Por um palmo de terra

20 de Agosto de 2025

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Por um palmo de terra
Sem-terra ocupam margem de fazenda improdutiva em Ouroeste e erguem primeiro acampamento do movimento na região noroeste

A “Fazenda Bom Jesus 1”, localizada no município de Ouroeste, há duas semanas passou a ser alvo de mais de 35 famílias de sem-terra - sendo 90% delas da própria Ouroeste -, depois que a propriedade foi considerada improdutiva numa avaliação do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

O proprietário das terras é Jesus Barbeiro, que reside atualmente em São José do Rio Preto. Na fazenda não há produção agrícola e poucas cabeças de gado podem ser avistadas em meio aos 351 alqueires do imóvel. A reportagem de CIDADÃO esteve no acampamento na tarde da última quinta-feira, quando foi recebida pelo técnico agrícola Osmar José, que é um dos organizadores do acampamento.

O acampamento dos sem-terra foi erguido à beira da Estrada Municipal Indiaporã-Ouroeste, a poucos quilômetros desta última cidade. Essa estrada é asfaltada (embora esteja esburacada) e fica ao lado da cerca da fazenda.

“Temos todo o apoio da CUT (Central Única dos Trabalhadores), e já cadastramos mais de 156 famílias, a maioria de Ouroeste, algumas de Indiaporã e Guarani D’Oeste. Até o momento, depois de duas semanas de ocupação, já conseguimos furar um poço, estamos recebendo a cada dia mais famílias, e nos baseamos na avaliação do INCRA, que é oficial há mais de seis meses, para que as famílias de Ouroeste possam conquistar seu pedaço de terra, tão sonhado pelo pessoal que está aqui, que sempre trabalhou na produção agrícola, na ‘roça’”.

Osmar, que é conhecido como Mazinho, garante: “Todos que estão aqui são realmente trabalhadores rurais, que conhecem a terra, e ficaremos aqui até que a fazenda seja realmente dividida para nosso pessoal”. Os precários barracos do acampamento são produzidos com pedaços de madeira, muitos também usam bambus. As lonas, em sua maioria, são de cor preta. O maior “inimigo” dos acampados é o vento.
“Quando venta muito, temos que recomeçar toda a construção dos barracos, é uma reconstrução constante nestes dias de muita chuva e fortes ventos”, salienta “seu” Ildo, que tem um barraco no acampamento.

TERRA DE ORIGEM
Dona Mercedes, acampada com sua família - marido, filha, genro e neta -, afirma que o objetivo é permanecer em Ouroeste, sua cidade natal. “Nós nascemos aqui, crescemos aqui e queremos receber um pedaço de terra aqui, na terra em que temos nossas raízes”, disse Mercedes, que armazena água da chuva para utilizar no dia-a-dia.

Mazinho afirmou que a maioria do pessoal não teria para onde ir se tiver que sair do acampamento. “São pessoas que não possuem casa própria, deixaram suas residências, muitas delas muito simples, onde pagavam aluguel para morar”, afirmou o técnico agrícola.

No acampamento há técnicos em enfermagem, veterinários, professores e outros profissionais que, desempregados, estão em busca de um terreno que poderá ser concedido através das diretrizes da Reforma Agrária, e também auxiliando quando necessário. Crianças também estão acompanhando suas mães no acampamento. É o caso das meninas Dricia Rayane e Diane, que estão com as mães, Lucimara e Luana. Ao lado de um fogão à lenha improvisado, Lucimara amamentava Dricia.

Lucivaldo, casado e com dois filhos, estava com o caçula, Vitor Gabriel, preparando a “entrada” do barraco onde irá morar até que o governo federal realize a distribuição dos lotes, que não terão mais do que cinco alqueires cada um, para as famílias acampadas nas margens da fazenda Bom Jesus “1”, em Ouroeste.


“MODELO NEOLIBERAL”
“É o que foi dito dia 26 em Brasília: a fatura da crise mundial, que revela o fracasso do modelo capitalista neoliberal, está posta na mesa. Ao redor dela, banqueiros, donos de indústrias, latifundiários, e na ponta, os trabalhadores. O velho ditado parece que está longe de ser desmentido, ou seja, quem senta na ponta paga a conta”, enfatizou Mazinho.

No dia 26 de novembro, mais de 50 movimentos sociais, centrais sindicais, organizações de estudantes e entidades da sociedade civil realizaram uma marcha em Brasília, para, entre outras reivindicações, pedir ao governo política mais eficaz na questão da Reforma Agrária. Assim, quem sabe, Lucimara, Mazinho, Dona Mercedes e os demais terão as partes que lhes cabem neste latifúndio.