Quem é proprietário rural tem um sério problema a resolver, até o dia 11 de dezembro de 2009: elaborar um projeto que destine 20% de suas terras à chamada reserva legal, instituída por lei no Brasil.
A legislação determina que, na Amazônia Legal, 80% da área das propriedades sejam destinadas a essa reserva; no cerrado (que atinge regiões como o Estado do Tocantins e norte do Mato Grosso) o percentual cai para 35%; no resto do país (inclusive São Paulo) o percentual é de 20%.
A Assembléia Legislativa de São Paulo promulgou em 23 de abril do ano passado a Lei 12.927, proposta pelo então deputado estadual Valdomiro Lopes (PSB), hoje prefeito de São José do Rio Preto. Essa lei traça as diretrizes da execução da reserva legal. No último dia 6 de janeiro, foi promulgado o Decreto 53.939, que dispõe sobre a manutenção, recomposição, compensação e composição das reservas legais em território paulista.
APPs
De acordo com essa legislação, as chamadas APPs Áreas de Preservação Permanentes (constituídas por várzeas, córregos, rios e matas ciliares) não podem ser incluídas no cálculo da área de reserva legal. Assim, tomando-se como exemplo o caso de um produtor do município de Itu, alvo de recente reportagem do programa Globo Rural, ele teria que apartar do total de terras que possui 56 hectares - nada menos que 20,2 hectares, já que nove deles são APP e 20% do total corresponderia a 11,2 hectares.
O advogado paulistano Jorge Guizzo, que gastou R$ 25 mil para regularizar a reserva legal de sua propriedade de 38 hectares no interior, acredita que a esmagadora maioria dos pequenos proprietários não dispõe de recursos financeiros para cumprir a lei. Vivo da advocacia, não do que o meu sítio produz, afirmou. Os ganhos dos produtores são reduzidos, não deixam lucro suficiente para pagar um projeto dessa natureza.
Na realidade, o alto custo fica mesmo com a elaboração do projeto (gastos com engenheiro agrônomo, topógrafos, etc). Nos órgãos públicos onde o produtor terá que cumprir etapas burocráticas, não há taxas a pagar. A averbação no cartório de registro de imóveis custa cerca de R$ 70.
Além disso, há as despesas com o plantio de árvores nativas ou exóticas necessário para a reabilitação da biodiversidade e como forma de proteção à fauna e flora nativas.
REDUÇÃO
Além da despesa extra, os pequenos produtores se queixam de que a redução da área cultivável reduzirá automaticamente a produção. Horticultores, principalmente, temem pelo futuro.
Segundo o secretário estadual do Meio Ambiente, Francisco Graziano Neto, a Lei 12.927 veio para suprir a falta de critérios técnicos ainda não estabelecidos pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente e concilia interesses múltiplos, já que garante melhorias ambientais ao Estado e regulariza a situação da maioria das propriedades rurais, atualmente impedidas de obter financiamentos por não atenderem aos critérios do Código Florestal.
Em Fernandópolis, a questão também preocupa o diretor municipal de Meio Ambiente, Ângelo Veiga. Para ele, a questão mais grave é o fato de que não se pode somar as APPs no cômputo da reserva legal: além do custo do projeto ser inacessível para a maioria, haverá casos em que a propriedade se tornará inviável do ponto de vista econômico, calcula.
Veiga deposita fé na preocupação do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, que já admitiu que o prazo (11 de dezembro) para averbação em cartório da área de reserva legal pode ser prorrogado: para o ministro, não há tempo hábil para que o governo crie e desenvolva programas de apoio e financiamento ao produtor quanto ao registro da reserva.
Já o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, simpatiza com a ideia de somar as APPs ao total da reserva legal, desde que isso se restrinja às pequenas propriedades: Não faz sentido admitir que os latifundiários, donos de milhares de hectares, gozem desse benefício, disse.
Para Marcos Mazeti, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Fernandópolis e diretor de Agricultura do município, a disposição legal é cruel. Nós, produtores, queremos manter íntegro o meio ambiente; não causamos danos ambientais, produzimos com sustentabilidade, cuidamos das APPs.
Mazeti revolta-se com a situação: Avoco o direito de propriedade, um princípio constitucional. Quando alguém compra 100 alqueires de terras, ele paga pelos 100 alqueires, integralmente. O governo quer tirar do setor produtivo rural um quinto das terras. Se assim for, que o produtor seja reembolsado pelo governo, disparou.
O presidente revelou que já houve conversas com membros do Ministério Público, no sentido de legalizar a proposta de incluir as APPs no cômputo da reserva legal. A situação atual do produtor rural é complicada. Perdemos para os sem-terra, para o governo, para a crise do mercado que quebra frigoríficos. Não sei onde vamos parar, comentou.