do governo federal de construir a ferrovia, a vantagem comparativa se transformou em vantagem competitiva viabilizando a criação de uma ZPE, de dutovias, de aeroporto. Desde o início acreditamos que essas ações iriam ocorrer, daí a razão de sugerirmos o nome de Pólo Logístico do Noroeste de São Paulo, e o nome de Água Vermelha foi em homenagem ao Terminal Hidroviário.
CIDADÃO: São Paulo tem sofrido com a chamada guerra fiscal com os estados vizinhos. Qual seria a solução ideal para esse problema?
PAVAN: A guerra fiscal já foi bem mais predatória do que atualmente. Nesse momento está sendo muito mais importante para a decisão de implantação de um empreendimento o custo logístico competitivo do que o ganho fiscal, que é temporário. A solução é dotar o país de maior competitividade na logística.
CIDADÃO: O senhor é favorável à criação de um cinturão fiscal, nas zonas fronteiriças do estado de São Paulo?
PAVAN: Creio não ser necessário.
CIDADÃO: Hoje, qual é a melhor receita para o desenvolvimento sustentável, do ponto de vista da economia?
CIDADÃO: Vou transmitir aqui a opinião de vários especialistas. Desenvolvimento sustentável é um conceito sistémico que se traduz num modelo de desenvolvimento global que incorpora os aspectos de desenvolvimento ambiental Foi usado pela primeira vez em 1987, no Relatório Brundtland, um relatório elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criado em 1983 pela Assembleia das Nações Unidas. A definição mais usada para o desenvolvimento sustentável é: O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e económico e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitats naturais. O campo do desenvolvimento sustentável pode ser conceptualmente dividido em três componentes: a sustentabilidade ambiental, sustentabilidade econômica e sócio-politica. A sustentabilidade ambiental consiste na manutenção das funções e componentes do ecossistema, de modo sustentável,podendo igualmente designar-se como a capacidade que o ambiente natural tem de manter as condições de vida para as pessoas e para os outros seres vivos, tendo em conta a habitabilidade, a beleza do ambiente e a sua função como fonte de energias renováveis. A sustentabilidade econômica, enquadrada no âmbito do desenvolvimento susptentável, é um conjunto de medidas políticas que visam não apenas ao crescimento econômico, mas também à incorporação de conceitos ambientais e sociais, criando assim uma interligação entre os vários setores. Assim, o lucro não é somente medido na sua vertente financeira, mas igualmente na vertente ambiental e social, o que propícia um uso mais adequado quer das matérias primas, quer dos recursos humanos. Já a sustentabilidade sócio-política centra-se no equilíbrio social, tanto na vertente de desenvolvimento social quanto sócio-econômica, e é um veículo de humanização da economia, e ao mesmo tempo, pretende desenvolver o tecido social, nos seus componentes humanos e culturais.