Vida Vida - As medidas da alma

20 de Agosto de 2025

Compartilhe -

Vida Vida - As medidas da alma
 Tudo na vida tem pesos e medidas: a casa, a cama, o prato, o pão da padaria, as decisões e as infinitas atitudes impensadas. No quesito beleza, a medida não pode passar do manequim 38 e dos 50 quilos de puro... Preconceito! Quem foi que começou com essa brincadeira sem graça de que as pessoas devem ser magras? Não está tão distante a época em que as mulheres mais corpulentas eram referência de beleza. E quem disse que a beleza está ligada a carcaça que carrega esse nosso cérebro enferrujado? Repetimos tantas vezes que ser magro é a única forma de beleza que acabamos acreditando.

A psicóloga Damile Regina Stradioto Roberto, de 24 anos, é um exemplo clássico. Linda, divertida e usa um manequim, digamos, Plus! Ela mesma não via possibilidades de ser referência de moda, por exemplo. Enganadíssima! Os gordinhos estão ganhando força, conquistando as vitrines, dominando as passarelas. São chamados de modelos plus size.

Quando recebeu o convite para ser a modelo publicitária de uma loja de Fernandópolis, desatou a rir sem parar. Estava fazendo compras e a proprietária da loja a observando. “Quando eu estava indo embora, a proprietária me disse que tenho um rosto lindo, um elogio comum para gordinhas [risos] e perguntou se eu tinha interesse em fotografar para a loja. Minha resposta? É óbvio que foi dar risada sem parar! Um mix de vergonha com inconformidade”, explica.

Educadamente respondeu que pensaria na questão. Claro que não foi Damile quem decidiu. Foram a mãe, a irmã, os amigos. Claro que topa! A princípio foi tudo uma grande diversão, um motivo extra para rir das situações. Mas, com o trabalho deslanchando, a novata foi aprendendo algumas coisas, principalmente como é exaustivo modelar e que a prática exige muita dedicação e... Diversão! “No camarim em que fico sempre tem aperitivos e bebidas a vontade. Já no quarto das magrinhas, só tem água. Elas tomam meio copo d’água para não marcar a barriga. Acho isso o máximo! Garçom amigo, pode trazer um galão de 20 litros que a sede é grande e ninguém vai notar!”, conta rindo.

Para uma gordinha, aceitar-se é um esforço homérico. Não é fácil crescer em um mundo de pensamento magro. Para Damile, mesmo linda, foi difícil. “Por bastante tempo o fato de eu ser psicóloga não mudava a forma como eu me via. Desde minha adolescência tive sérios complexos com meu corpo e sofri muito por isso até pouco tempo. O processo de olhar-se é bastante doloroso, porém, ressuscitador. Este deveria ser um processo natural de todas as pessoas. Conhecer-se transcende a barreira do corpo. O que dificulta ainda mais esse acesso ao nosso verdadeiro Eu, é exatamente o fato do mundo clamar pela magreza. Porém, é possível ser gordinho e ser saudável sim, assim como é possível ser magrinho e doente. Como gordinha e psicóloga, opto e aconselho ser feliz”, aconselha.

A repetição cria o hábito. Quem não se sente feliz ao receber um elogio, um reconhecimento? Para Damile, não poderia ser diferente. Aceitar meu corpo nunca foi algo fácil para mim, mas depois que comecei a ser fotografada e desfilar, senti que passei a me aceitar muito mais. Me olhar nas fotos e nas roupas e me sentir bonita... É muito bom. Receber elogios verdadeiros, de especialistas e pessoas experientes ‘inflam’ o ego de qualquer pessoa. Perceber que posso ser charmosa, elegante e até mesmo sexy, fez com que eu conhecesse muito mais a mulher que existe dentro desse corpo.”

Mas, não há rostinho bonito nesse mundo que sobreviva a ação do tempo. Só há um tipo de beleza que o tempo fortalece: a sabedoria. Têm experiências que para um gordinho são lições dolorosas, todavia que agregam valores para uma vida toda. Dignifica a alma. E Damile resume bem isso: “Todos nós, magros ou não, somos capazes de adquirirmos valores diante das situações que a vida nos proporciona. Mas, existem certas experiências, que só nós, gordinhos, passamos e vice-versa. Fazendo um flashback das experiências em que procurei aproveitar o máximo possível para adquirir um aprendizado valioso, posso dizer que, como gordinha, eu cresci aprendendo, a partir da minha própria dor, que todos nós somos diferentes em alguma coisa, mas que isso não nos faz melhor nem pior que ninguém. Aprendi que o número da minha roupa não diz quem eu sou. Que minhas roupas podem ser tão grandes quanto o meu coração, ou tão pequenas quanto minha cabeça. Acho que é isso: aprendi a ser a peça chave para minha felicidade”.