Ex-ministro se volta para a iniciativa privada

20 de Agosto de 2025

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Ex-ministro se volta para a iniciativa privada
Antonio Cabrera Mano Filho ficou nacionalmente conhecido quando, aos 29 anos de idade, assumiu o Ministério da Agricultura no governo de Fernando Collor de Mello. Formado em medicina veterinária, presbiteriano, Cabrera é um apaixonado pela vida no campo. Nesta entrevista, concedida quando visitou Fernandópolis para abrir o congresso sobre bioenergia realizado na Unicastelo, o ex-ministro falou sobre o trabalho que vem desenvolvendo à frente dos negócios da família e do cenário econômico atual.

CIDADÃO: O que o Brasil representa no contexto mundial da bioenergia?
CABRERA: Representa uma liderança incontestável, pois nossa matriz de energia renovável ultrapassa 40% enquanto o mudo estacionou em 14%. Assim, o Brasil tem condição de liderar esta mudança de matriz energética em nível mundial.

CIDADÃO: Os otimistas dizem que a produção de álcool levará o país à redenção econômica. Os pessimistas acham que ocorrerá um desastre ecológico. Com quem está a verdade?
CABRERA: Prefiro os otimistas, pois o álcool ainda trará o devido valor ao homem de campo, além de inestimável contribuição na melhoria econômica de nossa população rural. Reforce o impacto ambiental extremamente positivo na redução da emissão de CO2. Quanto a um desastre ecológico, acho exatamente o contrario, pois a cana tem se expandido em áreas degradadas, promovendo a sua recuperação e estimulando a conservação de matas ciliares e a averbação da reserva legal.

CIDADÃO: Além da cana-de-açúcar, quais são os produtos agrícolas mais viáveis para o desenvolvimento do projeto de bioenergia?
CABRERA: O bom do biodiesel é que ele pode ser atendido de acordo com as particularidades de cada região, ou seja, em alguns lugares será a soja, em outros o pinhão manso, a mamona e assim por diante...

CIDADÃO: O mercado externo vai se adaptar, em termos industriais, a essas fontes alternativas de energia? Não haverá boicote?
CABRERA: Acredito que teremos uma pressão contrária exercida pela indústria do petróleo, mas no final a pressão ambiental será bem maior e vencerá esta batalha, pois não há apelo maior que o do meio ambiente.

CIDADÃO: Quando Ministro da Agricultura, o sr. adotou um discurso desenvolvimentista, na linha JK. Hoje, seu pensamento mudou ou mantém as mesmas diretrizes?
CABRERA: Acredito muito no desenvolvimento e no papel da agricultura no crescimento do Brasil.

CIDADÃO: Existe um projeto de construção de um alcooduto ligando o Centro-Oeste ao porto de Santos, passando por cidades da região, como Fernandópolis e São José do Rio Preto. Qual é sua opinião a respeito?
CABRERA: Essa é a principal fragilidade do nosso álcool: a questão logística. Assim o alcoolduto será imperativo para o escoamento deste volume de álcool para o exterior.

CIDADÃO: O governo poderá fazer a Ferrovia Norte-Sul passar pela região. O que isso representa para a Agricultura da macro-região de São José do Rio Preto?
CABRERA: Significa um impulso muito grande, porque além do transporte rodoviário, nós teremos mais uma modalidade de escoamento da safra agrícola. Isso pode trazer uma melhor competição e reduzir custos. Nós sabemos que hoje nossa região é extremamente competitiva, mas a questão dos pedágios e até que este produto chegue ao porto, nós perdemos competitividade. Então ela é muito bem-vinda e eu diria que não apenas para a agricultura, mas para toda a economia e o setor produtivo de nossa região.

CIDADÃO: Como o sr. analisa o fato de que algumas Câmaras Municipais estão limitando, através de lei, o plantio da cana-de-açúcar nos seus municípios?
CABRERA: A gente entende a preocupação. É importante que essas pessoas possam conhecer um pouco o que é o setor da cana de açúcar e entender o seguinte: que quando uma leiteria é desativada, isso não é porque a cana virá “tomar conta”, é porque na realidade é a conjuntura econômica do leite que tem levado a isso. Se um dia, e disso você pode ter certeza, que o leite melhorar mais de preço, o pessoal vai voltar para o leite. Então eu sempre tenho dito que a cana-de-açúcar, na realidade, vai fazer o devido valor da agricultura voltar para o homem do campo, porque ela vai valorizar o leite, a soja, o preço do milho... Então eu diria que a cana-de-açúcar é bem-vinda e é uma preocupação que não é tão válida em relação a isso.

CIDADÃO: A queda do dólar é desfavorável ao setor. Se essa queda prosseguir, pode abalar a economia das usinas e a exportação dos derivados?
CABRERA: Já tem abalado. Eu diria que hoje a situação não é muito confortável e é até um pouco preocupante, mas nós estamos muito atentos a isso e esperamos que o governo tenha alguma medida, porque não é só o setor agropecuário ou o sucroalcooleiro, mas toda a economia que se baseia na exportação tem perdido o seu valor competitivo com a valorização excessiva do Real, tanto é que a balança comercial nossa nos últimos três tem caído, e temos que ficar atentos para que isso não prejudique e não descapitalize o setor.

CIDADÃO: O sr. acredita que a fabricação de veículos flex consolidou de vez a indústria do etanol no Brasil?
CABRERA: Eu não tenho dúvida. Isso é motivo de orgulho do Brasil, essa tecnologia desenvolvida aqui, porque afinal de contas deu-se para o consumidor a decisão final: se ele põe gasolina ou se ele põe álcool. Então eu diria que democratizou, favorece o consumidor e consolidou definitivamente o mercado de álcool no Brasil porque agora você tem opções a mais, e não tem apenas um combustível a ser colocado, como aconteceu quando tivemos na crise de abastecimento do álcool. Então com certeza foi muito bem-vindo e é uma tecnologia (flex) que tem um caminho muito grande a ser explorado no mundo a fora.

CIDADÃO: O setor sucroalcoleiro é hoje o principal interesse da família Cabrera?
CABRERA: Nós estamos diversificando, temos outras atividades e como nós, acredito que outras famílias, outros grupos empresariais têm que diversificar, porque afinal de contas, a cana tem a bandeira do meio ambiente na mão, é uma energia renovável, é mais democrática e gera mais empregos. Então eu diria que nessa economia moderna, no mundo responsável, de produção sustentável, a cana tem tudo para se fixar e progredir. É um momento único. Aqueles que puderem aproveitar essa oportunidade e se expandir nesta área, com certeza se darão bem.

CIDADÃO: Uma reportagem da TV, feita tempos atrás, mostrou que a família Cabrera estava abandonando a pecuária. Quais os principais motivos dessa decisão que rompeu uma tradição familiar?
CABRERA: A falta de rentabilidade e a concentração na formação dos preços do boi nos desestimularam.

CIDADÃO: Ao que parece, depois de ser Ministro da Agricultura do governo Collor, a política não está mais em seus planos. O sr. não sente falta do poder?
CABRERA: Não, pois acredito que tudo tem o seu tempo. No momento estamos trabalhando para os nossos projetos privados.

CIDADÃO: Como vai sua famosa biblioteca de títulos raros?
CABRERA: Vai bem. Estamos terminando a construção do prédio.