A mesa do advogado Jurandy Pessuto, de Fernandópolis, está apinhada de trabalho. Além dos processos rotineiros afetos à sua banca, Jura, como é conhecido, atua em várias ações onde os requeridos são rancheiros proprietários de ranchos de lazer nos muitos condomínios existentes na região, principalmente às margens do Rio Grande.
O próprio Jura é alvo de uma dessas ações, uma vez que ele possui um rancho, no Condomínio Entre Rios, em Mira Estrela. Na manhã de quinta-feira, o advogado se reuniu em seu gabinete com o médico Orlando Gaia, presidente do Condomínio Paraíso, no mesmo município, e José Roberto Alvarenga, responsável pela contabilidade do empreendimento.
Os rancheiros, que há muito tempo estão revoltados com as denúncias do Ministério Público, veem agora uma luz no fim do túnel, simbolizada pelas recentes decisões de um juiz de Três Lagoas Márcio Rogério Alves, da 4ª Vara Cível que negou a reintegração e os pedidos de demolição formulados pela Cesp contra os proprietários de ranchos ou casas de campo situadas às margens da represa de Jupiá.
A concessionária alega que houve degradação da chamada faixa de segurança, constituída pela margem da represa, onde teriam sido instalados postes de luz, bancos e varandas. O juiz entendeu que essas acessões não afetam o meio ambiente.
Num trecho da sentença, o juiz Márcio Alves escreve: Apenas a título de observação e também porque a Autora alega que a
área ocupada é APP área de preservação permanente, entendo necessária uma observação, pois tenho que não há segurança jurídica para se concluir que as margens desses reservatórios possam ser considerados APP diante da ausência de dispositivo legal que estabeleça as metragens dos reservatórios artificiais. Com efeito, o Código Florestal (Lei Federal 4.771/65) caracterizou as áreas de preservação permanente como as existentes no entorno de reservatórios artificiais. Mas nada estabeleceu quanto às metragens divisórias para a proteção dos corpos d'água.
Em outro trecho, o magistrado considera que a degradação ambiental ocorre com muito maior frequência nas áreas onde não existem os denominados rancheiros.
CUIDADOS
É exatamente essa a tese dos rancheiros: se há alguém que cuida com zelo e amor do meio ambiente, são eles próprios. O contador José Roberto Alvarenga dá um exemplo: No Condomínio Paraíso, cada rancho construiu uma fossa com filtro um projeto especialmente desenvolvido para a sociedade. Assim, não se polui nem o meio ambiente, nem o lençol freático, garante.
Orlando Gaia acrescenta que só há vegetação importante onde há ranchos: todos nós plantamos árvores frutíferas ou típicas da mata atlântica, como cedros e jatobás. Quem sobrevoar a região verá que, fora dos condomínios, praticamente não há árvores só pastagens, a maioria delas sofrendo processos de voçoroca.
Todos citam os inúmeros exemplares da fauna brasileira que reapareceram na região exatamente por causa dos bosques e pomares formados pelos rancheiros: tamanduás, tucanos, jaburus, biguás, garças, pacas, além de uma infinidade de pássaros canoros.
Cada condomínio possui o seu estatuto, todos eles contendo capítulos importantes relacionados à preservação ambiental. O advogado Jura acrescenta: A Constituição Federal garante o direito à propriedade; além disso, no artigo 6º da CF, que trata dos direitos sociais, está garantido o direito ao lazer, que é o que nós buscamos nos nossos ranchos, diz.
Gaia recorda que os condomínios de lazer são a praia dos moradores da região: Num feriadão como o do dia 12, se eu fosse com a minha família para o litoral, levaria um dia de viagem na ida e outro na volta. Sobraria apenas um dia para ir à praia. Os ranchos são a solução para essa carência.
O médico faz questão de destacar ainda a função social dos condomínios, que dão empregos e movimentam o comércio e serviços de cidades como Mira Estrela, que, segundo ele, vive financeiramente em função dos condomínios.
PROJETO
Uma das esperanças dos rancheiros é que a proposição PL 7397/2006, de autoria do deputado federal Julio Semeghini (PSDB-SP) passe nas comissões da Câmara Federal. Esse projeto dispõe sobre as APPs Áreas de Preservação Permanentes no entorno dos reservatórios dágua artificiais.
Depois de passar por quatro comissões, atualmente, ela está na Comissão de Minas e Energia. Se passar, irá para a Comissão do Meio Ambiente, cumprindo o rito do regime de tramitação ordinário. O parecer das Minas e Energia deve sair em breve.
No início do ano, Semeghini convocou uma reunião em Fernandópolis com os rancheiros, políticos e interessados. O parlamentar quer resolver a questão de uma vez por todas. Na quinta-feira, Semeghini estava em Brasília e falou por telefone à reportagem. Segundo ele, a proposição 7397/2006 está sendo ampliada pelos grandes interessados no assunto, que são os proprietários ou concessionários das áreas e os responsáveis pelo meio ambiente no governo.
Segundo o deputado, esses grupos de interesse pretendem equacionar, além das especificações de zona limítrofe relativas à esfera urbana, também as afetas à zona rural. Se conseguirmos fechar um acordo com a ABRAGE (Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica), podemos até levar o projeto direto ao Plenário, afirmou Semeghini.
O bom senso, neste instante, é o melhor caminho para equacionar a questão, no entendimento do deputado. Esse problema persiste há tantos anos; por que não sugerir à AES Tietê, à Cesp, para que aceitem a paralisação das execuções das sentenças pela demolição? No começo de novembro, o assunto poderá ser votado em regime de urgência, argumentou.
Depois disso, Semeghini pretende convocar uma audiência pública na região, com a presença de prefeitos, vereadores, autoridades do judiciário, representantes de empresas e rancheiros. Para o deputado, a sentença do juiz Márcio Alves, que por sinal é fernandopolense, nos dá força, assegura. Queremos inclusive convidar o juiz a participar dessa audiência, finalizou. (Leia mais na coluna Observatório)