Para engenheiro, “projeto de biodiesel trará ganhos sociais”

20 de Agosto de 2025

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Para engenheiro, “projeto de biodiesel trará ganhos sociais”
O engenheiro Antonio José da Silva Maciel, docente da Unicamp, é autor do projeto de criação de uma usina de biodiesel em Fernandópolis, que tem como parceiros a Prefeitura Municipal, Grupo Arakaki, Couros Premium, FEF e Sabesp. Ele esteve em Fernandópolis na quarta-feira, 16, e participou de reunião no gabinete do prefeito Luiz Vilar de Siqueira. Ali, foram definidos detalhes do projeto, como a escolha do local da instalação – uma área de quase 5 mil m2, que Maciel considerou “ótima”. Terminada a reunião, Maciel falou com exclusividade a CIDADÃO.

CIDADÃO: Como é esse projeto de uma usina de biodiesel para Fernandópolis?
MACIEL: A usina de biodiesel está pautada na formação de um consórcio entre algumas empresas e a prefeitura. Essas indústrias, conscientes da questão ambiental e também da responsabilidade social, resolveram participar desse projeto a partir do surgimento da ideia. Com isso, fomos convidados para vir à cidade apresentar as linhas mestras desse projeto e houve boa aceitação. Esse projeto consiste no seguinte: primeiro, o consórcio terá uma gestão pública, envolvendo empresas privadas. A intenção é que esse modelo possa dar continuidade ao projeto. Estamos conscientes de que este é um projeto da comunidade. Nós o chamamos de “Projeto de Biodiesel Sustentável”, e sua sustentabilidade está no fato de que usaremos como matéria-prima simplesmente um lixo, ou seja, o óleo residual de fritura. Esse óleo causa vários problemas ambientais, e o primeiro deles é o entupimento da rede de coleta de esgoto. Além disso, ele serve de alimento para os insetos, como baratas, que proliferam na rede porque ali há alimentos que o homem fornece. Há, portanto, uma importante questão de saúde pública nessa história. Isso trará desdobramentos de responsabilidade social, porque o aproveitamento desse resíduo na produção de um combustível não-poluente significará a diminuição da emissão de poluentes no município. O processo de produção também não gera resíduos. A coleta não deverá ter preço, porque o projeto não busca o ganho individual, e sim coletivo. Toda a receita que o projeto produzir, por lei, será revertida em ações sociais no município. Enfim, é um projeto ambiental, que tem sustentabilidade econômica e, mais do que isso, tem cunho social. São três vieses de suma importância para a comunidade.
CIDADÃO: Por que foi incluída a obrigatoriedade de destinação parcial dos resultados econômicos às ações sociais?
MACIEL: Porque sem isso o projeto não funciona. O dono desse projeto é a própria coletividade. Temos que pensar no bem comum, onde cada um tem a sua participação e todos ganham. Se a pessoa decidir trocar óleo usado por óleo novo, enfim, colocar um preço, haverá lucratividade individual, o que retira do projeto seu viés social.
CIDADÃO: Mas, do ponto de vista econômico, o “lucro” dos parceiros é a própria utilização do combustível produzido em suas máquinas e veículos, não é?
MACIEL: Exatamente. É por isso que eles estão dispostos a manter o compromisso firmado com a FAPESP (Fundação de Apoio à Pesquisa no Estado de São Paulo), que deverá financiar 50% do projeto. É fundamental, para que o projeto tenha continuidade, é que a comunidade esteja consciente de sua importância. Para isso, faremos várias campanhas, inclusive nas escolas – aliás, este projeto é uma ação ambiental, razão pela qual a FEF, por exemplo, participa dele. Ela tem um curso de Engenharia Ambiental, e a usina poderá ser um laboratório de extensão da própria faculdade. Faremos campanha nas escolas, nas igrejas. Em resumo: é um projeto da comunidade.
CIDADÃO: O projeto gerará empregos em Fernandópolis?
MACIEL: Diretamente, muito pouco. A geração de empregos poderá acontecer nas ações sociais. E também na gestão do consórcio, porque é preciso garantir o seu prosseguimento no futuro. A ideia é manter a forma de gestão diferenciada que foi proposta.
CIDADÃO: Se alguém despejar um litro de óleo de cozinha usado no solo, quanto tempo ele levará para se decompor?
MACIEL: Vou alterar sua pergunta para responder da seguinte maneira – e não se assuste: um litro de óleo polui cerca de um milhão de litros de água! A questão de Fernandópolis é estratégica. Estamos sobre o Aquífero Guarani, e temos que preservar essa riqueza Divina. A facilidade de tratamento de esgoto acontece quando você passa a retirar esse óleo de cozinha usado da rede. Então, a empresa – no caso, a Sabesp – também tem interesse de que ela é uma das grandes beneficiadas do projeto.
CIDADÃO: Como a comunidade acadêmica internacional vê esse projeto? Ele tem boa acolhida?
MACIEL: Sem dúvida. A forma como estamos encaminhando as coisas junto à FAPESP mostra que há muitas coisas atreladas e vinculadas a ele e que são condição sine qua non para receber o sinal verde da entidade. Estudo e pesquisa de resíduos industriais, por exemplo. A Couros Premium, que também é parceira, utilizará muito as informações que irão surgindo durante as pesquisas. A Alcoeste, da mesma forma, já que ela produz também combustível ecológico, o álcool. Na produção de álcool ela também tem alguns resíduos agro-industriais que serão motivo de pesquisa. Então, além de uma usina de biodiesel, esse projeto inaugura uma linha de pesquisas para Fernandópolis.
CIDADÃO: Existe uma previsão de custo global?
MACIEL: Nós estamos solicitando à FAPESP R$ 1,2 milhão. Evidentemente, os custos desse projeto ultrapassarão esse valor, mas há o apoio substancial de outras fontes. Há contrapartidas importantíssimas, como a própria prefeitura, que cedeu o local para a usina – um local estratégico, junto ao distrito industrial.
CIDADÃO: O local é adequado?
MACIEL: É excelente. Não poderia haver um melhor. Tudo isso é muito importante – principalmente o fato de a prefeitura ter encampado esse projeto, que veio ao encontro da filosofia adotada pela administração. É um projeto desenvolvimentista e comunitário.
CIDADÃO: De que maneira a comunidade poderá participar dessa ação?
MACIEL: A participação da comunidade é de fundamental importância para o sucesso do projeto, porque a matéria-prima será fornecida por ela. Nós teremos dois tipos de coleta: um é o chamado ponto de coleta, que são os locais fixos – bares, restaurantes e similares, e os postos de coleta, onde a população levará o óleo de cozinha. Pediremos às donas de casa que guardem o óleo em garrafas pet, e nós faremos duas reciclagens: do óleo e desses recipientes. É uma forma de ajudar o meio-ambiente. Isso também minimizará o custo operacional.
CIDADÃO: Quando acontecerá o lançamento do projeto?
MACIEL: A previsão é de que, em outubro, aconteça o lançamento, já que haverá a Semana do Meio-ambiente.
CIDADÃO: E o início das operações?
MACIEL: Prevemos que aconteça no começo do ano que vem, porque ainda teremos que aguardar o trâmite da liberação das verbas. No entanto, a prefeitura já vai fazer a contrapartida, que é a arrumação do local, etc. Com o investimento inicial do próprio consórcio, poderemos começar a coleta.
CIDADÃO: Na condição de acadêmico, o senhor entende que, para salvar o mundo, tem mesmo é que ir a campo, executar projetos desse tipo, enfim, pegar o touro à unha?
MACIEL: Esse projeto é apenas mais uma contribuição. Nós não temos a pretensão de salvar nosso planeta, mas vou dizer o seguinte. Eu vejo o que estamos fazendo com o planeta desta forma: imagine que estejamos numa jangada em alto mar. Umas 50 pessoas, digamos. Aí, me dá fome e preciso esquentar minha marmita. Serro um pedaço da madeira da jangada, queimo, esquento a comida e como. Eu resolvo, assim, o meu problema. Você está com frio; então, corta um pedaço da vela da jangada, cobre-se e resolve o seu problema. É dessa maneira que nós estamos tratando o mundo. Precisamos mudar essa concepção. Esse projeto é da comunidade, e ela tem que saber que o que importa não é o ganho individual, e sim o coletivo. Com essa filosofia, cada um estará olhando, à sua maneira, pelo planeta. O projeto até pode ser uma ação isolada, mas que contribui com a proposta de cuidar bem do planeta.