Cabo da Infantaria, morador de São João do Iracema, servia em missão de paz no Haiti quando um terremoto atingiu o país e matou mais de 200 mil pessoas
Glenda Scandiuzi
O cabo da policia militar Cesar Luis Martins Pereira, 23, de São João do Iracema, foi convocado para uma missão de paz no Haiti, no final de 2008. Depois de seis meses em Campinas, ele deixou sua base na cidade de Lins, onde serve o 37º Batalhão de Infantaria Leve desde 2005, para cumprir a convocação.
No dia de sua volta ao Brasil -12 de janeiro - aconteceu o terremoto, que alcançou 7,6 pontos na escala Richter e devastou o país. Sua volta foi adiada por dez dias e ele só chegou a São Paulo no dia 24 de janeiro. Na capital, foi submetido a exames de praxe durante quatro dias, seguiu para Lins e só reviu a família dias depois, quando retornou a São João do Iracema.
O Brasil participa da missão de paz MINUSTAH no Haiti desde 2004. Os índices mostram que a população vive abaixo da linha da pobreza, doente e sem condições básicas de higiene. A violência e o consumo de drogas estão ligados diretamente à falta de emprego. Lá, a lei é olho por olho, dente por dente, e, ao contrário de outros lugares, os pais deixam de alimentar os próprios filhos para não morrer de fome. Prevalece a vontade do mais forte.
A missão dos brasileiros era realizar o patrulhamento de rotina e manter a ordem no país. No Forte Nacional, base brasileira, os dias de trabalho eram normais e tranquilos. Os policiais quase não tinham folga e as únicas diversões eram os jogos de futebol no mini campo improvisado e a academia.
Era 12 de janeiro de 2010 e Cesar já estava com as malas prontas para retornar ao Brasil com seu trabalho concluído, quando a terra tremeu. Por sorte o cabo não estava na base no momento em que o prédio desabou, junto com o resto da cidade, que virou pó. O subtenente Camargo, de Lins, um cabo e um soldado da cidade de São Vicente não tiveram a mesma sorte e morreram soterrados. Camargo estava ao telefone com a filha quando foi atingido pelo muro. Ela escutou os últimos suspiros do pai.
Ainda chocado e com as imagens fortes na cabeça, Cesar relata com tristeza o que viu de perto. A possibilidade de nunca mais rever a família, a perda dos amigos de profissão e as condições subumanas daquele povo sofrido foram elementos decisivos para a mudança comportamental do cabo: antes eu não ligava muito para a família e não tinha muitos objetivos. Hoje as pessoas, principalmente da minha família, estão em primeiro lugar em minha vida, procuro passar com elas boa parte do meu tempo já que vou ficar aqui até dia 10 de março, antes de voltar para Lins.
Os pais de Cesar receberam a noticia do terremoto pela televisão. O irmão do cabo, que é tenente, tentou obter informações com o Batalhão de Lins, mas ninguém conseguia noticias do Haiti. Cesar ficou incomunicável por um dia: o dia do terremoto foi o mais triste e apreensivo da minha vida. Eu falava com meus pais e minha namorada todos os dias pela internet, e sem conseguir me comunicar ficava pensando no desespero deles. Nunca foi tão bom voltar para casa.
Cesar e os colegas passaram a dormir apenas duas ou três horas por noite, já que precisavam se revezar na ajuda. O militar emagreceu quatro quilos. Depois da tragédia, os soldados brasileiros concentraram os trabalhos na distribuição e fornecimento de alimento e água e nas escoltas de engenheiros e bombeiros que faziam o resgate das vítimas.
Esta semana, Cesar estava reunido com a família e os amigos na chácara dos pais, em São João do Iracema. Agora mais que cabo e filho, ele é um herói, que sobreviveu ao terremoto e ajudou a salvar vidas, com apenas 23 anos de idade.