Marta Silene Zuim Colassiol é psicóloga há 22 anos. Seu marido é o bem-sucedido empresário Clacir Colassiol. Eles têm uma filha adorável, a Beatriz. Tudo isso poderia bastar a muitas mulheres. Não à Marta, que dá toda vazão às suas inquietações e anseios. Moderna, urbana assumida, ela é ainda gestora de Recursos Humanos e empresária, sócia da irmã Adriana Cristina Zuim no comando da Droga Líder, empresa pioneira no conceito de farmácia popular na região. Alegre, otimista, a psicóloga revela, nesta entrevista, que sua maior preocupação, do ponto de vista filosófico, está nos rumos que o homem moderno tomou, fazendo do eu o seu Deus e da competitividade sem ética o seu modus operandi. De resto, ela segue em frente, esparramando seu sorriso largo e curtindo os momentos de intimidade familiar nas raras horas livres que lhe sobram.
CIDADÃO: Você e sua irmã Adriana assumiram a Droga Líder, um estabelecimento tradicional na cidade, com quase 50 anos. Quais são os projetos administrativos para a empresa?
MARTA: Assumimos a Droga Líder há cerca de dois anos e meio, e em princípio demos seqüência à utilização desse ponto tradicional em Fernandópolis isso foi até alvo de uma reportagem no CIDADÃO, por ocasião do aniversário da cidade. O intuito era trabalhar com atendimento diferenciado para a população, começando pela atenção farmacêutica, que vai além da simples comercialização de produtos farmacêuticos. É uma atenção específica ao usuário, com acompanhamento no pós-venda, procurando também preços acessíveis. Foi nessa linha de pensamento que Fernandópolis obteve a primeira farmácia popular da região só havia uma em Rio Preto, nesta região. Em 2006, a Droga Líder conseguiu o convênio com o governo federal, passando a ser a primeira farmácia popular da região. Ela atende a qualquer cidadão que tenha o CPF e um receituário médico, e abrange cerca de 380 itens de medicamentos. Para facilitar ao público saber quais remédios se incluem nessa lista, montamos uma cartilha, o guia dos medicamentos da farmácia popular, bem como os laboratórios e as posologias. Assim, tanto os médicos quanto os usuários podem verificar quais medicamentos se enquadram no programa da farmácia popular. São principalmente os medicamentos de uso contínuo, como os de hipertensão e diabetes. Nosso objetivo é a humanização do atendimento.
CIDADÃO: Vocês conseguiram autorização para trabalhar 24h por dia. É possível manter o padrão de atendimento no sistema full-time?
MARTA: Não só é possível como nós estamos fazendo o máximo de esforço nesse sentido, porque antes tínhamos apenas um farmacêutico durante o dia; hoje, temos três farmacêuticos contínuos e um quarto profissional que cobre as folgas. Nesse trabalho específico da atenção farmacêutica, temos um contingente de pessoas suficientes. Nossos balconistas passam por treinamentos e avaliações, não só da nossa linha de especialização eu sou psicóloga e gestora de RH como também junto aos nossos clientes. Existe um trabalho pós-venda, feito com os clientes da Líder.
CIDADÃO: Então, há uma interação? O cliente tem nome?
MARTA: Claro, ele não é um número, ele tem nome. Agora, no sistema 24h, se o cliente precisar de aplicações em qualquer horário, ou auxílio na aplicação de um soro ou sonda, por exemplo, terá da empresa essa assistência. Durante o dia, os postinhos de saúde desenvolvem esse trabalho, mas quem não tem convênio, no período da noite fica descoberto. Queremos preencher essas lacunas.
CIDADÃO: Os produtos genéricos têm a mesma eficácia dos tradicionais?
MARTA: Sim, porque se trabalha com o mesmo sal com o qual se faz o chamado medicamento ético, que tem um preço maior. Além disso, procuramos só trabalhar com laboratórios conceituados. O que às vezes acontece como ocorre com qualquer produto - são problemas em relação à idoneidade do fabricante. Então, procuramos, na nossa linha de genéricos, que vem com preço de fábrica, trabalhar com produtos de laboratórios como EMS, Sandoz e outros bem conceituados.
CIDADÃO: Vocês firmaram parcerias com empresas da cidade. Como é que funciona esse sistema?
MARTA: O objetivo é facilitar a existência de um cadastro com os funcionários da empresa conveniada, que gozarão de um desconto no preço e pagamento mensal de acordo com o recebimento do salário. Ele tem a vantagem de pagar tudo no mês seguinte. Além disso, há também o atendimento domiciliar e outras regalias.
CIDADÃO: Foi difícil obter a licença de funcionamento 24h?
MARTA: Foi uma luta muito grande, minha e de minha irmã. Nós nos deparamos com uma legislação que trazia limitações de duas farmácias em funcionamento noturno. Articulamos com o sindicato, com a prefeitura, com os vereadores, para mostrar a necessidade real de uma nova farmácia fazendo a jornada noturna. Além disso, sempre acreditamos que a concorrência é uma forma legal de dar ao usuário outras opções. A concorrência leva ao aperfeiçoamento. Foram praticamente dois anos de luta, de pedidos, reuniões, de negativas, de espera. Até que a lei foi alterada. Queremos fazer jus ao alvará que nos foi concedido, queremos ajudar o desenvolvimento de nossa Fernandópolis.
CIDADÃO: Você sempre manifestou sua preocupação com a saúde física e mental do povo, nas várias atividades que desenvolve ou desenvolveu na vida. Dito isso, pergunto: como vai a saúde do brasileiro? Ela melhorou?
MARTA: Entendo que existe uma evolução, onde algumas doenças deixaram de existir e foram substituídas por outras. Mas, de modo geral, é claro que há uma melhoria na saúde do brasileiro, haja vista para a expectativa de vida média do nosso povo, que aumentou significativamente segundo o último senso. Havia uma expectativa de vida média de 60 anos que subiu para 75. Isso é um indicativo de melhora. A nossa alimentação, as campanhas na mídia, a orientação nas escolas, ensinando medidas de higiene simples porém eficientes, têm caráter preventivo muito importante. Eu, particularmente, gostaria que o Brasil tivesse uma medicina preventiva, e não curativa. Seria o ideal. Agora, o que aumentou significativamente, de forma preocupante, foram os transtornos de ordem mental. O grau de estresse, a cada crise mundial, as síndromes de pânico, as depressões, a ansiedade, angústia...Nos meus 22 anos de formada, constatei que o ser humano sofre muito de solidão. Pode estar engajado em n grupos e projetos, mas no fundo ele é uma vítima da solidão. Acho que é uma doença que nos acomete no século 21. Anti-depressivos e ansiolíticos são vendidos em profusão, as pessoas procuram a tal pílula da felicidade, que infelizmente não existe.
CIDADÃO: Depressão, transtorno bipolar & cia. são doenças típicas do século 21?
MARTA: Penso que essas doenças sempre existiram, mas veja bem: o homem primitivo, por exemplo, nem tinha tempo a perder com essas elucubrações, porque precisava prover o seu sustento e o seu abrigo a cada dia. Assim, havia muita exigência quanto ao seu físico, de tal forma que nem tinha tempo para percepções minuciosas e afetivas. Hoje, nós temos a informática, o controle remoto, a comida enlatada...Não temos a preocupação constante com o abrigo às intempéries e nem que correr atrás dos alimentos, como o homem primitivo fazia. Assim, temos mais tempo para focar na qualidade e no padrão de sobrevivência. E há certa crise moral, oriunda da alta competitividade. É amigo passando a perna em amigo, é concorrência desabusada. Hoje em dia, só se pensa no eu, que foi colocado em primeiro lugar. E isso está errado, porque obviamente não se pode viver sozinho. Adoro aquele filme Náufrago, com Tom Hanks. O personagem só teve coragem de sair da ilha quando se projetou na bola, que ele chamava de Wilson. O carreirismo às vezes nos leva a destruir laços afetivos verdadeiros, importantes e até fundamentais à nossa sobrevivência psíquica. Esse processo é estressante.
CIDADÃO: Mas você mesma é uma pessoa que se joga em mil projetos, portanto também se expõe a esses riscos mesmo sendo psicóloga. A Marta não pára nunca?
MARTA: (Risos) Claro que existe meu outro lado, a Marta que pára às vezes, a Marta que adora ir ao Shopping. Tenho um ritmo intenso e gosto muito da vida urbana. Gosto de shopping, de cultura, informação. Prefiro um lazer mais urbano, e menos natureza. Então, isso faz com que muitas vezes eu já esteja em atividade de lazer mesmo no trabalho. Por exemplo, quando vou a São Paulo num congresso ou feira, estou trabalhando, mas ao mesmo tempo me divirto muito. E não deixo de aproveitar a viagem para ir a uma livraria, ver um filme recém-lançado. Com minha família adoro viajar e ficar em casa testando uma receita nova, vendo um filme. Entendo que nosso mecanismo de interação com o mundo nunca pára, mesmo que às vezes você mude o botão para lazer, tirado-o do trabalho. É isso que mantém o homem vivo: essa condição de transformação de tudo, capacidade da qual ele tem plena percepção.