AVCC: um projeto audacioso que calou os incrédulos

20 de Agosto de 2025

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AVCC: um projeto audacioso que calou os incrédulos
Acreditar, arriscar, enfrentar os desafios; ter garra e força de vontade para alçar vôos rumo a horizontes desconhecidos é virtude que nem todos têm. Mas aqueles que são agraciados com esses dons são capazes de fazer brotar mananciais até mesmo no deserto. Foi por intermédio de pessoas munidas desses sentimentos que a AVCC (Associação de Voluntários no Combate ao Câncer) nasceu.

Em 1998, a entidade iniciou suas atividades na residência de uma portadora de mieloma múltiplo, Cândida de Jesus Silva Nogueira, mais conhecida como “Candinha”.
A principio todas as ações estavam ligadas à solidariedade e amor ao próximo. Candinha - sem vislumbrar a amplitude que o projeto alcançaria - lutou pelos seus ideais; mesmo quando muitos não “depositaram fé” no pequeno trabalho.

“Descobri a doença em 1994, e desde então comecei a me perguntar: como será que vivem os outros? Foi então que tomei a iniciativa de procurar algumas pessoas para me ajudar. Na época procurei o Padre Mário e falei do projeto. Ele queria que eu ficasse dentro da igreja, na promoção humana ou pastoral. E eu brinquei com ele e disse que o plano era muito audacioso e que não poderia ficar preso dentro de uma igreja”, disse Cândida.

A força de vontade da voluntária, aliada às de outras pessoas que abraçaram a causa, fez com que a AVCC se tornasse um qualificado hospital de oncologia que, em fevereiro do próximo ano, completará 11 em Fernandópolis.

“Quando a gente começou não tínhamos absolutamente nada. Todas as ações eram voltadas a visitas realizadas por voluntários, não tinha uma equipe como tem hoje. Com o passar do tempo fomos direcionando o trabalho para áreas mais técnicas”, disse Sérgio Felix, diretor administrativo da AVCC.

Hoje, a instituição se expandiu e atende pacientes de Fernandópolis, região e estados vizinhos, como Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul. Em média, são realizadas cerca de 60 a 70 consultas diárias. Desde que foi inaugurada a unidade de quimioterapia, em julho deste ano, o atendimento tem crescido.

Devido à grande demanda, a entidade sentiu a necessidade de contratar mais um profissional, o oncologista clínico José Altino, que começou a atender no último dia 10. “Antigamente só tínhamos um fluxo maior quando o Dr. Guilherme Cucolicchio atendia; mas desde que inauguramos a unidade de quimioterapia o tratamento dobrou. Hoje, com a contratação de mais um médico, o Dr. José Altino, passamos a atender de segunda a sexta”, disse Félix.

Estão cadastrados na AVCC 94 pacientes. Desse total, 36 são carentes e precisam ser assistidos com cesta básica, leite, frutas e legumes que são mensalmente arrecadados junto à comunidade e através de campanhas organizadas pela própria AVCC.

Entre os serviços oferecidos pela entidade estão: cirurgia para câncer de pele; quimioterapia de tumores sólidos (pulmão, próstata, intestino, mama, esôfago); odontológico, em parceria com a Unicastelo, biópsias; endoscopia e em breve, tratamento urológico.

“Os medicamentos do câncer têm alto custo. Há pacientes que a cada ciclo quinzenal ou de 21 dias tomam medicamentos que chegam a R$ 10 mil ou R$ 15 mil por ciclo. Se for um ciclo de 15 dias gastará cerca de R$ 12 mil ou R$ 15 mil por ciclo. Se ele tomar dois ciclos a cada 15 dias ele vai gastar quase R$ 30 mil. Por isso realizamos tantas campanhas e leilões para angariar fundos para a entidade”, explicou Sérgio.

Até o início de dezembro a AVCC arrecadou R$ 483,7 mil em leilões, sendo R$ 86, 3 mil em Iturama – MG; R$ 125,8 mil em Ouroeste; R$ 22,9 em Turmalina e R$ 248,7 em Fernandópolis. Já com as quermesses foram arrecadados R$ R$ 35,9. Houve também a doação de dois veículos, o primeiro, um carro zero quilômetro doado pelo Grupo Arakaki, para construção de uma sala de cirurgia completa e o segundo um Fiorino furgão, ano 1996, no valor de R$ 13 mil que foi doado à entidade por 24 empresários do ramo de compra e venda de automóveis.

Todo o sucesso da entidade - não só neste ano, mas desde que foi criada – é resultado do trabalho solidário de parceiros, voluntários, funcionários da AVCC e de toda a população de Fernandópolis.

“Nós queremos agradecer a toda a população, que tem ajudado, colaborado e confiado no trabalho da nossa diretoria e voluntários. E todo esse trabalho que foi feito não foi realizado só por uma pessoa, mas por toda comunidade tanto de Fernandópolis como da região, inclusive as cidades vizinhas. Nós estamos implantando em cada cidade um leilão, não importando o tamanho. O que importa é que eles são parceiros e que estão dispostos a nos ajudar, aliviando o sofrimento dos menos favorecidos”, concluiu Adenilton Fernandes, presidente da AVCC.


Uma parceira nota 10
Todo trabalho da AVCC não seria possível se não houvesse a ajuda dos parceiros que se desdobram para ajudar a entidade. Entre eles estão a Polícia Militar, Ambiental e o Corpo de Bombeiros, que toda semana se deslocam de suas sedes para auxiliar os enfermeiros nas visitas domiciliares (home care) aos pacientes que não podem se deslocar até o ambulatório da entidade.

“Essa parceria é muito importante, se não a tivéssemos, teríamos muitas dificuldades para executar esse serviço. Outro fator importante deste trabalho é mostrar aquele lado da polícia que normalmente não aparece: o social. Essa parceria veio para somar e a grande beneficiada é a própria população”, disse Antônio Carlos Gonçalves, enfermeiro responsável pelas visitas domiciliares.

Entre os pacientes que recebem a visita domiciliar existem vários cujo tratamento é paliativo (consiste na assistência ativa e integral a pacientes cuja doença não responde mais ao tratamento curativo), como é o caso de Sebastião Alberto Dias e Braulino Ferreira da Silva.

Sebastião teve câncer labial há dois anos. No início ele tinha uma pequena lesão que tinha cerca de dois a três centímetros; mas, por ter rejeitado o tratamento, o problema se agravou.
“Tentamos tirar aquela lesão, que chamamos de carcinoma, mas ele se recusou a fazer o tratamento. E o paciente tem direito de decidir, ele se negou e a gente não pôde fazer nada. A família também se empenhou, chegou até a levá-lo a Barretos e lá ele também se recusou. Aquela lesão que tinha apenas de dois a três centímetros hoje é uma lesão que destruiu tanto o lábio superior quanto o inferior e também houve o comprometimento da região do mento (queixo).

O tratamento dele agora é paliativo, o que a gente está procurando dar a ele é o que chamamos de qualidade, que é o cuidado dos possíveis sintomas e reações dessa doença, porque tratamento não tem como fazer. As visitas para ele são diárias porque ele teve a presença de larvas na boca e a gente teve que retirar. E agora devido à baixa resistência, o paciente está apresentando um herpes zoster, além do câncer. Então a gente atende o paciente não só pelo câncer, mas tudo o que ele apresentar nos cuidamos”, esclareceu o enfermeiro.

Para cuidar do pai, Maria Sueli da Silva - filha de Sebastião - teve que abandonar o trabalho. “Pedi demissão para cuidar dele, agora só meu marido trabalha. Ele é funcionário do aterro sanitário e ganha R$ 600 por mês. É muito difícil sobreviver com isso, somos seis pessoas aqui em casa. Ainda bem que a AVCC nos ajuda, mas tem algumas coisas que ainda faltam, como por exemplo, lençol. Eu estou pondo dos meus porque não posso deixar a cama dele suja”, reclamou Maria Sueli.

Já Braulino teve câncer de próstata há quatro anos. Sua vida também não tem sido fácil. “Há quatro anos ele está assim. Nós vivemos com um salário mínimo, mas ele é muito enjoado, pede coisas que a gente não tem, porque com um salário não dá para manter. Às vezes ele pede laranja, banana, maçã, por isso tenho que ter sempre essas frutas”, disse Aparecida Teodoro da Silva, esposa do paciente.

Para o soldado do Corpo de Bombeiros Carlos Henrique Regis, que acompanha as visitas domiciliares há três anos, ver o estado destas pessoas não o choca, pois já está acostumado devido à profissão; mas mesmo assim sua vida tem se transformado.

“Já faz três anos que eu acompanho o pessoal da AVCC. Sempre sou eu quem vai, pois no Corpo de Bombeiros desenvolvo um trabalho de relações com a comunidade e também dou aulas. Assim, toda vez que a comunidade quer solicitar algo, tem que passar por mim. Nesta profissão estamos acostumados a ver situações que nos chocam, mas é claro que nesses casos, como é um tratamento e estamos sempre em contato com a pessoa, acabamos pegando amizade. E quando a pessoa morre passamos a dar um pouquinho mais de valor à vida. Quando você tem um problema em casa e vê situações como essas, você passa a achar que seu problema não é nada. É muito gratificante esse trabalho, contribui bastante na minha vida, assim como acredito que para os colegas da Polícia Militar e Ambiental”, disse o soldado Regis.

Para o final do ano, a equipe de voluntários da AVCC está preparando para os pacientes mais carentes, como Sebastião e Braulino, uma cesta de Natal com panetone, doce, bolacha, frango, entre outros produtos, além da cesta básica e frutas que doam todo mês.